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Dom Moacyr

Advento da esperança!


   Este é um tempo de incertezas e perplexidades, mas também de esperança. Estamos iniciando hoje, com o Advento, uma nova caminhada do Povo de Deus com Cristo, que nos guia na história rumo ao cumprimento do Reino de Deus. Tempo para tomarmos consciência do que nos sustenta e dá sentido e direção a nossa vida.

Como traduzir este novo tempo como um futuro de esperança quando estamos perdendo a cada dia, a qualidade da democracia? Quando “as grandes corporações capitalistas” ditam e impõem ao mundo “a sua lógica neoliberal, de acumular sem nenhum controle”? Quando “as classes mais pobres não podem esperar nada do Estado nos próximos 20 anos”? (PEC 241/PEC 55). Quando tudo é transformado em mercadoria e a educação, saúde, previdência estão comprometidas? Quando pessoas são estigmatizadas, partidos falindo e o numero de desempregados aumentando? Quando o governo não tem nada a oferecer às maiorias sociais a não ser mais arrocho, desemprego e perda de direitos?

Advento fala da perspectiva cristã do Tempo e do Mundo. Neste 1º domingo somos orientados para o Senhor que vem; desde o início nos é apresentada a perspectiva final: a vinda do Filho do Homem (Mt 24,37-44). Estamos à espera do Senhor que chega para transformar a nossa história. Nesta perspectiva, não dominam ameaça e medo, e sim, a luz orientadora para nosso caminho (Konings).

É no ciclo natural de nossa vida, marcado pelo tempo cronológico, que conhecemos o tempo da graça de Deus. Como experiência de fé, no ritmo do nosso cotidiano, vamos percebendo a atuação de Deus em nossa vida, em nossa história.

Sim, redescobrimos a beleza de estarmos todos a caminho: a Igreja, com a sua vocação e missão, e a humanidade inteira, os povos, a civilização, as culturas, todos a caminho através das veredas do tempo (papa Francisco). Este dia nos faz ter um sentimento profundo do significado da história.

Este é o horizonte da esperança para percorrer um bom caminho. O tempo do Advento, que hoje começamos de novo, restitui-nos o horizonte da esperança, uma esperança que não desilude porque está fundada na Palavra de Deus.

Cristo alerta: “Vigiai”. Vivei despertos. Tende os olhos abertos. O que significa colocar nossa esperança em Deus vivendo com os olhos abertos? Deixaremos que se esgote definitivamente no nosso mundo a esperança numa última justiça de Deus para essa imensa maioria de vítimas inocentes que sofrem sem culpa alguma?

Para o teólogo Antonio Pagola, a forma mais fácil de falsear a esperança cristã é esperar de Deus a nossa própria salvação eterna enquanto viramos as costas ao sofrimento que há agora mesmo no mundo. Um dia teremos que reconhecer nossa cegueira ante Cristo Juiz: quando te vimos faminto ou sedento, estrangeiro ou nu, doente ou na prisão, e não te assistimos? Este será o nosso diálogo final com Ele se vivermos com os olhos fechados.

A esperança do cristão não é uma atitude cega, pois não esquece os que sofrem. Nas nossas comunidades temos que cuidar do modo como vivemos a esperança, para que não sejamos indiferentes ao clamor dos que morrem diariamente de fome e não esqueçamos os pobres. 

Concluindo o Ano da Misericórdia (20/11), papa Francisco criou o Dia Mundial dos Pobres para que as comunidades reflitam como a pobreza está no âmago do Evangelho e tomem consciência de que não poderá haver justiça nem paz social enquanto Lázaro jazer à porta da nossa casa. Este dia constituirá uma forma genuína de nova evangelização.

Para marcar o encerramento do Jubileu, papa Francisco assinou a Carta Apostólica Misericordia et miseria (Misericórdia e miséria”), destacando que o perdão é a essência do amor divino.

Multidões de pessoas continuam a emigrar dum país para outro à procura de alimento, trabalho, casa e paz. A doença, nas suas várias formas, é um motivo permanente de aflição que requer ajuda, consolação e apoio. Os estabelecimentos prisionais são lugares onde muitas vezes, à pena restritiva da liberdade, se juntam transtornos por vezes graves devido às condições desumanas de vida, declarou o papa no documento.

