Segunda-feira, 6 de junho de 2022 - 10h54
A entrevista da Academia
Rondoniense de Letras, Ciências e Artes -ARL, nesta semana, destaca um de seus
membros mais atuantes e laureados, Carlos Alberto Paraguassu Chaves,
Ex-Superintendente do IBAMA, Professor
Titular do Instituto Universitário do Rio de Janeiro - IURJ. Diretor Acadêmico
da Faculdade Instituto Rio de Janeiro - FIURJ. Professor Visitante Sênior da
UFMA. Professor Titular Aposentado da Universidade Federal de Rondônia - UNIR.
Coordenador e Supervisor de PPG Pós-Doutorado. Doutor em Ciências da Saúde
(Geografia Médica) - Universidad de La Habana - CU, diplomado pelo Instituto
Superior de Ciências Médicas da U. Habana - CU, com revalidação nacional pela
Universidade de Brasília - UnB. Doutor em Ciência (U. Habana). Pós-Doutor em
Ciências da Saúde – Universidade de Brasília – UnB e Universita' Degli Studi Di
L'Aquila - IT.
1. ARL – A sua família é tradicional e bastante influente
na cidade, inclusive você já publicou um livro homenageando seu pai. De onde
vieram os paraguassus, com esses?
CP - Essa
pergunta me faz recordar com emoção e reviver uma fração importante de minha
história. A família Paraguassú (materna), originária da Bahia, e a família
Chaves (paterna), originária do Maranhão, está na Amazônia há mais de um
século. A família Paraguassú Chaves e/ou Chaves Paraguassú é uma família
tradicional, de gente simples, trabalhadora e temente à Deus. Família que
contribuiu na construção da história de Rondônia. A caminhada de nossos pais
(desbravadores), que tiravam o sustento da família enfrentando as tribulações
de seus próprios medos, a escuridão desértica da floresta amazônica, as doenças
que maltratavam e mataram tantos familiares e pessoas próximas, a incerteza do
amanhã e todas as intempéries do imaginário estão estampadas nos retratos, objetos
e em nossas memórias. Os nossos super heróis de carne e osso, fortes e frágeis,
dóceis e guerreiros, amantes e temerosos, ainda refletem em todos nós, como
exemplos de superação, fé, coragem e nos ampara na crença em Deus.
No livro Passagem
Zoroástrica faço uma homenagem ao meu saudoso pai Waldemar Rodrigues Chaves,
meu Zaratustra, que fez perguntas a todos os Deuses e a Deus, descobriu
revelações nas páginas escritas da vida e terminou sua passagem entre nós,
fazendo mais e ainda mais perguntas, acreditando na imortalidade da alma, que
deixaria o corpo após a morte e então seria julgado por seus atos em vida. E
que me disse um dia “A sua consciência é seu mestre e seu guia. Somente Deus
sabe de suas intenções, de sua bondade e de seus defeitos. O que importa é o
que carrega no coração, o que você pensa e o que você faz de diferente e com
amor”. Não dê importância o que os outros pensam ou falam, somente você pode
fazer escolha e decidir que caminho deve seguir. E assim o fiz. Segui a minha
luz, a minha consciência, o meu caminho.
Paraguassu
(com dois ss) é uma deformação entendida como o ato de deformar (e não
deformidade) que o nome Paraguaçu sofreu nos processos históricos da sociedade
brasileira. A essência do Paraguassu é o Paraguaçu. Como em metafísica, a
essência de uma coisa é constituída pelas propriedades imutáveis da mesma, que
caracterizam sua natureza e o oposto da essência é o acidente da coisa, ou
seja, aquela propriedade mutável da coisa. Fato é que assertivamente somos
descendentes de Catarina Álvares Paraguaçu ou Catarina do Brasil e Diogo
Álvares Corrêa (Caramuru). Ele da nobreza de Viana do Castelo (Portugal); ela,
filha de um cacique tupinambá. Caramuru e Paraguaçu formaram a primeira família
cristã do Brasil e a primeira família brasileira documentada. Modestamente,
essa condição é motivo de orgulho para os Paraguassus.
2.
ARL – A gente sabe da sua vasta cultura científica, inclusive de livros
publicados em mais de um idioma. Quantos livros e em quais idiomas você já
publicou?
