Sábado, 12 de março de 2016 - 22h30
Estamos próximos da grande semana: a Semana Santa; nesta quinta etapa de nosso itinerário quaresmal, somos convidados a experimentar a misericórdia divina, identificando-nos com Cristo até chegarmos à meta do Homem Novo.
No Evangelho de hoje temos um confronto entre a justiça da lei de Moisés e a misericórdia divina revelada por Jesus (Jo 8,1-11). Doutores da lei e fariseus quiseram depor o peso de suas pedras sobre a pobre mulher flagrada em adultério. Os corações adulterados pela hipocrisia, pela frieza e pela observância estéril de um preceito queriam dar um destino precipitado às pedras de condenação que traziam. E mais, queriam envolver Jesus na trama malvada de suas inconsistências (L.Garmus/G.Medela).
Mais uma vez Jesus mostra que a pessoa humana está acima de qualquer lei. Os homens não podem julgar e condenar, porque nenhum deles está isento de pecado. O próprio Jesus não veio para julgar, pois o Pai não quer a morte do pecador, e sim que ele se converta e viva (Ez 18,23.32/BP).
Para o teólogo Jose A.Pagola, em toda sociedade há modelos de conduta que, explícita ou implicitamente, configuram o comportamento das pessoas. São modelos que determinam em grande parte nossa maneira de pensar, agir e viver.
Pensemos na organização jurídica de nossa sociedade. A convivência social está regulada por uma estrutura legal que depende de uma determinada concepção do ser humano. Por isso, ainda que a lei seja justa, sua aplicação pode ser injusta se ela não atender cada homem e cada mulher em sua situação pessoal única e irrepetível.
Na primeira Aliança, o povo é, muitas vezes, acusado de adultério: abandona Deus para voltar-se a outros deuses. A mulher do evangelho, que não tem nome, representa, portanto, todo o povo. E mais: seu adultério é uma imagem de todas as nossas idolatrias: idolatria do sexo, mas também do dinheiro, do consumo, da notoriedade, do poder.
Idolatria da “justiça”, no sentido que desejamos e exigimos que os culpados sejam punidos. O nosso sistema penal não procura somente a reeducação dos culpados e o retorno à ordem, mas uma revanche, do tipo “olho por olho, dente por dente”. Nesta exigência é que se apegam os acusadores da mulher adúltera. Além do mais, acusar o outro é um modo de afirmar-se a si mesmo como “um justo”. E é isto, precisamente, o que Jesus vai questione-los (M.Domergue).
Terão de descobrir que não existe “justo nenhum, nem um só”. Corrigindo: neste relato, há sim um justo: este mesmo que escreve sobre a terra. Para ele, sua justiça, em lugar de condenar, comunica-se aos injustos, tornando justos os que não o são. Pois este homem, precisamente, o único em quem a Lei não poderia encontrar qualquer defeito, é que será levado à morte.
Sua condenação não resultará de nenhuma infração à Lei: dará a sua vida gratuitamente. O diálogo final entre Jesus e a mulher nos faz sair dos domínios do justo e do injusto, para penetrarmos no do amor verdadeiro, aquele que restitui a dignidade de pessoa humana. Da justiça ao amor!
Diante do grave momento pelo qual passa o país, a Igreja divulgou nesta semana uma “Nota sobre o momento atual do Brasil”, manifestando sua preocupação e expressando palavras de discernimento: Vivemos uma profunda crise política, econômica e institucional que tem como pano de fundo a ausência de referenciais éticos e morais, pilares para a vida e organização de toda a sociedade.
A busca de respostas pede discernimento, com serenidade e responsabilidade. Importante se faz reafirmar que qualquer solução que atenda à lógica do mercado e aos interesses partidários antes que às necessidades do povo, especialmente dos mais pobres, nega a ética e se desvia do caminho da justiça.
A superação da crise passa pela recusa sistemática de toda e qualquer corrupção, pelo incremento do desenvolvimento sustentável e pelo diálogo que resulte num compromisso entre os responsáveis pela administração dos poderes do Estado e a sociedade. É inadmissível alimentar a crise econômica com a atual crise política. O Congresso Nacional e os partidos políticos têm o dever ético de favorecer e fortificar a governabilidade.
