Domingo, 24 de novembro de 2024 | Porto Velho (RO)

×
Gente de Opinião

Dom Moacyr

Semana Santa: a Cruz que o povo carrega!


 
Estamos celebrando o Domingo de Ramos e iniciando a Semana Santa; a grande semana em que se celebra a vida, a morte e a ressurreição de Jesus; mistério central de nossa fé; mistério pascal, da passagem da vida para a morte e da morte para a ressurreição.

Hoje, Coleta Nacional da Solidariedade, somos chamados a assumir o gesto concreto da Campanha da Fraternidade em prol dos necessitados e objetivos da CF 2015. Jovens do mundo inteiro celebram a Jornada mundial da Juventude em preparação à JMJ de 2016 em Cracóvia, Polônia (26-31/7) que tem como tema “Bem aventurados os misericordiosos, porque eles alcançarão misericórdia” (Mt 5,7).

O papa, em sua mensagem para este dia, agradece a Deus pelos preciosos frutos que a JMJ produziu na vida de tantos jovens por toda terra; “quantas descobertas importantes, sobretudo as de Cristo, Caminho, Verdade e Vida, e da Igreja como uma família grande e acolhedora; quantas mudanças de vida, quantas decisões vocacionais brotaram daqueles encontros”!

Durante cinco semanas da Quaresma preparamos os nossos corações pela oração, pela penitência e pela caridade. Com a Semana Santa iniciamos, com toda a Igreja, a celebração da Páscoa de nosso Senhor.

Para realizar o mistério de sua morte e ressurreição, Cristo entrou em Jerusalém, sua cidade, dando pleno cumprimento às Escrituras. Ele desceu ao nosso encontro, partilhou da nossa humanidade, fez-se servo dos homens, doou a sua vida para que o egoísmo e a injustiça fossem vencidos. Celebrando com fé a memória desta entrada, sigamos os passos de nosso Salvador para que, associados pela graça à sua cruz, participemos de sua ressurreição e de sua vida (VP).

A liturgia do Domingo de Ramos nos introduz na dinâmica deste mistério de amor: “Bendito és tu que vens com tanto amor” (Antífona/entrada). Obediente ao projeto do Pai, Jesus entra em Jerusalém como prefiguração de sua entrada na Glória (Mc 11,1-10/procissão). Trata-se da caminhada de Jesus até ao ponto culminante da sua existência terrena. Em Jerusalém, ele irá completar sua missão. Assim como a multidão estendia seus mantos e o aclamavam com ramos de oliveira, hoje, em procissão, carregamos ramos, recordando o acontecimento. Os ramos eram sinal de alegria, porque o povo tinha em Jesus o seu rei e messias. Eles serão abençoados e levados para as casas como recordação de Cristo vencedor da morte.

Na leitura da Paixão, Jesus, o Filho de Deus, é condenado à morte de cruz (Mc 14,1-15,47). A cruz é compreendida como escândalo e loucura para judeus e gregos. Talvez isso explique o fato da fuga dos amigos de Jesus no acontecimento da sua trágica morte.

A celebração da Páscoa marcava a noite em que o povo de Deus foi libertado da escravidão do Egito. Jesus vai ser morto como o novo cordeiro pascal: sua vida e morte são o início de novo modo de vida, no qual não haverá mais escravidão do dinheiro e do poder. A ceia pascal de Jesus com os discípulos recorda a multiplicação dos pães. Ela substitui as cerimônias do Templo e torna-se o centro vital da comunidade formada pelos que seguem a Jesus. O gesto e as palavras de Jesus não são apenas afirmação de sua presença sacramental no pão e no vinho. Manifestam também o sentido profundo de sua vida e morte, isto é: Jesus viveu e morreu como dom gratuito, como entrega de si mesmo aos outros, opondo-se a uma sociedade em que as pessoas vivem para si mesmas e para seus próprios interesses (BP). Na ausência de Jesus, os discípulos são convidados a fazer o mesmo: partilhar o pão com os pobres e viver para os outros.

Jesus é o Filho querido de Deus, que une sua vontade à do Pai, para, pelo dom da própria vida, vencer as feras que dominam este mundo e quebrar sua força definitivamente (Konings). Ao ser condenado pelo sumo sacerdote de seu povo, ele se proclama portador de uma autoridade: a do Filho do Homem. Quando ele morre na cruz, por causa da justiça e do amor, o representante do mundo universal, o militar romano, exclama: “Este era de fato Filho de Deus”. Ambos os títulos significam o respaldo que Deus dá a Jesus, e que se verificará na gloriosa ressurreição dentre os mortos. Jesus é vencedor pela morte por amor em obediência filial (Filho de Deus), mas também pelo julgamento que derrota o poder deste mundo (Filho do Homem).

O profeta Isaías descreve a missão do Servo sofredor como aquele que confia em Deus, seu Auxiliador, sem resistência (Is 50,4-7). Sempre é Deus que age, tanto para o discípulo falar quanto para ouvir. A imobilidade não faz parte do perfil daquele que segue Jesus. A figura do servo sofredor abre uma perspectiva nova. O servo padece o sofrimento porque veem nele a consequência dos pecados do povo. Ele carrega as dores dos outros. Todavia, o martírio vivido pelo servo se apresenta como a cura para os demais (VP).