CP - Publiquei 27 livros
(com registro de ISBN - International
Standard Book Number). Destes, quatro foram publicados na língua
inglesa. Os livros em inglês foram resultados de pedidos de editores de
revistas internacionais e também pela necessidade de compilação dos meus
trabalhos científicos publicados em periódicos internacionais. Escrevo livros
para divulgar o que se faz de ciência na Amazônia. Não são produtos com fins
comerciais e a compilação de diversos trabalhos na mesma linha de pesquisa em
uma única obra (na forma de livro) facilita o acesso e a leitura. Graças a Deus
alguns de meus livros estão espalhados mundo afora. Tenho exemplares de meus
livros em alguns países como Portugal, Espanha, França, Inglaterra, Alemanha e
Itália; nos países africanos de língua portuguesa, e agora na América do Norte.
Os meus livros (literatura científica) mais conhecidos fora do Brasil são
Geografia Médica ou da Saúde: Espaço e Doença na Amazônia Ocidental (o segundo
livro da história do Brasil sobre a temática); Sanologia (primeiro livro no
Brasil a abordar a temática); Saúde e Comportamento Humano (onde foram
aplicadas técnicas e modelos matemáticos para mensurar questões subjetivas de
transtornos mentais e de comportamento); Ciências da Saúde na Amazônia (onde se
fez adaptação do Teste de Denver II para avaliar áreas do desenvolvimento
neuropsicomotor em crianças nos contextos regionais da Amazônia e América
Latina). Outros livros que tiveram boa repercussão da crítica foram: Amazonian
Studies of Medical and Health Geografic e, Studies of Common Mental Disorders
in the Brazilian Amazon. Outros livros importantes e que tiveram suas
acreditações e aceitações local, regional e nacional foram: Saúde e
Comportamento; Epidemiologia do Câncer em Rondônia; Perfil Epidemiológico do
Câncer em Rondônia: Amazônia brasileira.
Nos últimos três anos
publiquei juntamente com os meus colaboradores cerca de 60 artigos científicos
em revistas internacionais com Qualis A (Capes), resultados de pesquisas
científicas do grupo de pesquisa que coordeno e que pode ser acessado pela
Plataforma Lattes – CNPq.
3. ARL – Por que a Geografia da Saúde? Já que essa é uma
área carente de recursos municipais, estaduais e federais?
CP - A Geografia da Saúde é
um campo da Geografia Médica, que é uma área de conhecimento das ciências
médicas e das ciências geográficas, e existe antes mesmo da medicina (a
primeira obra considerada de Geografia Médica “Dos Ares, Dos Mares e Dos
Lugares” foi escrita por Hipócrates, o pai da medicina). A Geografia Médica
frequentemente se divide em dois campos de investigação: Nosogeografia ou
Geografia Médica Tradicional e a Geografia da Atenção Médica ou da Saúde. A
primeira se encarrega da identificação e análise de padrões de distribuição
espacial de doenças. A segunda se ocupa da distribuição e planejamento dos
componentes de infraestrutura e dos recursos humanos e tecnológicos do sistema
de atenção médica ou da saúde. Na atualidade, a geografia médica ou da saúde se
preocupa com a provisão de cuidados a saúde e cuidados médicos, analisa os
padrões de produção e distribuição espacial e temporal de doenças, utiliza-se
da cartografia da doença, usando métodos geoestatísticos e o
georreferenciamento de dados e imagens, utiliza-se da análise sistêmica para
entender os padrões de multicausalidades das doenças, aplica conceitos de
precisão de localização geográfica e suas inter-relações com fatores conexos. É
um desafio imenso, considerando a falta de recursos, investimentos,
planejamento, ausência de políticas públicas e incentivos institucionais e
talvez o que seja mais grave é a falta de conhecimento sobre esta área de
conhecimento aplicada à resolutividade de questões relacionadas ao processo de
produção social de doença, a partir do conjunto indissociável de condicionantes
que forma os blocos determinantes socioambientais, estilo de vida ou
conduta-comportamento, o pool genético ou biologia humana e o sistema de
atenção médica e da saúde, principalmente em países em desenvolvimento e em
região como a Amazônia.
Creio que ocupei por um
determinado tempo a missão de difundir a geografia médica no Brasil e em
especial na Amazônia. Identificar, mapear e analisar padrões de produção e
distribuição espacial de doença é uma etapa importante para a compreensão de um
estudo da Geografia Médica e estudo Geoepidemiológico, porém a análise desse
processo é um exercício complexo e interdisciplinar.
4.
