Sábado, 2 de abril de 2011 - 18h12
A questão ecológica está hoje entre as mais importantes. Contudo, analisando, a questão mais crucial não é propriamente a ecologia, como também não é a pobreza, o feminino, a identidade cultural ou a insegurança, mas é a questão do sentido da vida. Para que viver? Vale a pena viver? O grande problema é a desvalorização da existência, do ser, do mundo. É, em suma, o desamor à vida e é uma questão que está na base de todas as outras.
Esta é uma reflexão que envolve o tema da Campanha da Fraternidade e é proposta por um confrade de minha Ordem (Servos de Maria), Frei Clodovis M.Boff, que mostra a atual crise ecológica como parte de uma crise maior, que investe toda a civilização moderna e que se pode chamar de crise de sentido ou de “niilismo”. E a raiz da crise de sentido está no “secularismo”, ou seja, no fato de se viver como se Deus não existisse; a crise ecológica, portanto, só se resolve, pela raiz, equacionando a crise de sentido, ou seja, recuperando a dimensão religiosa ou espiritual da vida.
Já foi demonstrado que a "morte de Deus", comemorada por Nietzsche, não gerou um homem mais feliz, e sim mais solitário e mais violento, como evidenciado por guerras e massacres perpetrados pelos totalitarismos, tanto de direitas quanto de esquerdas, durante o século XX. Para o arcebispo Dom Bruno Forte, o ocaso das ideologias deu lugar ao “tempo da noite do mundo”, um tempo tão pobre, que não reconhece a falta de Deus como ausência.
A existência aparece sem vida, sem cores, desbotada. As pessoas estão ficando com “olhos apagados”, segundo a expressão bíblica (Dt 28,65). Se a ecologia da natureza vai mal, pior ainda a “ecologia do homem”. É o homem que não se sente bem, por isso contagia a natureza com seu mal estar. Não é só no oikos da natureza que o homem não se sente em casa, mas no oikos de sua alma. É como alguém que mora num palácio, mas tem a alma atormentada.
Esse desamor à vida se mostra nas várias dimensões do relacionamento humano. Vivemos, em verdade, numa cultura antilife no sentido mais amplo do termo. A desvalorização da natureza entra aí como parte e expressão do “niilismo” como a desvalorização geral das coisas. De fato, se minha vida não vale a pena, a vida da natureza vale menos ainda. Se não me amo e estimo, amo e estimo menos ainda o meio ambiente.
Com muita razão João Paulo II declarou: “A degradação do ambiente é um dos aspectos preocupantes de uma crise moral profunda”. “Se o sentido da pessoa e da vida humana falta, o homem se desinteressa também do outro e da terra” (Mens.Dia da Paz.1990).
O perigo de destruição da terra é hoje tanto maior quanto mais poderosos são os meios de destruição que o homem tem à disposição, como o arsenal atômico e a maquinaria industrial moderna. Porém o perigo não está nesses meios em si, mas no ser humano que faz uso deles. Se o ser humano está com o coração corroído pelo vírus niilista, então temos que nos ocupar em primeiro lugar com ele próprio, buscando libertá-lo dessa doença mortal. É preciso salvar antes de tudo o homem, se queremos salvar o mundo do homem. Pois, se é verdade que a humanidade e sua sobrevivência dependem das condições ambientais, é também verdade que estas dependem muito mais ainda da humanidade e de sua responsabilidade.
Para salvar o homem, “as mentes mais alertas advertem sobre a necessidade de um retorno ao sagrado, reconhecendo diversos sinais de esperança”, responde Bruno Forte. Aparece na inquietude pós-moderna uma espécie de busca do Outro, do hóspede pelo qual se anseia e, ao mesmo tempo, que perturba. O resultado é a fome e a sede de sentido, declaradas ou não, ou seja, a necessidade de dar sentido a uma vida tão frágil.
Qual é, então, o Deus de quem se pode falar aos homens e mulheres do nosso tempo? Um Deus de confiança, que não nos violenta, porque quer para si somente homens livres. Na pergunta que cada um carrega dentro de si sobre a inevitabilidade da morte, vai se perfilando a imagem de um pai-mãe no amor, alguém em quem confiar sem reservas, quase um porto para repousar nosso cansaço e nossa dor, certos de não ser lançados ao abismo do nada. Escolher de que lado se quer estar: isso é o risco da fé. Não fomos nós que amamos a Deus em primeiro lugar, e sim Ele quem nos amou.
