Sábado, 16 de janeiro de 2016 - 19h40
A releitura do Documento 91 da CNBB “Por uma reforma do Estado com participação democrática” permite-nos perceber, neste inicio de 2016, os sinais de reconstrução do Estado no “contexto de fragilização do Estado-Nação”, mediante a presença de “novos sujeitos sociais” (doc 91,19).
Estes “novos sujeitos exigem novas estruturas” e entre essas estruturas está o processo democrático. Querem e precisam fazer-se ouvir; não podem e não querem ser considerados e tratados como objetos; estão a questionar a atual forma de viver a democracia, com seus ritos e com seu arcabouço jurídico. Tal modelo de democracia não mais responde a seus anseios e necessidades como seres políticos (doc 91 n.32).
O documento ainda reforça que “a Democracia deve ser assumida por grupos aos quais até então havia sido negada”. Para que este processo se torne efetivo é necessário o reconhecimento do caráter pluricultural da nação e o direito à identidade cultural, individual e coletiva; da igual dignidade das culturas, rompendo com a supremacia institucional da cultura ocidental; do caráter do sujeito político dos povos de comunidades indígenas, rurais, ribeirinhas e quilombolas, superando o tratamento tutelar destes povos como objetos de políticas ditadas por terceiros; o reconhecimento das diversas formas de participação, consulta e representação direta de povos indígenas, camponeses e afrodescendentes (n.36).
Também a liturgia deste domingo é um convite à leitura dos “sinais” porque são gestos que apontam em direção a algo mais profundo do que podem ver os nossos olhos (Jo 2,1-11).
As bodas de Caná da Galileia é o começo de todos os sinais. O protótipo dos que Jesus irá realizando ao longo da sua vida; um resumo daquilo que vai acontecer através de toda a sua atividade: com sua palavra e ação, Jesus transforma as relações dos homens com Deus e dos homens entre si (BP). Na “transformação da água em vinho” nos é proposta a chave para captar o tipo de transformação salvadora que opera Jesus e que, em seu nome, devem oferecer seus seguidores (Pagola). “Este fez Jesus como início dos sinais. E manifestou a sua glória e seus discípulos creram nele”.
Todo o evangelho de João repete que em Jesus enxergamos o rosto do Pai, especialmente, na “hora” de sua “glória”. A hora que em Caná ainda não tinha chegado, mas para a qual esta narrativa nos orienta, mostrará a face de Deus em extremado amor para conosco (Konings).
O profeta Isaias fala do amor de Deus pelo seu Povo: trata-se de um amor inquebrantável, gera vida nova, alegria, festa, felicidade em todos aqueles que são atingidos por ele (Is 62,1-5). Gera, sobretudo, transformação radical, novo destino, novo nome (VP).
O apostolo Paulo fala da força da comunidade e aqui reafirmamos a força transformadora das CEBs. Ensina que dons, ministérios e atividades devem ser pensados como plurais; o que vale é a unidade do corpo que resulta do exercício da pluralidade (1Cor 12,4-11). O sentido e a razão de existir dons, ministérios e atividades estão relacionados à forma pela qual tudo chega como serviço às pessoas e devem servir à comunidade. Tudo o que somos e temos pertence à comunidade. Deus jamais concede algo para favorecer o império do individualismo. Na verdade, Deus pensa de forma comunitária e relacional.
A Palavra de Deus, através do evangelista, mostra desde o início da vida pública de Jesus o essencial que Ele veio nos revelar. Um Cristo que se deixa tocar e comover pelo sofrimento dos outros; que se apresenta como um Deus sensível e próximo.
Se olharmos ao nosso redor, nosso Brasil, nosso mundo podemos perguntar-nos quais são as necessidades que neste momento Maria está sinalizando: Eles não têm mais vinho; eles não têm casa; eles perderam tudo; eles estão com fome. Maria confia no seu Filho; ela simboliza todos aqueles que, em Israel, esperam a realização das promessas messiânicas. Representa aqueles que, conscientes da realidade aguardam algo novo.
