Sábado, 28 de dezembro de 2024 | Porto Velho (RO)

×
Gente de Opinião

Dom Moacyr

Vocação e missão: dois lados da mesma moeda


 
Na Bíblia toda vocação é para a missão e esta pressupõe um chamado. Do contrário, a vocação seria algo estéril, fechada em si mesma sem comunhão e consequências em prol do Reino e de sua justiça. Também não podemos reduzir a missão a uma tarefa posterior ao chamado ou a uma simples dimensão da vocação. A missão não é um acréscimo ou extensão da vocação, mas um componente essencial (seja leiga, religiosa ou sacerdotal). A missão faz parte do DNA de toda e qualquer vocação.

A vocação tem origem divina: Deus é quem toma a iniciativa e nos chama desde a sua gratuidade. O chamado é graça e o envio também. Tanto a vocação quanto a missão nunca visam o bem pessoal do vocacionado, mas de todo o povo de Deus. A verdadeira vocação e missão não são graças apenas para as pessoas escolhidas, mas para muitos conforme dizia Jesus referindo-se a sua própria vocação e missão: “O Filho do Homem não veio para ser servido, mas para servir e dar sua vida como resgate por muitos” (Mt 20,28).

O 3º Congresso Vocacional do Brasil tem como tema “Discípulos missionários a serviço das vocações” e acontece de 03 a 07 de setembro,em Itaici,SP. A segunda parte do Texto-Base do Congresso aprofunda a vocação e a missão do cristão e a identidade missionária da Igreja (35-76).

Nos evangelhos, aquele que chama é o mesmo que envia. Tal realidade confirma que vocação e missão são partes de um binômio inseparável e complementar. Ou como diz a expressão popular: ”são dois lados de uma mesma moeda”. Lados distintos, cada um com suas características próprias, mas partes de uma realidade inseparável onde uma pressupõe a outra (DAp 146).

A comunidade dos discípulos de Jesus é essencialmente missionária. A missão faz parte da própria natureza e identidade da Igreja (AG,2.6). É impossível pensar numa Igreja não missionária ou indiferente à missão. A comunidade dos seguidores de Jesus existe para a missão e dela procede. Por isso, podemos afirmar com segurança que todas as vocações e ministérios também são de natureza missionária e se fundamentam na missão de Jesus Cristo e do Espírito Santo.

De acordo a uma antiga tradição, o termo “Igreja” encontra sua raiz no livro do Deuteronômio para indicar a comunidade de Javé (Dt 23,2ss). Segundo o evangelho de Mateus a Igreja é a comunidade dos chamados e enviados para dar testemunho do Reino e da sua justiça. Mateus é o único evangelista a adotar o termo “Igreja” ao se referir à comunidade dos seguidores de Jesus Cristo (Mt 16,18; 18,17). Por isto ele é conhecido entre os estudiosos como o “evangelho eclesiástico” onde a comunidade dos discípulos missionários é chamada e enviada por Jesus ressuscitado: “Ide, portanto, e fazei que todas as nações se tornem discípulos, batizando-as em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo” (Mt 28,19). A Igreja é a comunidade dos chamados e enviados para dar testemunho e servir o Reino. Se de uma parte a Igreja é enviada, de outra ela está sempre enviando os seus discípulos missionários para o serviço da evangelização.

Todo chamado é feito em vista de uma missão, o envio. No Antigo Testamento vemos que Deus criou um povo missionário. Deus chama e envia o povo de Israel para ser o construtor de seu reino. Os grandes vocacionados da bíblia não são apenas modelos de pessoas chamadas, mas também são exemplos de missionários enviados a proclamar e a construir o reino. De maneira geral podemos afirmar que no Antigo Testamento Deus é o autor de todos os chamados enquanto que no Novo Testamento esta função é reservada a Jesus. Porém, tanto no Antigo quanto no Novo Testamento todos os vocacionados são enviados a uma determinada missão. Não há um único caso onde o tema da vocação aparece desvinculado do envio e da missão.

A resposta generosa à proposta vocacional é também um “sim” ao envio para a missão que em última instância é uma convocação a colaborar na realização do projeto de Deus. Marcos nos mostra de maneira clara que o encontro pessoal do vocacionado com Jesus é uma exigência que antecede o envio e o serviço missionário (Mc 3,13-14).