ARL – Como foi a sua experiência em Cuba?
CP - Foi
uma experiência fantástica em todos os aspectos. Infelizmente hoje se
estigmatiza o povo cubano. Temos que separar o regime de governo de seu povo.
Convivi com pessoas talentosas, inteligentes, estudiosas, competentes e
dedicadas ao seu labor. Estive por um longo período convivendo em uma das mais
importantes e antigas universidades das Américas. A Universidade de Havana ou
Universidad de La Habana. E de lá sai como o primeiro brasileiro a se doutorar
em Geografia Médica. Divulguei a Geografia Médica no Brasil, em outros países
da América Latina, no continente africano (países falantes da língua
portuguesa) e na Europa (principalmente em Portugal). O povo cubano me acolheu
quando precisei e devo gratidão aos amigos cubanos que lá deixei. Tive a
oportunidade de conhecer a realidade dos países socialistas/comunistas à época.
É difícil descrever o cotidiano nesses países, sob pena de ser questionados por
colegas adeptos de tais regimes de governo e sistemas econômicos. Sempre
respeitei o contraditório, porém sinceramente não sou adepto, muito menos
admirador desses tipos de governo.....
5. ARL – Você é professor aposentado da Universidade
Federal de Rondônia. Como analisa esta sua passada pela Unir e o que você pode
destacar de avanço dessa importante instituição, à frente do ensino
universitário rondoniense?
CP - Estou
aposentado como professor titular de uma IES federal. Cheguei ao topo da
carreira com muito esforço, dedicação e resiliência. Foram quase quatro décadas
dedicadas ao ensino superior, à formação profissional, qualificação e
aperfeiçoamento. Trabalhei com a graduação, especialização, mestrado e
doutorado. Fiz pesquisas relevantes, compartilhei os meus conhecimentos em
todas as esferas da sociedade e em todos os lugares, sem distinção. Eu fiz a escolha.
Decidi que exerceria a docência independente da profissão que escolhesse
seguir. Vocação herdada de minha mãe.
Assim, escrevi certa vez ao
amigo de infância (e do grupo escolar Samaritana) jornalista Arimar Souza de
Sá. “Vivi em um tempo em tudo parecia muito romântico quando se falava de amor,
paixão e vocação para justificar as atividades laborativas na docência. Quando os atributos para o
exercício do ofício se confundiam com o imagético, como encantamento pautado na
consciência da própria personalidade, que implicava afeto e emoção naquilo que
se fazia, qualificável como uma missão para o bem-estar da vida e da sociedade”.
Nos tempos atuais,
infelizmente, de uma profissão de prestígio e de valor inestimável se transpõe
ao calabouço do contempto, sentimento de repulsa. De uma profissão valorizada
socialmente, de prestígio e reconhecimento pelo seu potencial humanizador e seu
compromisso com a formação para a cidadania e para a vida, se reflete no
espelho como se fosse um olhar e um tratamento de desafeição. Com tudo ou
diante de um cenário que passa nossa própria história, vamos continuar
acreditando que as nossas escolhas e decisões foram às melhores possíveis. O
verdadeiro professor sempre será professor independente de seu tempo e de seu
Templo. Lembro com as lágrimas escorrendo em meus olhos, o quanto a minha
eterna e amada mãe, professora Isa Paraguassú, representa no construto de
nossos conhecimentos, na formação de nosso caráter, de amar nossos irmãos de
maneira incondicional, na demonstração da amizade sem distinção, no respeito ao
próximo e a nossa pátria, nos valores e nas crenças, na humildade e no papel que
cada um deve exercer para que nossas vidas se tornem melhores e vivamos numa
sociedade mais justa e perfeita.
Quanto a UNIR entendo
que tem o seu papel muito bem definido na história da educação superior de
Rondônia e a sua contribuição inconteste no desenvolvimento regional.
6.
ARL – No momento, quais projetos, da área da pesquisa científica, estão
merecendo a sua atenção?
CP - Na
atualidade, os projetos que tenho investido fazem parte de um acordo de
cooperação com a instituição de ensino superior que dirijo no Rio de Janeiro.
