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Dom Moacyr

Dignidade da Política!



Reconciliação é a proposta para esta 4ª semana quaresmal, que nos liberta e oferece-nos uma realvisão sobre Deus, pois, “somente à luz desse novo olhar para Deus é que se poderá compreender o modo pelo qual ele atua na história”.

Recordando o martírio de Monsenhor Oscar Romero que, em março de 1980, deu a sua vida pelo povo pobre de El Salvador, o teólogo beneditino, Marcelo Barros, lembra-nos suas palavras: “É preciso reabilitar a dignidade da Política”.

Diante do processo de degradação política que vive o Brasil atualmente, o documento 22 da CNBB, “Reflexão Cristã sobre a Conjuntura Política”, de 1981, ilumina-nos com suas reflexões: As desigualdades sociais e regionais constituem uma realidade particularmente triste, em uma nação com aspirações e recursos que poderiam permitir uma sociedade mais justa. Tal situação não pode durar indefinidamente, pois constitui um escândalo para as consciências e uma ameaça constante à paz interna. Ela não é casual, mas fruto de uma opção deliberada em favor de um determinado modelo de desenvolvimento (n.1).

Nosso país continua desigual e a luta pelo poder chegou a tal ponto que há total descrédito das instituições públicas. “  A redemocratização brasileira se defronta, com efeito, por um lado, com a resistência de minorias inconformadas em perder seu poder de arbítrio”. Por outro lado, alega-se que a plena instauração das liberdades democráticas possa dificultar uma austera gestão das difíceis condições socioeconômicas do país (doc/CNBB 22,11).

Impossível uma transformação social e politica quando há guerra pelo poder. Percebe-se claramente que a elite conservadora não quer perder poder e privilégios. No entanto, “existem sinais de esperança” e “novos valores emergentes, igualmente necessários para o projeto democrático”. O documento 42 da CNBB, “Exigências éticas da Ordem democrática”, de 1989, afirma que “a nova Ordem Democrática brasileira só se consolidará quando a nação se empenhar decididamente numa transformação profunda, que modifique as relações sociais e garanta a efetiva participação de todos os cidadãos” (ns.01 e 51).

O cristão, por sua fé, tem motivos para a esperança: Deus se faz presente na História e inspira sempre novas forças para a construção de um mundo novo, conforme o seu plano de amor (n.52). Continua atual a exigência de transformações profundas, estruturais, sem as quais a nossa sociedade não se tornará plenamente democrática, nem a dignidade da pessoa humana será plenamente reconhecida e garantida (103). Acreditamos que haja crescente consenso da nação, amadurecida pelo sofrimento de longos anos de arbítrio e pela difícil conjuntura por eles legada, de que as mudanças devem processar-se de forma democrática, dentro dos espaços abertos pela Constituição (104).

     Cremos que “continua atual a exigência de que a transformação da sociedade seja obra de todo o povo”. As dificuldades conjunturais, gerando, hoje, forte onda de pessimismo, inclusive entre a juventude, não nos devem fazer recuar diante do desafio da construção da democracia; antes, devem preparar os ânimos a enfrentar com tenacidade, coragem e perseverança o “duro aprendizado” da liberdade na solidariedade (105).

     A liturgia de hoje vem nos fortalecer apresentando o Evangelho de Lucas, capítulo 15, que é a chave de interpretação da obra de Jesus: Deus sai em busca do perdido (Lc 15,1-3.11-32).

Esse capítulo é o coração de todo o Evangelho (a Boa Notícia). Aí vemos que o amor do Pai é o fundamento da atitude de Jesus diante dos homens. Respondendo à crítica daqueles que se consideram justos, cheios de méritos, e se escandalizam da solidariedade para com os pecadores, Jesus narra três parábolas. A primeira e a segunda mostram a atitude de Deus em Jesus, questionando a hipocrisia dos homens. A terceira tem dois aspectos: o processo de conversão do pecador e o problema do “justo” que resiste ao amor do Pai.

O processo de conversão começa com a tomada de consciência: o filho mais novo sente-se perdido econômica e moralmente. A acolhida do pai e as medidas tomadas mostram não só o perdão, mas também o restabelecimento da dignidade de filho. O filho mais velho é justo e perseverante, mas é incapaz de aceitar a volta do irmão e o amor do pai que o acolheu. Recusa-se a participar da alegria. Com esta parábola, Jesus faz apelo supremo para que os doutores da Lei e os fariseus aceitem partilhar da alegria de Deus pela volta dos pecadores à dignidade da vida (BP).

