Sábado, 23 de junho de 2018 - 06h35
Teria ocorrido na mais absoluta tranquilidade a reunião entre representantes da Ouvidoria Agrária Nacional, Incra e programa Terra Legal com as lideranças do movimento Liga dos Camponeses Pobres (LCP), no último dia 20, em Porto Velho. É o que foi divulgado na imprensa com matéria distribuída pela assessoria de comunicação do Incra-RO.
Só, que não.
Quem revela o clima de tensão, com abusos e intimidações contra camponeses no dia da reunião é a advogada popular Lenir Correia Coelho.
Segundo o relatório da advogada, era a pauta “reivindicatória de 18 áreas de acampamentos, inclusive, diversas delas com reintegrações em aberto motivadas pela inércia do INCRA em não terminar os processos administrativos de aquisição/indenização/desapropriação.”
Leia abaixo, na íntegra, o testemunho da advogada que considerou a reunião improdutiva em “função da pressão psicológica promovida pelo INCRA e mais ainda, pela presença ostensiva da polícia na sala de reunião: filmando, fotografando, identificando as pessoas e apontando ostensivamente o armamento de fogo.”
RELATÓRIO DENÚNCIA
“No dia 20 de junho de 2018, a partir das 6 horas da manhã, foi instalado um Estado de Exceção no Estado de Rondônia com o apoio irrestrito do INCRA e Ouvidoria Agrária Nacional, com o escopo de criminalizar a luta pela terra e os camponeses. Com reunião agendada com o INCRA de Rondônia via Ouvidoria Agrária Nacional (ofício enviado e confirmado por email e por telefone), para os dias 20 e 21 de junho de 2018, no INCRA de Porto Velho/RO, com uma pauta reivindicatória de 18 áreas de acampamentos, inclusive, diversas delas com reintegrações em aberto motivadas pela inércia do INCRA em não terminar os processos administrativos de aquisição/indenização/desapropriação. Comissões de camponeses, representando cada acampamento da pauta, compareceram no INCRA para dialogarem sobre a pauta e buscar soluções para as demandas, no que foram criminalmente recebido:
1) Barreiras policiais nas ruas próximas do INCRA impedindo os ônibus de chegarem, o que fizeram com que muitos camponeses tivessem que andar até a entrada do INCRA;
2) INCRA com portão cadeado, o que fez com que os camponeses ficassem expostos ao sol sem acesso à água e banheiro, tendo entre eles, crianças e mulheres grávidas;
3) Visivelmente, dentro do INCRA estava um aparato de policiais militares e federais fortemente armados;
4) Somente as 9 horas, que o Ouvidor Agrário Nacional Substituto Dr. Líbio e Ouvidor Agrário Regional Sr. Erasmo compareceram no portão e foram categóricos em afirmar que só entraria 30 pessoas para a reunião e nisso estava irredutível;
5) Em todo o momento os policiais ficavam apontando as armas para os camponeses que estavam no sol e do lado de fora do INCRA – na rua;
6) Os camponeses fizeram uma assembléia e decidiram participar da reunião, no que concordaram em entrar – duas pessoas por área;
7) Somente as 10:30 horas começou a entrada dos camponeses (os 30 exigidos pelo INCRA) e tiveram que passar por uma situação vexatória e humilhante, tendo alguns desistidos de entrar; pois, foi montada uma mesa do lado de fora do INCRA para assinar lista de presença, com forte aparato policial protegendo essa mesa, os camponeses assinavam lista de presença, a policia conferia seus documentos, anotando todos os dados, depois, esses camponeses eram colocados num verdadeiro “corredor polonês” – mais ou menos cinco policiais de cada lado;
8) Cada camponês e camponesa era fotografado, fizeram revista pessoal em cada um, do lado de fora, com a policia filmando, bem no estilo: “perna aberta, mão na cabeça”, as mulheres eram apalpadas na frente de todos – – inclusive, mesmo me apresentando como advogada e apresentando a carteira da OAB passei por essa revista pessoal e fui fotografada, quando questionei o motivo do procedimento, eles responderam que era mera procedimento e não justificaram o motivo das fotos, vídeos e revistas, sequer apresentaram o responsável pelo comando da operação. Nem em atendimento em presídio tinha passado por tal situação, nem na barreira do Acampamento Enilson Ribeiro fui exposta a revista pessoal; depois disso, fizeram revista das bolsas;
9) Para entrar na reunião tinha que passar por uma escolta policial, após passar pelo corredor de policiais. Essa escolta era até a sala de reunião, com os servidores terceirizados do INCRA acompanhando, fotografando e filmando as pessoas – parecíamos que estávamos indo para a forca;
10) A reunião foi toda filmada e aconteceu com a presença maciça de policiais fortemente armados durante toda a reunião, inclusive, quando foi foi denunciado o Sgto. Eduardo e sua esposa Dra. Rúbia por estarem fazendo georeferenciamento da Fazenda Bom Futuro a polícia militar se somou a polícia federal e ficou monitorando e fotografando as pessoas que estavam fazendo as denuncias. A Comissão Pastoral da Terra – CPT, na pessoa da Agente Petronila, que acompanhou os algozes da entrada, fez contato com várias entidades de Defesa de Direito Humanos, inclusive muita indignada com a situação, se comprometendo a fazer denúncia dos atos atentatórios a dignidade humana; Compareceu no local a Dra. Leiliane, da Comissão de Direitos Humanos da OAB/RO que acompanhou o caso e ficou de relatar os fatos e pedir esclarecimentos sobre a violência praticada. Ela participou da reunião e pode ver a situação em que os camponeses e camponesas foram expostos, pode constatar o excesso policial no local e o trato dado aos pessoas que estavam na reunião.
Os demais camponeses e camponesas que eram convidados da reunião e não puderam entrar, ficaram no parque da cidade, esperando o resultado da reunião. A reunião encerrou as 19:30 horas e não foi produtiva, pois, não havia como avançar na pauta em função da pressão psicológica promovida pelo INCRA e mais ainda, pela presença ostensiva da policia na sala de reunião: filmando, fotografando, identificando as pessoas e apontando ostensivamente o armamento de fogo. O INCRA entregou uma pasta de documentos com os encaminhamentos de cada área e novamente fazendo novamente promessas, sequer pedindo desculpas pela forma agressiva que tratou os camponeses e camponesas, clientes da Reforma Agrária. Esse é o tratamento do INCRA para camponeses e camponesas, numa clara demonstração de que as famigeradas leis da grilagem oriundas da MP759 vão ser cumpridas, com fogo e violência do Estado.
Porto Velho/RO, 22 de junho de 2018.
Lenir Correia Coelho
Advogada Popular
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