Todos os projetos que executo, os recursos são oriundos do Instituto AICSA
(associação sem fins lucrativos, instituição fundada por mim e que presido) e
dos próprios membros dos grupos de pesquisa que participo. O professor Carlos
Tomaz (da Universidade CEUMA), ao prefaciar um dos meus livros, assim escreveu:
“Fazer ciência na Amazônia não é para amadores. É uma tarefa hercúlea. É isso
mesmo, um adjetivo que denota heroísmo, grandeza. Sem recursos e falta de uma
política de estímulo, por meio de agentes locais, estaduais ou federais,
aqueles que se propuseram a fazer ciência na Amazônia deveriam ser considerados
heróis, merecedores de nosso respeito e admiração”. A Amazônia sempre foi
descrita por cientistas (nacionais e estrangeiros) como um “desafio”, uma
região “extraordinária” e “rica” que detém “a maior biodiversidade do planeta”
e usam outros termos e expressões hiperbólicos. É evidente, no entanto, mesmo
em trajetórias cheias de altos e baixos, que os cientistas brasileiros ainda
não foram capazes de enfrentar a enorme tarefa de pesquisar adequadamente a
região. Vários programas governamentais foram propostos nos últimos 60 anos
para tentar mitigar essa situação. É consenso que todos esses instrumentos
tenham, de alguma forma, focado nos esforços para construir uma base
institucional mais forte, com preocupações em identificar prioridades em
Ciência e Tecnologia, acesso a financiamento e qualificação de pessoal. Todos
eles, no entanto, caracterizam-se por uma fase de expansão seguida de
estagnação e declínio devido em grande parte à desarticulação das políticas
públicas. Isso resultou em “extrema desigualdade” na “distribuição de recursos
humanos qualificados” e em cursos de pós-graduação com qualidade entre as
diferentes regiões do país, com a Amazônia menos abastada. Os índices oficiais
revelam a precariedade do empreendimento científico amazônico. Finaliza o
professor Tomaz “A Amazônia deve ser vista como uma fronteira geográfica,
humana e de recursos e a mesma fronteira da ciência e do conhecimento
científico”. Todos os projetos que coordeno ou colaboro são de pesquisas
aplicadas e não dependem de recursos públicos. Saúde e pesquisa em saúde são
necessidades urgentes do Brasil e em particular na região amazônica. As
necessidades regionais de saúde na Amazônia devem ser consideradas na
elaboração da Agenda Nacional de Saúde, com vistas a produção de bens materiais
e processuais voltados para o desenvolvimento das políticas sociais em todos os
níveis governamentais. Portanto, a pesquisa é fundamental para a construção
e/ou (re) direcionamento de políticas públicas em saúde. A avaliação da
situação da saúde numa determinada região permite caracterizar, medir e
explicar os perfis de necessidades e problemas de saúde-doença daquela população;
conhecer possíveis respostas sociais organizadas frente aos mesmos; identificar
necessidades, prioridades e políticas em saúde, bem como avaliar o impacto das
intervenções; formular estratégias de promoção, prevenção, controle e construir
cenários prospectivos de saúde.
Neste ano de 2022 os
principais projetos de pesquisa em desenvolvimento são: Elaboração de Protocolo
padrão de acompanhamento de mulheres jovens que fazem uso do DIU de cobre;
Elaboração de um novo Instrumento de Treinamento Muscular Inspiratório – TMI
para pacientes que contraíram covid-19; Modelagem do Teste de Denver II para
crianças de 0 a 9 anos nascidas prematuras (de qualquer causa); Aplicação de
métodos e fórmulas de análise fatorial em estudos na área da saúde; Validação do
SRQ-20 para estudos em diversas realidades contextuais da Amazônia brasileira.
Evidencio oportunamente que todas as propostas de projetos desenvolvidas no
âmbito do Programa de estágio pós-doutoral que coordeno e supervisiono têm como
finalidade apresentar gratuitamente em seu relatório final, propostas,
programas, modelos teórico-metodológicos, protocolos, técnicas, métodos,
instrumentos e ferramentas, patentes, tecnologias, equipamentos e software, e,
outros produtos para a melhoria do sistema único de saúde do Brasil.
7.
ARL – Você foi um dos fundadores e atualmente
é presidente da Academia Maçônica de Letras. Diante da importância da
Maçonaria no meio social, no que a AML é diferente das demais academias de
letras?
