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Dom Moacyr

Chamados à conversão



O amor misericordioso do Pai nos transforma em filhos e filhas. Na criação do homem e do mundo a iniciativa vem sempre de Deus. É Ele quem dá o dom e tudo o que nos envolve. O apelo é, portanto, este: não esperar que o outro venha a nós: ir até a ele. Deus é o primeiro a vir a nosso encontro. Dá-nos o dom não porque somos bons e sim porque Ele é bom. É-nos necessário interiorizar sua bondade e gratuidade. Existe em nós um “sim” e um “não”, mas Deus é sempre “sim”, é dom e amor misericordioso. A história da sua fidelidade é a do “sim”, do chamado contínuo à conversão. Ele se revela no sim e no não de cada um de nós. Deus continua fiel e nos recria mesmo quando o negamos. “Não são os que têm saúde que precisam de médicos, mas sim os doentes. Não vim chamar os justos, mas os pecadores” (Mc 2,17).

O pecado é uma situação de divisão interna, que me isola do amor, portanto da vida. Com seus toques de misericórdia, Deus restaura a vida do povo, à semelhança do oleiro que refaz o vaso rompido (Jer 18,3-6; Is 64,7). “Sede misericordiosos como o vosso Pai é misericordioso. Não julgueis, para não serdes julgados; não condeneis, para não serdes condenados; perdoai, e vos será perdoado. Dai, e vos será dado; será derramada no vosso regaço uma boa medida, calcada, sacudida, transbordante, pois com a medida com que medirdes sereis medidos também (Lc 6,36-38). 

Jesus é aquele que vem confirmar a misericórdia do Pai. “Não se trata de uma alusão romântica ao Evangelho, mas de se atuar a misericórdia nas relações humanas e sociais, como fundamento último da justiça verdadeira. Fiel ao amor que a motiva, a misericórdia aplaca a vingança, resgata o outro e termina por realizar, em sentido pleno, a própria justiça” (Maçaneiro). 

O Sacramento da Penitência e da Reconciliação é a festa do reencontro e do amor misericordioso do Pai. É a celebração do perdão e da esperança. São vários os questionamentos sobre o significado deste sacramento, principalmente numa sociedade onde a convivência harmônica e pacífica está se deteriorando gravemente pelo crescimento da violência, onde a vida e a dignidade das pessoas são continuamente ameaçadas. 

Quem nos ajuda nessa reflexão é o Frei capuchinho Faustino Paludo, que sempre nos visita em Porto Velho. As pessoas aspiram viver em paz, reconciliadas consigo e com os semelhantes. Mas na realidade o que se vivencia é conflitos, tensões familiares e sociais. Como resultado observa-se uma reação imediata de isolamento como conseqüência dessa transgressão e ruptura. Contudo, a vulnerabilidade do sentir-se só e machucado, pode ecoar num grito em busca de uma nova realidade, de uma possível mudança, que fala: “é preciso mudar!” Ninguém, em sã consciência, consegue viver unicamente e por muito tempo, em meio a conflitos e transgressões. “Levantar-me-ei e irei ter com meu pai!” (Lc 15,18) 

O pedido de perdão resgata o sentimento confiante e possibilita a abertura de novos horizontes em vista de relações reconciliadas. Na base da celebração do sacramento da Reconciliação está o pedido de perdão. O pedir perdão encerra um dinamismo humano muito maior do que a simples oração interior, pois insere o ser humano na dinâmica da relação comunitária. “Pai pequei contra Deus e contra ti, já não mereço que me chamem teu filho”(Lc 15,21). O “pedir perdão” requer a disponibilidade de alguém que se faça “toda escuta” pela acolhida benevolente, pelo ouvir atencioso, permitindo à pessoa abrir seu coração e manifestar seu desejo de ser acolhida e amada numa nova relação. Saber ouvir é atitude que brota da bem-aventurança da misericórdia e do reconhecimento da grandeza da pessoa do outro, apesar de seus limites (Jo 8,10-11). Nesta hora, o diálogo reveste-se de significativa importância, no sentido de colocar a pessoa no rumo das relações reconciliadas com Deus, com o próximo, com o universo e consigo mesma, pois quem pede também espera ouvir uma palavra reconciliadora, ou seja, uma palavra que lhe dê a certeza do perdão e da paz. O perdão faz brilhar os olhos e exultar o coração ante as palavras: “irmão (a) tu estás perdoado (a)! Tu és amado (a) por Deus e liberto (a) em Jesus Cristo pela força de seu Espírito. Vai e viva em paz com todos!” 

Quem acredita no amor de Deus, além disso, percebe que o pecado é amor isolado sobre si mesmo, ingratidão de quem responde ao amor com a indiferença e a rejeição. Esta rejeição tem conseqüências não só em quem o vive, mas também em toda a sociedade, até produzir condicionamentos e entrelaçamentos de egoísmos e de violências que se constituem em autênticas estruturas de pecado (pensemos nas injustiças sociais, na desigualdade entre países ricos e pobres, no escândalo da fome no mundo…). Justamente por isto não se deve duvidar em sublinhar quão grande é a tragédia do pecado e como a perda de sentido do pecado (muito diferente dessa enfermidade da alma que chamados “sentimento de culpa”), debilita o coração diante do espetáculo do mal e das seduções de Satanás, o adversário que tenta nos separar de Deus (B.Forte). 

O sacramento da Reconciliação é a celebração do amor incondicional de Deus que se traduz em dom de perdão e de paz. É penhor de esperança, uma vez que neste sacramento, celebramos todas as reconciliações, seja a reconciliação de duas pessoas, de um lar, de uma comunidade ou de uma nação. Celebra-se a reconciliação anunciada pela nova e eterna aliança. “Quando fizermos parte da nova criação, enfim libertada de toda maldade e fraqueza, poderemos cantar a ação de graças do Cristo que vive para sempre”! 

Deus age sempre com profunda misericórdia, perdoando as nossas dívidas, acolhendo, esquecendo, apagando as nossas faltas. Sua misericórdia é uma dádiva gratuita, sem jogo de palavras, sem qualquer contrapartida, a não ser a nossa própria misericórdia para com nosso próximo. 

Deus derrama sua misericórdia sobre nós, como a nos mostrar como deve ser a nossa relação com ele (na vertical) e com o próximo (na horizontal). Aí fica desenhado o mapa do coração de Deus: como as hastes da cruz, onde uma aponta para o Deus, rico em misericórdia, e a outra, para o irmão, carente dessa misericórdia e da nossa solidariedade fraterna (A.Mesquita). 

Pela misericórdia, Jesus se encarna (Jo 3,16) e morre na cruz (Fl 2,7s). Movido por misericórdia o Pai o ressuscita (v. 9ss). A única paga adequada ao uso da misericórdia é a própria misericórdia. Nesse episódio Jesus deixa bem claro. Só usando de misericórdia é que obteremos a suprema misericórdia do Pai. 

Estamos próximo à Semana Santa e à celebração da Páscoa. Em todas as paróquias nesta semana, sempre após as 18h, teremos as celebrações penitencias, Via Sacra e atendimento das Confissões. 

O caminho da Quaresma rumo à alegria divina só é possível no seio da Mãe Misericordiosa. Ajude-nos a sua companhia sempre próxima, cheia de compreensão e ternura. Que Ela nos ensine a sair de nós mesmos no caminho de sacrifício, de amor e serviço, para que.. peregrinos no caminho, cantemos as maravilhas que Deus tem feito em nós, conforme a sua promessa (DAp 553).

Fonte: Pascom

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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