     Outra leitura legítima: o filho caçula representa todo homem pecador, cada um de nós, enquanto separa-se da sua origem, do seu Pai, Deus. Indo mais longe: este filho de Deus desgarrado é a humanidade inteira.

Esta reconciliação se opera pelo ato pascal: “Teu irmão estava morto e tornou a viver; estava perdido e foi encontrado”. Estas palavras, "morto e tornou a viver; perdido e foi encontrado" pertencem ao vocabulário da ressurreição (M.Domergue).

O Livro de Josué destaca a reconciliação na celebração da Páscoa: os hebreus comeram do produto da terra e depois disso o maná cessou (Js 5, 9a.10-12). Assim como o maná, o fruto da terra é símbolo da provisão generosa de Deus, agora de forma diferente, porque a etapa histórica também é diferente. A posse da terra prometida exigia um povo renovado, distinto do que estava no Egito, com um estilo alternativo de viver, como uma nova humanidade. Era a consolidação das relações entre Deus e seu povo e a afirmação da identidade de povo de Deus. Por isso era necessário celebrar (VP).

     Para o apostolo Paulo, a reconciliação exige uma vida nova e diferente marcada pelo modo como julgamos os outros (2Cor 5,17-21).  Na reconciliação, o perdão é essencial. Paulo declara que a perspectiva da qual o cristão vê todas as coisas deve ser a mesma de Jesus. O apóstolo é credenciado para afirmar isso porque houve um tempo em que ele julgou erroneamente os seguidores do Messias.

A maratona penitencial, proposta pelo papa Francisco, permite-nos viver uma vida nova a partir do perdão e da reconciliação convida toda a Igreja. É o momento das “24 horas para o Senhor” (dias 4-5/3/2016 e outros dias conforme a programação de cada diocese). A iniciativa propõe igrejas abertas também durante a noite, com a exposição permanente do Santíssimo Sacramento e sacerdotes disponíveis para confessar e faz parte do Jubileu extraordinário da Misericórdia.

     Na Bula de proclamação Misericordiae vultus, o papa escreve: “A iniciativa 24 horas para o Senhor, a ser celebrada na sexta-feira e sábado antes do quarto domingo da Quaresma, deve aumentar nas Dioceses. Muitas pessoas estão se aproximando do sacramento da Reconciliação e entre elas muitos jovens, que em tal experiência reencontram muitas vezes o caminho para voltar ao Senhor, para viver um momento de intensa oração e redescobrir o sentido da própria vida”.

Na Catedral de Porto Velho e nas paroquias está sendo intensificado esse momento de penitencia quaresmal com celebrações e confissões.  A misericórdia não se reduz ao sacramento da reconciliação, ela tem um horizonte muito mais amplo, que compromete cada um de nós a tornar-nos instrumentos de misericórdia para o próximo.

     Hoje, dia 06, acontece em toda a Arquidiocese um esforço conjunto para um mutirão de limpeza na própria casa e demais casas e locais do bairro e da comunidade, gesto concreto da Campanha da Fraternidade.

     O gesto nacional dessa Campanha é a Coleta Ecumênica da Solidariedadeque vai acontecer no dia 20 de março, Domingo de Ramos. Do total arrecadado na Coleta, 40% são enviados ao Fundo Ecumênico de Solidariedade (FES) para apoio a projetos relacionados ao tema da CFE, que este ano trabalha a questão do saneamento básico. O outro montante, 60% do valor, permanece nas dioceses, sínodos, presbitérios e comunidades cristãs para apoiar iniciativas sociais em âmbito local. A Alemanha participa conosco desta Campanha da Fraternidade Ecumênica através da Misereor, entidade episcopal da Igreja Católica nesse país. Também integram a Comissão da Campanha de 2016: Igreja Católica Apostólica Romana (ICAR), Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB), Igreja Episcopal Anglicana do Brasil (IEAB), Igreja Presbiteriana Unida (IPU), Igreja Sirian Ortodoxa de Antioquia (ISOA), Centro Ecumênico de Serviços à Evangelização e Educação Popular (Ceseep), Visão Mundial e Aliança de Batistas do Brasil.

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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