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Paulo Saldanha

CRÔNICAS GUAJARAMIRENSES: A COPA DE 1958


 

Paulo Cordeiro Saldanha*

Naquele tempo – mais uma vez estaria escrito se fosse linguagem do Novo Testamento– sem televisão nos 90% do Brasil brasileiro, ainda sem satélite, para a facilitação das transmissões, apenas o rádio fazia a nossa emoção. Na Europa, pela primeira vez houve transmissão televisiva para os países daquele Continente. Os demais, no mundo, teriam que acompanhar os jogos via radiofônica.

Os homens, jovens e crianças, tensos, ao redor dos aparelhos, alguns já transistorizados, ouviam em silêncio e sofriam calados curtindo as frases dos locutores, transferindo mentalmente força e energia para os heróis nacionais nos campos suecos.

Apenas aos mais velhos era facultado tecer comentários sobre o desenrolar das contendas. As unhas da meninada eram cortadas com os dentes afiados toda vez que o adversário chegava perto da área verde-amarela.

 Aqui e acolá um “foguete”, nome da época dado aos fogos de artifícios, explodia, de forma intermitente, fazendo a demonstração de que vivas almas, neste outro lado da nossa geografia, estavam torcendo pelo esquadrão tupiniquim.

Veio a Áustria e Nilton Santos desobedecendo a instruções do Feola, avançou em direção ao gol adversário, sem ligar para os gritos histéricos do treinador e levou “mercadoria canarinha das terras do Cruzeiro do Sul”, contra as traves do país de Mozart, este já consolidado como gênio da música que, de há muito, desfilava na história das artes no mundo.

O time nacional, ainda sem Pelé e sem Garrincha, mas com Mazola e Vavá, entre outros impunha 3 X 0 contra os austríacos.

 E o rádio foi o multiplicador da vitoriosa campanha nos gramados das cidades suecas, em que Gilmar, Djalma Santos, De Sordi, Dino Sani, Belini, Nilton Santos, Didi, Mazola, Zito, Pelé, Garrincha, Vavá, Zagalo, Moacir, Dida, Joel, etc puderam promover, para alegria de toda a Nação nesta antiga terra de Vera Cruz.

Ficou na memória a descrição pelo narrador esportivo da sequencia de jogos em que Garrincha e Pelé (como titulares), apoiados pelos companheiros, derrubaram as defesas adversárias (a Inglaterra foi a única com quem empatamos), Rússia, Pais de Gales, França, e Suécia, provocando uma histeria neste torrão continente, com golaços que se eternizaram nas lembranças de todos nós. A imaginação por conta do que ouvíamos no rádio se desdobrava em realidade como se estivéssemos à beira do gramado.

Aquela final contra a Suécia, para mim ficou inesquecível, pois quase toda a população saiu às ruas, percorrendo-as em passeata, gritando palavras de ordem, explodindo a nossa alegria.

Até que, no caramanchão, hoje o Canarinho, na Praça Barão de Rio Branco, nos confraternizamos e ouvimos os emocionados discursos, entre outros, do Rui Rodrigues de Almeida e Simão Salim, ambos retratando a trajetória vencedora e que, não obstante o sofrimento experimentado durante as transmissões do rádio, em que tensões eram nitidamente demonstradas, pela cadência acelerada dos nossos corações, mas que culminou, enfim, com a explosão de contentamento, durante a fase dos festejos: Brasil campeão do Mundo em 1958.

 Lembro até do cancelamento da punição ao Simão Salim, em face da anistia que o Decreto Presidencial do Juscelino, liberando de sanção os jogadores punidos, o que beneficiou o Salim, afastado um ano, como castigo, da prática esportiva porque, “sem querer querendo”, deu, meses antes, um murro na boca do árbitro Pedro Eleutério.

Águas passadas!

Esse mesmo Simão Salim, emérito goleador, orgulho de toda a cidade, integrante da seleção rondoniense de futebol, hoje, talentoso poeta, grande empolgador de platéias, quando a todos emociona, não com certeiros murros, mas com profundas declamações de poemas e sonetos, como o fez durante os eventos da Academia Guajaramirense de Letras-AGL, no Plenário da Câmara Municipal de Guajará-Mirim.

Que a saga dos nossos atletas do passado, demonstrada em 1958, 1962, 1970, 1994 e 2002 inspire esse grupo escolhido pelo Dunga, visando a alegria de um povo tão carente de boas emoções, pois o futuro a partir de 2011, é evidente, ainda não nos é dado conhecer.

Fonte: Paulo Saldanha. 
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