O analfabetismo ainda é muito difuso, impedindo aos meninos e meninas de se formarem, expondo-os a novas formas de escravidão; a cultura do individualismo exacerbado leva a perder o sentido de solidariedade e responsabilidade para com os outros.

Não ter trabalho nem receber um salário justo, não poder ter uma casa ou uma terra onde habitar, ser discriminado pela fé, raça, posição social, estas e muitas outras são condições que atentam contra a dignidade da pessoa, escreveu o papa.

O mundo continua a gerar novas formas de pobreza espiritual e material, que comprometem a dignidade das pessoas. É por isso que a Igreja deve permanecer vigilante e pronta para individuar novas obras de misericórdia e implementá-las com generosidade e entusiasmo.

     Neste documento, papa Francisco ampliou indefinidamente a permissão especial aos sacerdotes de perdoar as mulheres e outros envolvidos em casos de aborto, bem como a permissão aos fiéis de receberem o perdão de membros de um grupo tradicionalista separatista. “Concedo a partir de agora a todos os sacerdotes, em virtude do seu ministério, a faculdade de absolver a todas as pessoas que incorreram no pecado do aborto”, escreveu o papa.

Quero reiterar com todas as minhas forças que o aborto é um grave pecado, porque põe fim a uma vida inocente, continuou. Mas, com igual força, posso e devo afirmar que não existe algum pecado que a misericórdia de Deus não possa alcançar e destruir, quando encontra um coração arrependido que pede para se reconciliar com o Pai.

     Quanto aos membros da fraternidade tradicionalista (Fraternidade de São Pio X), o papa foi igualmente insistente no tocante à primazia da misericórdia e do perdão dos pecados: Para o benefício destes fiéis, e confiando na boa vontade de seus sacerdotes no esforço com a ajuda de Deus para recuperar a plena comunhão, decidi pessoalmente estender essa faculdade para além do Ano Jubilar, até que provisões posteriores sejam feitas, de forma que ninguém mais seja privado do sinal sacramental da reconciliação através do perdão da Igreja.

Deter-se apenas na lei equivale a invalidar a fé e a misericórdia divina, declarou o pontífice. É por este motivo que nenhum de nós pode pôr condições à misericórdia; esta permanece sempre um ato de gratuidade do Pai celeste, um amor incondicional e não merecido. Mesmo nos casos mais complexos, onde se é tentado a fazer prevalecer uma justiça que deriva apenas das normas, deve-se crer na força que brota da graça divina.

     Possa este Advento ser um tempo de esperança, não deixemos a decepção, o desânimo e a resignação nos dominar. Sejamos pessoas do Advento, pessoas da confiança, testemunhas da esperança.

     Sem esperança, de fato, ninguém pode viver: nenhuma pessoa individual, nenhum povo e muito menos a Igreja. Devemos testemunhar que a vida e o mundo não correm rumo ao vazio, mas vão desembocar no reino de Deus (Cardeal Kasper).

     A esperança cristã não é espera por um futuro utópico. A esperança na vinda de Cristo se dirige ao presente: agora é o tempo oportuno; agora é a hora. Cada dia é importante. Cada momento pode ser a hora de Deus.

O profeta Isaías pede que nos deixemos guiar pela luz do Senhor (Is 2,1-5). Em Cristo, Deus nos revela, definitivamente, a sua presença salvífica em nosso meio.

No Advento somos convidados a dar testemunho dessa esperança, na certeza de que Deus se faz próximo de nós, em nossa história, e nos mostra que é pos­sível a plena realização de nossa humanidade.

Nossa esperança não nos aliena, fazendo-nos pensar que o Senhor prescinde de nossa história para realizar sua obra, ao contrário, nossa esperança e nossa fé nos dão a clareza de que o Senhor é o Deus-conosco.

O Apostolo Paulo nos alerta a vivermos em estado desperto, à luz do dia de Cristo, para que sempre nos possa encontrar dispostos para a vinda de incansável caridade que ele nos ensinou (Rm 13,11-14).

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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