Terça-feira, 1 de março de 2011 - 11h39
LÚCIO FLÁVIO PINTO
Editor do Jornal Pessoal
BELÉM, Pará – Os cinco integrantes de uma quadrilha que tentou roubar 2,3 bilhões de reais do Banco do Brasil já estão presos. As duas magistradas, que quase permitiram a realização desse golpe através da justiça do Pará, continuam a trabalhar normalmente. Desde que a manobra foi desfeita, pela intervenção direta – e, do ponto de vista da formalidade legal, indevida – da corregedora nacional de justiça, Eliana Calmon, a única providência do TJE foi iniciar um Procedimento Disciplinar Preliminar.
Só depois dele é que pode vir a ser promovido um Procedimento Disciplinar Administrativo contra as duas magistradas. O percurso até uma punição prenuncia-se tão longo que a Ordem dos Advogados denunciou: a providência do judiciário paraense pode, mais uma vez, terminar em pizza. Por força do espírito corporativo.
“Isenção de ânimo”
Para o presidente da OAB do Pará, Jarbas Vasconcelos, o Tribunal de Justiça do Estado não tem “isenção de ânimo” para julgar tanto a juíza Vera de Araújo Souza quanto a desembargadora Marneide Merabet, que acolheram a pretensão de três dos membros do bando e bloquearam o dinheiro numa conta em favor deles no Banco do Brasil.
O TJE tentou realizar uma sessão secreta para instaurar o PDP (que só não se consumou porque a desembargadora Eliana Abufaiad não concordou, exigindo que a reunião fosse aberta), não levou em consideração a representação da Ordem por um procedimento mais rigoroso, o PDA, e tentou cercear a manifestação da Ordem e do Ministério Público na apreciação da matéria.
Para a OAB, em vez de agir dessa maneira, o tribunal devia ter determinado o afastamento preventivo das duas magistradas que atuaram no processo em 1º e em 2º grau. Mesmo que fosse provada a inexistência de dolo nas decisões que tomaram, tornou-se evidente a – digamos assim – falta de bom senso e equilíbrio na apreciação do pedido.
Como foi
Com base em dois comprovantes de depósito (o primeiro de 900 milhões de reais e o segundo de R$ 1,4 bilhão), supostamente de cinco anos atrás, o advogado, em nome de Francisco Pereira, se declarou com direito a sacar o dinheiro com base no usucapião especial, que reconhece o domínio depois de ocupação por quinquenal sem contestação. Mas quem concederia medida liminar, que antecipa a apreciação do mérito da questão, com base em documentação tão frágil, referente a um valor tão alto, no que pode ser classificado como o mais grave golpe do vigário (ou do magistrado) de todos os tempos.
Não adiantou o Banco do Brasil juntar provas da fraude ou pedir cautela à juíza Vera Souza. Ela manteve o bloqueio do dinheiro na conta. Sua decisão foi confirmada, em grau de recurso, pela desembargadora Marneide Merabet. A reincidência num erro tão grave afasta, na prática, a hipótese de ingenuidade ou desatenção na apreciação da matéria. Os golpistas, depois de terem sido barrados em três Estados, acabaram conseguindo apoio na justiça do Pará.
O que mais se pode esperar dos magistrados paraenses depois desse episódio? A que nível o judiciário do Estado pode descer mais na apreciação nacional? O que ainda será necessário para que casos tão graves como esse tirem da letargia da conivência a alta direção do tribunal, ou das outras instâncias da justiça e seus órgãos auxiliares?
O TJE precisa ter consciência do descrédito em que se afunda e reagir. Antes que o alerta venha por meio da prisão de um magistrado, já é só o que está faltando.
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