Segunda-feira, 6 de abril de 2015 - 09h56
Seis e quinze da manhã. A neblina intensa espraiou seus tentáculos na imensidão da natureza, espreguiçou-se e não desejou sair dos braços da madrugada que, qual amante, não desejava ser flagrada ao raiar do dia a partir daquele encontro clandestino. Detestava fofocas!
A neblina é recorrente numa época do ano nesta fronteira negligenciada. Talvez, por isso até a natureza em desencanto torna-se, de quando em vez, modorrenta, morosa, lenta e frustrada.
Entrei no escritório, mas, em seguida, resolvi sair com o objetivo de acompanhar o inicio do momento em que a neblina começasse a se dissipar.
Seis e trinta e nada...
Essa neblina de hoje, qual espírito incorporado pelo médium chamado de chão, rio, baia ou igarapé, trouxe um caboclo de nome nuvem e o encostou nos barrancos e avançou sobre as águas; ficou tão grudado que beijou com um ósculo apaixonado, sôfrego, sensual, quase devasso, num frenesi ávido, com ânsia de cobiça e posse, o solo da terra dadivosa.
E não se via nada adiante dos 100 metros. Tudo virou névoa, tudo transformado em bruma, escondendo a vida dos passarinhos e neutralizando o ingresso da luz do sol, que insistia em não se debruçar por sobre o horizonte. Mas eu sabia que, lá do alto, o astro airoso já brilhava retumbantemente.
E a bruma continuava tão viva 45 minutos depois, e, às 07 e 15 numa manhã de final de inverno, nenhuma evaporação acontecia.
Percorri alguns metros, depois, em direção aos diversos pontos cardeais. Ao Norte e a Leste um azul pálido permitia-se um Strip Tease surreal e descobria o corpo do entorno aos olhos dos viventes. Todavia, a Oeste e ao Sul a bruma insistia em não nos premiar com idêntica visão. Nem os ombros, nem o seio nu ousavam oferecer, até que as 07H35, ali tão perto, a cabeleira esverdeada de algumas árvores fronteiriças sugiram na minha visão. Terra à vista, alguém gritaria se estivesse perdido, no Oceano, à procura do caminho das Índias.
Resolvi andar e observei que gotas de água desejavam brilhar tão logo o sol ressurgisse, após o que essas nuvens tão agachadas subiriam para o céu, num processo igual à subida de Jesus, na ascensão.
A neblina, quando aparece, é fenômeno perigoso para quem voa ou trafega numa rodovia. A visibilidade é reduzida, expondo os mais afoitos a desastres, acidentes e morte.
Minhas observações me levam a constatação de que, ao longo das minhas caminhadas, a neblina simboliza solidão, posto que a passarada se recolhe, quando, num dia claro, ao contrário, fazem a algazarra natural de quem deseja agradecer a Deus pela vida que se inicia e pelas gotas de sereno que molharam plantas e arbustos engalanando a natureza, se durante a noite escura como breu ou se dourada pelo plenilúnio.
Pode ser até um pranto de alegria pelo teor que essas gotas espalham de vida, durante o sono tranquilo dos seres vegetais em que reciclam o tempo e melhoram a biodiversidade.
É certo, repete-se, que a neblina ofusca a visão dos seres; as aves se escondem e murmuram entre si a saudade do dia de ontem, tão claro e límpido e, na viagem mental sobre o dia anterior, sonham enquanto dominam o espaço aéreo, carregadas de saudade em que a fartura as conduziu à saciedade e imaginam, com esperança redobrada, no pronto amanhecer intenso, a surgir em breve, para que possam voar no rumo dos seus bicos, desejando encontrar alimento e nutrição.
Assim levado pela ansiedade, talvez pela ventania das minhas recordações, resolvi passear e olhei da altura em que estava para o Sul. Ao me locomover, os primeiros sons foram ouvidos: um, dos zogui-zoguis a anunciar muita chuva na parte da tarde; outro, a da curica que, dissipada a neblina local, ensaiou o bater de asas e cantou tão resoluta, por sobre a cumeeira.
E o céu, emoldurando o palco já iluminado, abriu-se de par a par e a natureza gargalhou! Estava alegre e feliz! O sol raiou na sua liberdade de ver e ouvir os cenários e os sons a que se acostumou a brindar os habitantes de planeta.
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