CP - Talvez a maior
diferença seja a sua composição. De acordo com seu Estatuto Social, a Academia
Maçônica de Letras de Rondônia é constituída por Mestres Maçons na plenitude de
seus direitos, pertencentes aos Quadros de Lojas Jurisdicionadas ao Grande
Oriente do Estado de Rondônia e da Grande Loja Maçônica do Estado de Rondônia,
com a finalidade de promover e estimular o cultivo e divulgação das letras, das
artes, das ciências e da cultura, da educação e o estudo da filosofia maçônica,
bem como a conservação e o desenvolvimento da cultura em geral. Outro requisito
a destacar é que além da capacidade e qualidade literária, leva-se em
consideração as condições morais, intelectuais e sociais do candidato ao
ingresso na AML/RO. Complementarmente, de acordo com o Regimento Interno,
Academia é uma sociedade cultural, de caráter predominantemente educativo e
literário maçônica. Tem como objetivo e finalidade o aperfeiçoamento moral,
intelectual e social do homem, exigindo de seus membros o cumprimento do dever,
o incentivo à instrução e a cultura, e condena a exploração do homem pelo
homem, enaltecendo o mérito da inteligência e da virtude, reconhecendo e
valorizando a prestação de serviço à Pátria, a comunidade, ao semelhante e à
instituição, em particular. Abomina os preconceitos de raça e proíbe a discussão
político-partidária ou religiosa em suas reuniões. Considera os homens livres e
iguais perante a lei, afirmando que a compreensão e a tolerância constituem a
meta das relações humanas, a fim de que entre seus semelhantes sejam
respeitadas as convicções e dignidades de cada um. Reconhece o trabalho como um
dever social considerando-o dignificante em qualquer de suas formas: manual,
técnica ou intelectual.
Os membros da AML/RO devem proclamar princípios, tais como a
prevalência do espírito sobre a matéria; pugnar pelo aperfeiçoamento moral,
intelectual e social da humanidade, por meio do cumprimento inflexível do
dever, da prática desinteressada da beneficência e da investigação constante da
verdade; proclamar que os homens são livres e iguais em direitos e que a
tolerância constitui o princípio cardeal nas relações humanas, para que sejam
respeitadas as convicções e a dignidade de cada um; defender a plena liberdade
de expressão do pensamento, como direito fundamental do ser humano, observada
correlata responsabilidade; dever essencial de amor à família, fidelidade e
devotamento à Pátria e obediência à lei; ter boa reputação moral, cívica,
social e familiar, pugnando pelo aperfeiçoamento dos costumes; ter tolerância
para com toda forma de manifestação de consciência, de religião, de política ou
de filosofia, cujos objetivos sejam os de conquistar a verdade, moral, paz,
bem-estar social e combater fanatismo, paixões, obscurantismo e vícios. São
alguns requisitos importantes que certamente vetariam o ingresso de membros de
outras egrégias academias na AMLRO.
8. ARL – Você tem debatido a incidência de vários tipos de
câncer em Rondônia, e alguns é devido a acidez da nossa água potável. Como
fazer para melhorar isso? Qual a acidez recomendada?
CP - Talvez a maior
evidência do câncer como problema de saúde pública no estado de Rondônia é a
própria instalação do Hospital do Câncer da Amazônia ou Hospital do Amor, o
maior e a mais importante Unidade de Saúde especializada em neoplasias da
Região Amazônica. Juntamente com importantes colegas pesquisadores publicamos
os primeiros e únicos livros sobre câncer em Rondônia, nos quais destacamos 5
pontos fundamentais: 1. A descrição da distribuição e magnitude do câncer na
população de Rondônia (quem adoeceu, tipo de câncer, em que situação a doença
se deu, etc.) tanto em nível municipal como em toda extensão do território do
estado de Rondônia; 2. A sistematização de dados essenciais para o
planejamento, execução e avaliações de ações de promoção, prevenção, controle e
tratamento do câncer em Rondônia, bem como para o estabelecimento de
prioridades; 3. A aproximação da identificação dos fatores etiológicos na
gênese dos cânceres em Rondônia; 4. A disponibilização de um instrumento e
produto pedagógico que possa ser utilizado como material instrucional cuja
finalidade didática alcance todas as pessoas, independente do grau de instrução
escolar ou cultural; 5. A disposição de dados e informações de apoio ao
desenvolvimento de estudos e pesquisas aplicadas sobre a produção e
distribuição dos cânceres em Rondônia.