A missão dos discípulos de Jesus chamados a transformar a história pessoal e de toda a humanidade, está situada entre a manhã de Pentecostes e a volta gloriosa do Senhor (At 2,1-13). Os discípulos missionários formam a comunidade dos seguidores de Jesus comprometidos e preparados para a missão de anunciar e construir o reino e sua justiça. Enquanto chamados e enviados por Jesus os discípulos missionários o representam como verdadeiros embaixadores. O próprio Jesus chamou-os de “pescadores de homens” quando os convidou ao seguimento desde as margens do mar da Galiléia. (Mt 4,19; Mc 1,17).

O 3º Congresso Vocacional escolheu como lema a passagem bíblica onde encontramos o imperativo missionário de Jesus ressuscitado: “Ide, pois, fazer discípulos entre todas as nações” (Mt 28,19). Podemos dividir este texto de Mateus em quatro pequenas partes articuladas entre si: a primeira traz a indicação de voltar à Galiléia e encontrar-se com o Ressuscitado (vv. 16-17). A segunda consiste na solene proclamação de Jesus que recebeu de Deus o poder universal (v. 18). A terceira parte é o imperativo missionário (v. 19). A última parte é a garantia da presença do Ressuscitado junto aos discípulos missionários (v.20).

Os discípulos missionários recebem a autoridade para construir o reino e a sua justiça daquele que é o Senhor da história. Trata-se do poder de ser servidores do reino e continuadores da obra de Jesus que tem autoridade divina e humana, isto é, “no céu” e “na terra”. O mandamento de Jesus é para que todos os discípulos missionários prossigam a obra do reino e a sua justiça com a autoridade que eles receberam daquele que os chamou e os enviou a “todas as nações”. O Ressuscitado dá aos onze discípulos missionários o poder de servir ao reino e nunca usá-lo em beneficio próprio. Eles representam toda a Igreja chamada a servir e a proclamar a vontade de Deus. A missão indicada por Jesus Cristo supera as fronteiras, não exclui nenhum povo e alcança “todas as nações”.

Quem conduz os discípulos missionários e toda a Igreja é o Espírito Santo. O mesmo Espírito que desperta aqueles que acolhem o anúncio dos enviados de Jesus Cristo. Mateus deixa claro que Jesus ressuscitado é Deus morando no meio de nós para sempre. Os discípulos missionários caminham com a certeza de que aquele que os chamou estará sempre presente no meio deles. Jesus dá todas as garantias aos discípulos que jamais os abandonará.

O evangelista insiste em mostrar Jesus ressuscitado junto aos seus discípulos como presença viva e não apenas como uma lembrança ou recordação de um grande personagem do passado. Mateus começou o seu evangelho narrando “a origem de Jesus Cristo” e afirmando que ele é o “Emanuel”. Agora, ele termina a sua obra reafirmando que Jesus está sempre presente com os discípulos missionários até “a consumação dos séculos”. Os discípulos missionários chamados a "estar com Jesus" partem para a missão acompanhados por aquele que o envia.

A comunhão das vocações e ministérios nos recorda a comunhão trinitária. Todos os discípulos de Jesus, independentemente de sua vocação específica, participam da única vida divina na única missão da Igreja que consiste em seguir Jesus Cristo e anunciar o Reino e a sua justiça. Ao enviar os discípulos com a missão de “fazer discípulos” mediante o batismo, Jesus manifesta seu desejo de ampliar a comunidade daqueles que acolhem sua mensagem e assumem o projeto do Reino.

Fonte: Pascom
 

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

Gente de OpiniãoSábado, 28 de dezembro de 2024 | Porto Velho (RO)

VOCÊ PODE GOSTAR

Pentecostes: Comunidades de rosto humano!

Pentecostes: Comunidades de rosto humano!

Palavra de Dom Moacyr Grechi – Arcebispo Emérito de Porto Velho

Páscoa do povo brasileiro - Por Dom Moacyr Grechi

Páscoa do povo brasileiro - Por Dom Moacyr Grechi

Hoje reafirmamos a nossa fé na ressurreição de Cristo; somos uma Igreja Pascal. Na oração do Credo, proclamamos a ressurreição dos mortos e a vida ete

Verdade libertadora! Por Dom Moacyr Grechi

Verdade libertadora! Por Dom Moacyr Grechi

  A Igreja, convocada a fortalecer o povo de Deus na atual conjuntura, é chamada a estar ao lado daqueles “que perderam a esperança e a confiança no B

Lugar seguro para viver! - Por Dom Moacyr Grechi

Lugar seguro para viver! - Por Dom Moacyr Grechi

  Diante do aumento da violência agrária que atinge trabalhadores rurais, indígenas, ribeirinhos, quilombolas, pescadores artesanais, defensores de di

Gente de Opinião Sábado, 28 de dezembro de 2024 | Porto Velho (RO)