Domingo, 24 de janeiro de 2016 - 11h39
Ao chamar o capitalismo de “ditadura sutil” o papa Francisco questionou:
Reconhecemos que este sistema impôs a lógica dos lucros a qualquer custo, sem pensar na exclusão social ou na destruição da natureza?
Em seguida, responde: Se é assim, insisto, digamos sem medo: queremos uma mudança, uma mudança real, uma mudança de estruturas. Este sistema já não se aguenta e tampouco o aguenta a Terra, a irmã Mãe Terra.
Para o teólogo Leonardo Boff, uma saída possível nesse tempo de mudança, acontece a partir de outro lugar social, daqueles que vêm debaixo, da sociedade organizada e dos movimentos sociais que possuem outro sonho de Brasil e de mundo. É preciso que estudem e se organizem, pressionem as classes dominantes e o Estado patrimonialista e se preparem para eventualmente propor uma alternativa de sociedade ainda não ensaiada, mas, que possua raízes naqueles que no passado lutaram por um outro Brasil e com projeto próprio.
O discurso-programa de Jesus em Nazaré, apresentado na liturgia deste domingo, é o cumprimento da profecia de Isaías e, mais ainda, de toda Escritura. “Este é o dia”, insistem as leituras. Este é o tempo de mudanças e reformas (reforma política radical, reforma agrária e urbana, mudança na educação e na saúde), pois “um povo doente e ignorante nunca fundará uma nova e possível”.
Não somos uma nação subserviente. Para o sociólogo, diretor do Ibase, Cândido Grzybowski, o que não dá é para continuar a apostar na possibilidade do Brasil ser um sócio submisso e dócil de um desenvolvimento capitalista concentrador de riquezas e destruidor do próprio planeta, comandado pelo cassino global de grandes corporações e de especuladores, que criam riqueza financeira fictícia de mais de 10 vezes o PIB mundial.
Perante a desconstrução das políticas e instituições que garantem direitos, ele destaca o futuro que o neoliberalismo aponta como o aprofundamento do mesmo sistema do capitalismo socialmente excludente e ambientalmente predador. Um sistema no qual só uns poucos países ganham; não há lugar para todo mundo no desenvolvimento do capitalismo; a opção democrática é exatamente o transitar, sem guerra e nem barbárie, para modelos políticos e economias adequadas que priorizam a justiça socioambiental e não a acumulação privada de riquezas.
O discurso de Jesus na sinagoga de Nazaré ilumina a nossa realidade. Colocada no início da vida pública de Jesus, o texto constitui o programa de toda a atividade de Jesus (Lc 1,1-4;4,14-21). O Evangelho de Lucas nos conduz à Galileia, terra dos excluídos, mais precisamente na cidade de Nazaré, onde Jesus tinha crescido.
Jesus abriu o rolo do profeta Isaías, no texto que fala da missão do mensageiro de Deus para instaurar a verdadeira justiça e liberdade, pelo fim da opressão e a realização de um ano sabático ou jubilar, para restituição dos bens alienados, com vistas a um novo início de uma sociedade realmente fraterna, como convém ao povo de Deus (Dt 15).
O profeta Isaias (Is 61,1-2) anunciara que o Messias iria realizar a missão libertadora dos pobres e oprimidos. Jesus aplica a passagem a si mesmo, assumindo-a no hoje concreto em que se encontra. No ano da graça eram perdoadas todas as dívidas e se redistribuíam fraternalmente todas as terras e propriedades: Jesus encaminha a humanidade para uma situação de reconciliação e partilha que tornam possíveis a igualdade, a fraternidade e a comunhão (BP).
Ao anunciar o início de uma nova situação da comunidade, restaurada conforme a vontade de Deus, Cristo inicia o tempo messiânico; proclama que esta profecia se realiza no presente momento (“hoje”); Ele é porta-voz estabelecido por Deus e impulsionado por seu espírito para levar a “boa-nova aos oprimidos”. (Konings). “Hoje se cumpriu esta passagem da Escritura que acabastes de ouvir”.