Precisamente porque Deus exaltou Jesus da morte (Aclamação), revelando seu ser como Amor desmedido e transbordante. A palavra da cruz é uma palavra de vida, que diz que Deus assumiu a história da vida, paixão e morte de Jesus. Em Jesus, Deus assumiu a humanidade e sua morte, por isso, nos sacramentos, buscamos alcançar a ressurreição, a vida nova do Ressuscitado (Or. comunhão).

Paulo Apostolo apresenta Cristo obediente (Fl 2,6-11). Elevado à condição de Senhor, não se apresenta como um César. Jesus sempre se apresentará como um Senhor que é, ao mesmo tempo, um servo. Por isso é o único que pode esvaziar-se de si mesmo e humilhar-se, assumindo a condição de um escravo. Não importa se essa obediência o levará à morte. O que mais importa é a presença dele entre as muitas cruzes que o Império Romano disseminava naquela época e as muitas cruzes que o nosso povo hoje precisa carregar.

Mas sua morte, que poderia ser entendida e sentida como um apartar-se de Deus (Sl 21) é momento de comunhão suprema de Deus com Jesus e, Nele, com a humanidade inteira e o cálice é bebido como vontade do Pai (Ant. comunhão).

Somente percorrendo o caminho da fé (seguimento), podemos entender Jesus (sentido do segredo messiânico). Ou seja, em um mundo de pecado e injustiça, o Amor é o único caminho de superação da opressão (J.B.Burnier).

O que pode significar para nós e nossas Comunidades Eclesiais de Base seguir Cristo crucificado hoje, no contexto amazônico? Devemos, segundo o teólogo Jon Sobrino, “deixar-nos impactar pela realidade” (J.Sobrino):

Nosso povo do Acre vive a maior enchente de sua história. Nossas comunidades ribeirinhas padecem novamente devido as inundações e nossa gente das pequeninas comunidades está desalojada. A Amazônia continua sendo saqueada;

“os direitos já fragilizados dos povos indígenas, quilombolas, assentados e acampados, pescadores, ribeirinhos, vazanteiros, seringueiros, extrativistas, fundo e fechos de pasto, posseiros e camponeses são esmagados pelos interesses de um modelo de desenvolvimento que devora terras, territórios, tradições e modos de vida distorcendo a lei a seu dispor, cooptando e corrompendo processos e lideranças, usando a força e até assassinatos” (Assembleia CPT 2015).

Sofrem a juventude, as mulheres e crianças das comunidades. Vivem uma Semana Santa ameaçadora. “Nem toda vida é ocasião de esperança, mas o é, sim, a vida de Jesus, quem, por amor, tomou sobre si a cruz” (Moltmann).

Nosso povo completa em sua carne o que falta à paixão de Cristo. Estar ao pé da cruz de Jesus é estar ao pé das cruzes da história, é absolutamente necessário para conhecer o Deus crucificado (Jesus, o Libertador).

Participemos intensamente do tríduo Pascal: começa na 5ª-feira com a Missa da Ceia até o domingo da Páscoa. É o ápice do ano litúrgico porque celebra a Morte e a Ressurreição do Senhor, quando Cristo realizou a obra da redenção humana e da perfeita glorificação de Deus pelo seu mistério pascal, quando morrendo destruiu a nossa morte e ressuscitando renovou a vida. Iniciando o Tríduo Pascal, Dom Esmeraldo e os presbíteros celebram na Catedral, às 8h, a Missa do Crisma (Missa dos Santos Óleos). Todos são convocados para este momento de profunda comunhão de toda a Igreja arquidiocesana, renovando sua pertença eclesial, elevando ação de graças pela instituição do sacerdócio, renovando seu compromisso pastoral e missionário.

Possa a expectativa da Páscoa definitiva animar-nos para testemunhar a confiança na misericórdia divina, o amor gratuito a todos, a luta pelos direitos humanos, o serviço aos necessitados e o perdão das ofensas. A todos uma abençoada Semana Santa e uma Feliz Páscoa!

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

Gente de OpiniãoDomingo, 24 de novembro de 2024 | Porto Velho (RO)

VOCÊ PODE GOSTAR

Pentecostes: Comunidades de rosto humano!

Pentecostes: Comunidades de rosto humano!

Palavra de Dom Moacyr Grechi – Arcebispo Emérito de Porto Velho

Páscoa do povo brasileiro - Por Dom Moacyr Grechi

Páscoa do povo brasileiro - Por Dom Moacyr Grechi

Hoje reafirmamos a nossa fé na ressurreição de Cristo; somos uma Igreja Pascal. Na oração do Credo, proclamamos a ressurreição dos mortos e a vida ete

Verdade libertadora! Por Dom Moacyr Grechi

Verdade libertadora! Por Dom Moacyr Grechi

  A Igreja, convocada a fortalecer o povo de Deus na atual conjuntura, é chamada a estar ao lado daqueles “que perderam a esperança e a confiança no B

Lugar seguro para viver! - Por Dom Moacyr Grechi

Lugar seguro para viver! - Por Dom Moacyr Grechi

  Diante do aumento da violência agrária que atinge trabalhadores rurais, indígenas, ribeirinhos, quilombolas, pescadores artesanais, defensores de di

Gente de Opinião Domingo, 24 de novembro de 2024 | Porto Velho (RO)