O anseio por Deus no mundo contemporâneo, conclui o arcebispo, não está dirigido a um juiz, mas ao Crucifixo. O Homem do Sudário atrai porque nessa fraqueza se revela o amor infinito de Deus. Qual é, então, o passo a ser dado? Render-se a este amor, que não é fraqueza, mas boa notícia.
Na crise ambiental atual, fica patente o poder destruidor do pecado. É o mesmo poder que nega ou deturpa a relação dialógica com o Deus da Vida e do Amor, as relações entre homem e mulher bem como as outras relações entre os seres humanos. É o mesmo poder mortífero cristalizado em estruturas sociais injustas e em modos de produção-consumo destruidores do meio ambiente. A alienação do ser humano em relação ao projeto de Deus sobre a humanização, manifesta-se na sociedade injusta e opressora e na utilização abusiva e destruidora da natureza (TB/CF).
Só uma ecologia aberta ao Transcendente pode opor-se eficazmente ao niilismo ecológico. Segundo Clodovis Boff, para a fé cristã, especificamente, o centro da realidade não é nem o homem nem a natureza, mas Deus que é a medida de tudo, tanto do homem como da natureza. Ambos existem por Seu amor e para Sua glória, sendo que em Sua glória eles encontram sua realização plena.
Mas qual o lugar legítimo do ser humano na Criação? Nem no topo e nem aos pés, mas no meio: entre Deus e o mundo, entre o Criador e a criatura A importância central do ser humano é clara também no Novo Testamento. Para Cristo, uma só pessoa vale mais que todo universo: “Que adianta o homem ganhar o mundo inteiro se vier a perder sua alma?” (Mc 8,36). Por várias vezes Jesus coloca o ser humano acima das outras criaturas (Mt 10,31; 12,11; Lc 13,15), sem por isso cair no desprezo das mesmas, antes, o Pai cuida delas também (Mt 6,26-30; 10,29). Há, pois, na Criação uma hierarquia, que S. Paulo anuncia assim: “Tudo é vosso, vós sois de Cristo e Cristo é de Deus” (1Co 3,22-23). Se o ser humano goza de alguma superioridade, essa vale como serviço aos demais, como é lei no evangelho: “O maior seja o vosso servo” (Mc 10,43). Isso se aplica também no âmbito da natureza.
Para “reamorizar” a natureza de modo profundo e consistente temos que ir à fonte: o Criador. Quanto mais amor houver pelo Criador, mais amor haverá por suas criaturas. É o que sucedia com os santos, em particular com o santo da ecologia, São Francisco. Precisamos reaprender a considerar todas as coisas como “criaturas” de Deus. É especialmente nos seres vivos que Deus mostra sua presença e seu poder maravilhoso. A própria vida é um sopro provindo do Criador (Gn 2,7), e um “sopro incorruptível” (Sb 12,1). Quanto, em particular, ao ser humano, ele é, diante de Deus, o “sacerdote do cosmos”. É preciso, pois, redescobrir a espiritualidade da Criação que esteja à altura do desafio ecológico. E, sendo a justiça o respeito do direito, deve haver também uma “justiça ecológica”. O ser humano tem deveres éticos em relação à natureza. Como “imago Dei”, o homem é o “pastor da Criação”. Está aí para geri-la “em nome de Deus” e segundo sua vontade. Fonte e medida da justiça ecológica não é o homem, nem é a própria natureza, mas Deus, Criador do homem e da natureza.
A conversão a Deus implica numa autêntica conversão às criaturas, inclusive na forma da “conversão ecológica”, de acordo com a expressão de João Paulo II. O mundo é bom “aos olhos de Deus” e não simplesmente “aos olhos do homem”.
Precisamos, por fim, de uma nova forma, de comunhão com a natureza numa irmandade universal sob o olhar do Criador. Só redescobrindo o Criador redescobriremos as criaturas e seu valor. Impelidos pela fé no Criador e Pai nos comprometemos em favor das criaturas. Combatendo ao lado de outros promotores da causa ecológica, cuidaremos para não ocultar e menos ainda sacrificar nossa identidade espiritual. Hoje descobrimos que a fé é “sal da terra” também no plano ecológico: sal que preserva a terra da corrupção e que lhe devolve o gosto do sentido.
Fonte: Pascom
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