O mesmo dia da descoberta da Lei é o dia da descoberta da Graça. A Lei exige ser cumprida por atos; a Graça pede para ser recebida na fé. Deus nos “dá a graça”, nos perdoa, enquanto que nossa desobediência à Lei nos condena. A Lei nos revela como sermos homens e mulheres de verdade e o que nos pode desumanizar.
Sair do caminho balizado pela Lei significa escolher a morte. Cristo, o despenseiro da graça, vem restaurar em nós o que deteriora a nossa humanidade. Cristo vem assumir para si tudo o que nos é contrário. A verdade não é que ele tenha suprimido tudo isto, mas, quando estas ações se tornam inimitáveis, ele nos dá o poder de usar as nossas falhas para que amemos mais e que nos tornemos sempre mais imagens de Deus (M. Domergue).
O profeta Neemias vai começar a sua atividade com a reconstrução da cidade (muralha), com o combate às injustiças cometidas pelos ricos contra os pobres, com a restauração do culto (Ne 8,2-4a.5-6.8-10). Ele reúne todo o Povo “na praça que fica diante da Porta das Águas”. Juntos escutam a leitura da Lei. O profeta recorda ao Povo o compromisso fundamental que Israel assumiu com o seu Deus: só assim será possível preparar esse futuro novo que Neemias sonha para Jerusalém e para o Povo de Deus.
Paulo Apostolo, cuja festa vamos celebrar na segunda, dia 25, propõe-nos o célebre paralelo entre o corpo humano e o povo crente. A primeira evidência que decorre daí é que nossa unidade não apaga a nossa diversidade, mas, ao contrário, alimenta-se dela. As nossas diferenças se acham valorizadas e concorrem para a coesão deste corpo complexo que é a Igreja.
Paulo insiste nas partes do corpo que são mais frágeis e que parecem menos respeitáveis ou menos decentes (IHu). E estes são os membros que demandam mais respeito e honradez. Estes membros são as pessoas mais fracas na comunidade e na sociedade, que devem ser objeto da nossa consideração e que devem mobilizar a nossa atenção. Para quem veio o Cristo? Não para os “grandes deste mundo”, mas para os pobres, os prisioneiros (com ou sem razão), os cegos, de uma cegueira que pode ser física ou moral, os oprimidos; não nos enganemos: a libertação que o Cristo lhes traz ou vai passar por nós, que somos o seu Corpo, ou permanecerá letra morta.
Insisto: a Palavra de Deus continua iluminando a nossa realidade, as nossas comunidades, sobretudo, a nossa sociedade e política. Não basta uma reforma na legislação, mesmo ela sendo necessária. A condição indispensável para nova onda política democrática é a cidadania em ação. Este é o primeiro grande desafio para criar possibilidades de outro Brasil, desde aqui e agora.
Um olhar atento e solidário às resistências e insurgências cidadãs no ambiente em que vivemos pode ser o pilar de uma agenda mobilizadora que, de baixo para cima, alimente uma poderosa onda democratizadora.
Queremos doravante, ver as resistências e insurgências que pipocam pelo Brasil nos últimos anos tendo a defesa e a promoção dos bens comuns como algo central. Podem ser resistências urbanas, como favela é cidade, a luta por transporte e a mobilidade urbana coletiva como direito de cidadania, a luta pela água e o saneamento como bens comuns, a valorização da produção cultural popular e de rua, escolas e saúde pública, entre tantas outras lutas.
Muitas delas e cada vez mais são resistências nos territórios rurais como comuns humanizados e criados ao longo de gerações, seja contra o agronegócio predador e concentrador, seja à grande mineração e os grandes projetos de interesse dos grandes conglomerados empresariais, sem respeito nenhum às populações locais e seus comuns. Para Grzybowski, do Ibase, todas estas agendas emergentes, de resistências e insurgências, devem entrar no nosso campo de análise e do novo ativismo cidadão que precisamos construir para outro futuro do nosso Brasil.
Possa a Campanha da Fraternidade, que vai começar no próximo dia 10 de fevereiro, ajudar-nos a assumir, com toda a sociedade brasileira, nossa responsabilidade diante das mudanças e crises de nosso país e do planeta.
Não deixemos a “ditadura sutil” seguir no comando das decisões sobre a nossa vida e a vida da Humanidade.
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