Segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014 - 21h44
Felipe Azzi
A pequena cidade, encravada na tríplice fronteira, a bem dizer, era um lugarejo. Mas tinha a sua importância alfandegária. Navios mercantes d bandeiras internacionais fundeavam na discreta enseada fluvial, enquanto o Oficial mestre vinha á terra firme em busca do “visto” nos documentos de cargas em trânsito.
Como na Amazônia mais chove do que não chove, a praça defronte da Aduana, que, na verdade, era um imenso barreiro quadrangular, ficava coberta por espessa massa argilosa, a tabatinga escorregadia. Caminhar nessa praça em dias chuvosos era complicado. Pode-se dizer que era espetáculo costumeiro a ocorrência de quedas espetaculares de pessoas desavisadas. O risco desses tombos não era privilégio de humanos. Canídeos e galináceos também eram vítimas em potencial.
Então, chuva caindo e oficial mestre cruzando a dita praça em tarefa de obter o visto fiscal, gerava expectativas. As pessoas ficavam a postos, de butuca, como lá se dizia, em espera marota, e comentavam:
“– Hoje vai ter gringo voador na praça!”
Não dava outra. O oficial mercante, em trajes brancos, dando os primeiros passos da travessia, escorregava cerca de dois metros e voava, descrevendo parábolas no ar como estiloso circense. Lançava para o alto a pasta de documentos, o guarda-chuva e o quepe, acompanhados de uma saraivada de impropérios em idioma estranho. As gargalhadas da plateia oculta ecoavam na névoa chuvosa da tarde benjaminense, parecendo o coaxar de CURURUS em toada romântica de batráquios no intencionismo de acasalamento. Cumprida a formalidade fiscal, via-se um espantalho de barro, caminhando de regresso pelas beiradas do local do infortúnio, com jeito de solitário guerrilheiro cambojano.
Naquele tempo, a cidade não tinha uma emissora de rádio. Mas ninguém podia se queixar da fala de comunicação ou de isolamento do noticiário nacional. Havia um serviço de divulgação que animava a pequena população. Além das notícias captadas através do rádio e amplificadas por alto-falantes estrategicamente posicionados, de modo a alcançar a audiência do núcleo central do lugarejo, a parafernália radiofônica prestava verdadeiro serviço de utilidade pública.
As suas atividades eram diversas. Fazia reclames comerciais que hoje a modernidade chama de propaganda. Divulgava músicas populares que eram sucesso na época. Dava recados pessoais e notas de interesse da gente do lugar, às vezes pitorescas e mesmo hilárias. Era comum a divulgação de assuntos, com ênfase a particularidades intimistas.
A propaganda buscava estimular a curiosidade dos consumidores, informando: “A LOJA DAS NOVIDADES AVISA QUE RECEBEU OS MAIS RECENTES LANÇAMENTOS DA MODA FEMININA E MASCULINA, PARA MULHERES E HOMENS, PARA JOVENS E TAMBÉM CRIANÇA INFANTIL.”
Os avisos, com roupagem de recados, tinham a propriedade objetiva e direta, como este: “O CLUBE DO JABACULÊ COMUNICA QUE A REUNIÃO DE HOJE FOI TRANSFERIDA PARA O DIA SEGUINTE, AMANHÃ, E PEDE O COMPARECIMENTO COM A PRESENÇA DE TODOS.”
O recado pessoal era prolixo e rico em pormenores, desse tipo: “SEU LIBÓRIO PEDE PARA DONA COTINHA MANDAR A BENGALA QUE ELE ESQUECEU PERTO DA CADEIRA ESPREGUIÇADEIRA. ELE ESTÁ ESPERANDO NA FARMÁCIA DO SEU PRIMO. MAS MANDA LOGO, QUE O HOMEM PRECISA ANDAR.”
Já as notas de falecimento eram dadas com voz de coveiro e em clima de3 sétimo dia, desse modo tarjado de preto: “FALECEU NESTA MADRUGADA JUVÊNCIO COPERTINO ROSA, MORDIDO DE COBRA. SEU ENTERRO SERÁ LOGO MAIS À TARDE. A COBRE, UMA JARACUÇU-PIMENTA, FOI ENCONTRADA MORTA BEM PERTO DE SUA CASA”.
De romanesco, havia o “CORREIO-ELEGANTE”, de apreciado uso dos pares apaixonados, sempre de plantão, que faziam seus oferecimentos românticos, nas asas de sonoros cupidos. Ocasionalmente, ouviam-se mensagens acompanhadas por melodias e versos esdrúxulos, do tipo: “TONICO-TICO OFERECE PARA O SEU BEM-QUERER ROSINHA DO AMPARO”, e os ouvintes levavam pelas conchas das orelhas os versos de sucesso popular daquele tempo, “OI, TREPA NO COQUEIRO E TIRA COCO DO COQUEIRO, TIRA COCO, ZICO-ZICO... INHACO-INHACO, CO COQUEIRO ORIRÁ.”
As estórias e contos amazônicos são assim. Falam da simplicidade da alma de uma gente acostumada com o lado natural das coisas. Pessoas que vivem de mãos dadas com a natureza. Talvez, por isso mesmo, tenham criado um humor próprio para encher de alegria a caminhada rumo a um futuro promissor, nem sempre respeitado e, no mais das vezes, usurpado e vilipendiado, por naturais e forasteiros.
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