Para comunicar a força transformadora de Jesus não bastam as palavras, são necessários os gestos. Evangelizar não é só falar, pregar ou ensinar; menos ainda julgar, ameaçar ou condenar. É necessário atualizar, com fidelidade criativa, os sinais que Jesus fazia para introduzir a alegria de Deus tornando mais feliz a vida dura de nossa gente.
No 1º encontro deste ano com o corpo diplomático do Vaticano (11/01), o papa Francisco, após saudar os embaixadores residentes em Roma, destacou que “um espírito individualista é terreno fértil para medrar aquele sentido de indiferença para com o próximo, que leva a tratá-lo como mero objeto de comércio, que impele a ignorar a humanidade dos outros e acaba por tornar as pessoas medrosas e cínicas”.
Porventura não são estes os sentimentos que muitas vezes nos assaltam à vista dos pobres, dos marginalizados, dos últimos da sociedade? E são tantos os últimos na nossa sociedade!
Sinalizando os migrantes, com o peso de dificuldades e tribulações que enfrentam diariamente à procura, por vezes desesperada, dum lugar onde viver em paz e com dignidade, o papa refletiu sobre a grave emergência migratória dizendo que devemos discernir as suas causas, perspectivar soluções, vencer o medo que inevitavelmente acompanha um fenômeno assim impressionante.
Toda a Bíblia nos conta a história duma humanidade a caminho, pois é conatural ao homem estar em movimento. A sua história é feita de muitas migrações, às vezes amadurecidas como consciência do direito a uma livre escolha, mas frequentemente ditadas por circunstâncias externas. Do desterro do paraíso até Abraão em marcha para a terra prometida, da história do Êxodo até à deportação para Babilônia, a Sagrada Escritura narra incômodos e sofrimentos, desejos e esperanças, que são comuns aos de centenas de milhares de pessoas em marcha nos nossos dias, com a mesma determinação de Moisés de alcançar uma terra onde corra leite e mel (Ex 3,17), onde possam viver livres e em paz.
Ouvimos hoje a voz dos milhares de pessoas que choram enquanto fogem de guerras horríveis, de perseguições e violações dos direitos humanos, da instabilidade política ou social, que frequentemente lhes tornam impossível a vida na própria pátria. É o grito de quantos se veem constrangidos a fugir para evitar barbáries indescritíveis contra pessoas indefesas como crianças e deficientes, ou evitar o martírio por simples filiação religiosa.
É triste, porém, constatar que muitas vezes estes migrantes não se enquadram nos sistemas de proteção baseados nos acordos internacionais. Como é possível não ver, em tudo isto, o resultado daquela “cultura do descarte” que põe em perigo a pessoa humana, sacrificando homens e mulheres aos ídolos do lucro e do consumo? É grave habituar-se a estas situações de pobreza, aos dramas de tantas pessoas, fazendo com que se tornem normalidade. As pessoas já não são vistas como um valor primário a respeitar, especialmente se são pobres ou deficientes, se ainda não servem (como os nascituros) ou já não servem (como os idosos). Tornamo-nos insensíveis a qualquer forma de desperdício, a começar pelo alimentar, que aparece entre os mais deploráveis, considerando as inúmeras pessoas e famílias que padecem fome e subalimentação.
É preciso, conclui o papa, um compromisso comum que inverta decididamente a cultura do descarte e da violação da vida humana, para que ninguém se sinta negligenciado ou esquecido nem sejam sacrificadas mais vidas pela falta de recursos e, sobretudo, de vontade política.
E hoje, antes que seja tarde demais, muito se pode fazer para impedir as tragédias e construir a paz. As migrações constituirão uma pedra angular do futuro do mundo, mais do que o têm sido até agora, e as respostas só poderão ser fruto dum trabalho comum, que respeite a dignidade humana e os direitos das pessoas.
O acolhimento pode ser ocasião propícia para uma nova compreensão e abertura de horizonte, tanto para quem é acolhido, que tem o dever de respeitar os valores, as tradições e as leis da comunidade que o acolhe, como para esta última chamada a valorizar aquilo que cada imigrante pode oferecer para benefício de toda a comunidade. Possa a fria indiferença de tantos corações ser vencida pelo calor da misericórdia, dom precioso de Deus, que transforma o temor em amor e nos torna artesãos de paz.
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