As suspeitas de corrupção devem ser rigorosamente apuradas e julgadas pelas instâncias competentes. Isso garante a transparência e retoma o clima de credibilidade nacional. Reconhecemos a importância das investigações e seus desdobramentos. Também as instituições formadoras de opinião da sociedade têm papel importante na retomada do desenvolvimento, da justiça e da paz social.
O momento atual não é de acirrar ânimos. A situação exige o exercício do diálogo à exaustão. As manifestações populares são um direito democrático que deve ser assegurado a todos pelo Estado. Devem ser pacíficas, com o respeito às pessoas e instituições. É fundamental garantir o Estado democrático de direito.
Conclamamos a todos que zelem pela paz em suas atividades e em seus pronunciamentos. Cada pessoa é convocada a buscar soluções para as dificuldades que enfrentamos. Somos chamados ao diálogo para construir um país justo e fraterno (CNBB, 10/3/2016).
O destaque da liturgia de hoje é o tema da libertação do passado. Paulo Apóstolo exorta-nos a olhar para frente, deixando nosso passado para trás, esticando-nos para apanhar o que está na nossa frente: Cristo nossa vida. Não que já tenha recebido tudo isso ou que já seja perfeito. Mas corro para alcançá-lo, visto que já fui alcançado por Cristo Jesus. Irmãos, eu não julgo já tê-lo alcançado. Uma coisa, porém, eu faço: esquecendo o que fica para trás, eu me lanço para o que está na frente. Corro direto para a meta, rumo ao prêmio, que, do alto, Deus me chama a receber em Cristo Jesus (Fl 3,8-14).
O profeta Isaias também nos exorta: Não relembreis coisas passadas, não olheis para fatos antigos. Eis que eu farei coisas novas, e que já estão surgindo: acaso não as conheceis? Pois abrirei uma estrada no deserto e farei correr rios na terra seca (Is 43,16-21). Para o profeta são as coisas novas acontecendo, prenúncio da libertação que está próxima.
O ministério de Jesus, que inaugura a força do Reino na dinâmica da História, é um convite à vida nova: “Vai, não peques mais” e à alegria do perdão, como reconciliação com Deus e participação no Corpo de Cristo.
O pregador do retiro quaresmal do papa, meu confrade da ordem dos Servos de Maria, Pe. Ermes Ronchi, refletindo o evangelho deste domingo, insiste sobre a experiência da misericórdia e do perdão: O perdão de Deus é amor autêntico que nos ajuda a nos transformarmos no melhor daquilo que podemos ser. A passagem evangélica da mulher adúltera perdoada por Jesus lembra-nos que acusadores e hipócritas negam Deus, a Sua misericórdia. Quem ama acusar, entusiasmando-se com os defeitos dos outros acredita de salvar a verdade lapidando aqueles que erram. Mas assim nascem as guerras. São provocados conflitos entre as nações, mas também nas instituições... onde as regras, constituições e decretos se transformam em rochas para lapidar alguém. Os poderes que não hesitam em usar uma vida humana e a religião colocando Deus contra o homem. É essa a tragédia do fundamentalismo religioso. O Senhor não suporta hipócritas, aqueles das máscaras, do coração duplo, os comediantes da fé, e não suporta acusadores e juízes.
Onde há misericórdia, escrevia Santo Ambrósio, ali está Deus; onde há rigor e severidade talvez existam os ministros de Deus, mas não Deus. Para Jesus não interessa o remorso, mas a sinceridade do coração. O seu perdão é sem condições, sem cláusulas, sem contrapartidas.
Jesus coloca ele mesmo no lugar de todos os condenados, de todos os pecadores. Rompe a “rede maléfica” ligada à ideia de “um Deus que condena e se vinga, justificando a violência”. É a cura dos frágeis, é a cura dos últimos, dos portadores de deficiências e a atenção às pedras descartadas que indicam o grau de civilização de um povo, não as proezas dos fortes e dos poderosos. O coração da história não é o pecado para ser condenado ou perdoado. Ao centro não há o mal, mas “um Deus maior do nosso coração” que não banaliza a culpa, mas faz repartir o homem de onde ele tenha parado. Abre sentimentos, recoloca na estrada certa, faz realizar um passo para frente, “escancara o futuro”.
Vai e, a partir de agora, não peque mais: são palavras suficientes para mudar uma vida. O bem possível de amanhã conta mais que o mal de ontem.
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