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Lúcio Flávio Pinto

Os incendiários ocultos - Por Lúcio Flávio Pinto


Depois que a casa, mais do que arrombada, pegou fogo, o governo federal resolveu destinar 15 milhões de reais ao Museu Nacional, no Rio de Janeiro. Não para restaurar o palácio da Quinta da Boa Vista ou recompor uma fração dos 1,6 milhão de itens do acervo da instituição que foram destruídos, a maioria irremediavelmente. Esse valor é metade dos R$ 31 milhões que o Ministério da Integração Nacional aplica – a toque de caixa, sem preocupação pelo caixa do erário, que responde pelas horas extras noturnas dos trabalhadores mobilizados – na principal obra eleitoreira do ex-titular do cargo, Helder Barbalho, candidato do MDB – de Michel Temer – ao governo do Pará. Com a obra simpática, ele tenta atenuar a rejeição de Belém aos Barbalho, iniciada no final dos anos 1980, com o fim desgastado do primeiro governo de Jader Barbalho.

Qual a urgência de uma intervenção paisagística ou de lazer na cidade, que é esse mal batizado Porto Futuro? Se ainda fosse a dragagem dos canais da Doca de Souza Franco e do Reduto, com a limpeza das suas comportas e a eliminação do lançamento de esgotos a céu aberto, que temperam o ar respirado pelos atletas da área nobre da capital paraense, se justificava. Mas é uma benfeitoria que, se ficar limitada à obra física, não livrará a área delimitada pela praças Magalhães e Waldemar Henrique da sua condenação recorrente ao abandono.

Enquanto os operários trabalham 24 horas para concluir o serviço antes da eleição, algumas dezenas de moradores de rua daquele reduto seguem nas suas vidas (e vais) marginais. Talvez eles sejam enxotados (ou expulsos) de suas tendas para que os atletas de academia, parentes e aderentes circulem pelo novo espaço. Se não houver segurança tão contínua quanto a urgência das obras de caça ao voto, eles novamente se afastarão e os intrusos sociais retornarão ao front, como das outras vezes.

Costuma-se contraditar as críticas a essas más aplicações de dinheiro público com o argumento de que são verbas carimbadas. Têm uma destinação certa, não podem ser remanejadas de uma rubrica para outra. Isso nem sempre é verdade, ou raramente é verdade. Mas ainda que fosse, o que impediria o então ministro Helder barbalho de, em tempo, aplicar os 31 milhões na dragagem dos canais, preparando-os para absorver mais água da chuva e da maré, assim poupando a população da área de drenagem das enchentes periódicas que lhes causam tormento e prejuízo?

É por isso que a ação do governo pós-casa arrombada, ao invés de aliviar, aumenta a indignação pelo crime de lesa-humanidade que Temer e seus antecessores, incluindo Lula e Dilma (a omissão do sociólogo Fernando Henrique Cardoso ainda não foi caracterizada, mas pode ser muito bem presumida pela sua falta de energia para cobrar a aplicação do dinheiro repassado), cometeram na antevéspera de um incêndio que horrorizou o mundo. Pelas chamas em si, mas, sobretudo, pelos que jogaram gasolina simbólica sobre o Museu Nacional. Cujas chamas envergonham as pretensões ao respeito dos brasileiros.

Os incendiários ocultos - Por Lúcio Flávio Pinto - Gente de Opinião

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