Nestas pesquisas
epidemiológicas levantamos hipóteses que alguns tipos de câncer apresentam
possíveis nexos com a acidez da água e com a alta concentração de nitrato
encontrado em água consumida pela população. A identificação da acidez e
concentração de nitrato nas águas subterrâneas urbanas das cidades da Amazônia
estão muito bem documentadas em resultados de nossos estudos e publicados em
periódicos internacionais, revistas e livros nacionais. Em seguida, aplicamos
um instrumento com variáveis de aspectos sociodemográficos, estilo de vida,
hábitos alimentares etc., em um grupo voluntário de pacientes em tratamento de
câncer no sistema digestivo. Infelizmente 100% desses pacientes foram a óbitos.
A etapa seguinte foram os ensaios com modelo experimental de carcinogênese
gástrica induzido em laboratórios, primeiramente com camundongos e em seguida
com ratos. Utilizamos água com pH acima do recomendado e água com concentração
de nitrato consumida por parte da população, com acompanhamento da medição do
pH da água, pH urinário, pH da saliva, pH do sangue, carga ácida etc.
Obedecendo a todos os critérios éticos de pesquisa com animais e métodos
consagrados pela acadêmica científica internacional, as nossas hipóteses foram
confirmadas, ou seja, os grupos de animais submetidos aos testes desenvolveram
algum tipo de câncer. Embora o tema ainda possa ter divergências e uma ampla
discussão, fico com que aponta o Dr. Otto Heinrich Warburg (duas vezes ganhador
do Prêmio Nobel da Medicina) “a maior parte das pessoas acometidas de câncer
apresenta um pH no tecido de 4,5”. O câncer se desenvolve em ambiente de menor
quantidade de oxigênio e esse ambiente é criado quando o pH é baixo. Um
ambiente ácido é um ambiente sem oxigênio. Hábitos alimentares influenciam tudo
que comemos ou ingerimos, criando uma condição ácida ou alcalina em nosso
corpo. Reeducamos nossa alimentação, mas muitas vezes, esquecemo-nos da água
que bebemos, sem darmos a ela a devida importância no contexto geral da nossa
alimentação.
A
legislação brasileira que dispõe sobre o padrão de potabilidade das águas,
recomenda que o pH (potencial hidrogeniônico) da água própria para o consumo
seja mantido na faixa de 6,0 a 9,5. A água precisa ter um pH acima de 6,5 para
ser potável. Os nossos estudos apontam além de um problema de saúde pública uma
questão de segurança nacional (basta ler os trabalhos Nitrate Concentration (NO3-) in Groundwater of the Urban
Area of Nova Mamoré - Rondônia in the Brazil / Bolivia Border; Mapping of
Nitrate Contamination (NO3-) in an Urban Area on the Brazil/Bolivia Border;
Groundwater quality:Study of the Nitrate(NO3-) concentration in the Urban Area
of the Brazil/Bolivia Border, de autoria de Paraguassú-Chaves e colaboradores).
Outros trabalhos
importantes foram publicados retratando essa triste realidade das águas
consumidas pela população mais carente da região amazônica, inclusive os
estudos realizados com as pseudo-águas minerais comercializadas.
Para minimizar a questão da água consumida, precisamos exigir o
estabelecimento de políticas públicas de qualidade da água (Em Rondônia, por
exemplo, compramos dois produtos: água para consumo doméstico e água potável
para o consumo humano, isso é totalmente incoerente). Precisamos mudar essa
condição de passividade e comodismo. Por outro lado, precisamos mudar
radicalmente os nossos hábitos alimentares, estilo de vida,
conduta-comportamento etc.
9. ARL – Ao longo da sua vida você recebeu e vem recebendo
inúmeras honrarias, inclusive a Medalha do Mérito Legislativo, da Assembleia
Legislativa de Rondônia, uma Moção de Aplauso da Câmara Municipal e a Cruz do
Mérito Filosófico Cultural, no grau Comendador, concedida pela Câmara
Brasileira de Cultura, Academia de Ciências e Artes, além da Comenda Mérito
Ambiental Brasileiro, concedida pelo IBAMA. Estas são as mais importantes ou
ainda falta algum reconhecimento público, que você acha que merece e não
recebeu?
CP - Tenho gratidão por
tudo que acontece em minha vida, incluindo as honrarias a mim concedidas,
independente da origem e da instituição. Fiquei feliz quando fui honrado com a
Comenda Oficial da Ordem do Trabalho Getúlio Vargas, concedida pela Presidência
da República Federativa do Brasil e a que mais me deixou emocionado foi o
Título de Cidadão Honorário do Município de Porto Velho – Expedido pela Câmara
Municipal de Porto Velho. Porém, o reconhecimento que marcou a minha vida foi o
Prêmio Racco Europa de Literatura Científica. Antes de receber a premiação
(parecia um diploma) assisti um vídeo documentário sobre as precárias condições
de seres humanos (no país africano...fome, doença, precariedade inimagináveis),
cenas fortes. Em meio a centelha da criação divina, disse que trocaria aquela
premiação por qualquer forma de ajuda àquelas pessoas (e assim o fiz, troquei o
diploma e uma certa quantia em euro) para me tornar um colaborador voluntário
das causas humanitárias. Uma forte emoção invadiu o meu eu interior, chorei
compulsivamente, questionei a minha crença e a minha descrença, os tantos juramentos
de promessas, meu coração pulsava intensamente, pedi para falar com Deus, falar
com coração das coisas compreensíveis e incompreensíveis que vivi em cada
momento de minha vida, e em silêncio pedi seu perdão em uma oração incompleta,
e ouvi de Deus, sem qualquer pronúncia de palavra, gesto ou imagem que ele
sempre esteve ao meu lado. Creio que estava em transe entre a luz simbólica e a
luz metafórica, uma viagem num cenário único e indescritível, o que me levou
apenas com uma folha de papel em branco e um lápis a reescrever as minhas
memórias e (re)paginar a minha vida.
Confesso que sempre fui
totalmente desnudo de vaidade, ambição por premiação ou honraria. Para um filho
de uma professora do ensino primário e de um tratorista, nascido nas barrancas
do rio Mamoré, no Núcleo Agrícola do IATA, hoje Distrito de Guajará-Mirim, que
conheceu pela primeira vez uma televisão aos 14 anos de idade, que só estudou
em escolas públicas e em universidades públicas, a maior honraria é ser feliz.
E esse diploma eu já o tenho, com os seguintes dizeres “ÉS UM HOMEM FELIZ” e no
verso da honraria os seguintes dizeres: Ser feliz é ser um homem natural na
nobreza de ser, É ser simples na sensatez, É ser honesto tanto quanto a
humildade e honradez, É ser modesto e
nem por isso deixar ser magnífico para a família, amigos e pessoas de sua
convivência, É ser um pai amoroso e dedicado, É ser um incansável trabalhador e
nem por isso deixar de ser generoso e disciplinado, É viver sem rótulo, É ser
autêntico, É ser educado, É ser equilibrado, racional e tolerante, É ser crente
de suas convicções e fiel aos seus princípios, Jamais deixar transparecer
amarras ideológicas, É ser justo, leal e livre de pensamentos. Acho que tenho a
maior comenda que uma pessoa pode querer na vida, uma família com Amor, Paz,
Fé, Esperança, Respeito, Harmonia, Solidariedade e Bondade no Coração. Como
assim falou a minha esposa Lenita: “Um homem que sofreu inexoravelmente as
dores insuportáveis. Foi ao limite da inconsciência, mas jamais perdeu a
esperança, a alegria de viver e exercitar os gestos altruístas”.
10.
ARL - Dos membros da Academia Rondoniense de Letras, Ciências e Artes - ARL
você é o mais laureado, tantos são os seus escritos, as suas teses, os
seminários e congressos que já participou aqui e alhures, além de 27 livros
publicados. Se você ficasse em frente a um espelho, diria: − missão cumprida?
CP - Quando me ponho diante
de um espelho converso comigo silenciosamente, tento me reconhecer. Peço ao meu
passado que me conceda mais um instante no tempo porque não há tempo para
menos, somente para mais. E quero aproveitar todo o tempo que me resta para dar
o melhor de mim, fazer o melhor que as minhas forças suportarem. Temos que
seguir o nosso destino rumo ao grande oceano (ou a eternidade). Se o tempo não
nos permite recuar, vamos avançar, cantando, sorrindo, amando, chorando, feliz,
vivendo intensamente até nos misturarmos às águas do imenso universo
desconhecido, ou simplesmente refletirmos em luz primária. Já não há mais
partida, apenas o caminho, sendo assim devemos fazer nossas escolhas e decisões
com coragem e fé. Seja o que for, seja o que vier, viver ainda é a maior dádiva
de Deus.
Estou muito honrado
pela entrevista e agradeço à ARL pela oportunidade. Gratidão pelo que vivi,
pelo que fiz e por tudo que tentei fazer.
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