Segunda-feira, 18 de fevereiro de 2019 - 06h00
Sou filho da Mita Saldanha, tão extremada nas
preocupações e nos carinhos. E é tão eterna, que representa hoje, 57 anos
depois, tantas e imensas saudades!
Minha mãe, no contexto familiar, era a
grande comandante da família. Enquanto meu pai se realizava nas missões que
recebia, ela pensava o futuro de todos, pavimentando o nosso progresso
material. No campo religioso, sob sua orientação, na Igreja Católica nos
encontrávamos com Ele, sedimentando o nosso avanço espiritual. A melhor
qualidade para nossas vidas ela descobria lendo os livros que encomendava
através do reembolso postal e das revistas, com suas crônicas, análises e fotos;
e lia inclusive as propagandas, detalhe que acabei copiando. “O Cruzeiro” era
uma publicação que jamais faltava na nossa residência.
Nossa casa própria foi uma conquista que,
paulatinamente, ela foi concebendo, gerenciando o dinheiro dos dois provedores:
ela e meu pai.
Um dia, o governo do Território chegou
a atrasar 11 meses de salário. Uma crise enorme desceu sobre a economia do
município. Minha mãe foi para a máquina de costurar, fez vestidos, bordou
blusas e tecidos e, na cozinha, fez bolos, confeitou outros, e jamais faltou o
essencial para nós.
Bernarda,
minha avó tão pródiga na distribuição do amor, outra mãezinha, deixou perenes
marcas na minha capacidade para agradecer e reverenciar. Ela, com tão limitados
estudos, me educava e socializava através de provérbios e de lições de vida.
Durante aquele período que representou a negligência do então Território, a
minha Bernarda valeu-se da tenacidade e dos vínculos com a sua filha e netos, e
foi ardorosa nos trabalhos para que ao nosso grupo jamais faltasse comida.
Ocorre que um tratamento ortodôntico urgia.
Meus tios postiços, dois generosos cariocas, incentivaram meus pais a mandar-me
para as terras fluminenses, que eles cuidariam de mim.
Carinho
igual e recordações alvissareiras me tocam quando recordo da queridíssima tia Norma
Alves da Silva, amor que conquistei nas terras cariocas a partir de 1960.
E já como mãe adotiva, a minha tia Norma
lutou e conseguiu uma vaga num ótimo colégio no bairro do Leblon. Localiza-se
ainda hoje na rua Cupertino Durão. Trata-se do Colégio Santo Agostinho, a
poucos metros de onde morávamos, ali na rua Humberto de Campos. Não que eu
estivesse mal lá no Ginásio Barão de Paty do Alferes. Estava bem, motivado,
tirando boas notas. Todavia, como tinha eu iniciado um tratamento ortodôntico
no centro do Rio, no Edifício Odeon, o acompanhamento do especialista às vezes
ficava prejudicado, em face da distância entre Paty e a cidade do Rio.
Como sou desprovido do dom da premonição,
naquela manhã de 11 de fevereiro de 1962 eu me divertia em Teresópolis, na casa
do Doutor João Samuel, o Peninha, amigo do tio Ivo Jansen de Azevedo e do
almirante João Paiva de Azevedo. Fomos do Rio passar o dia na Serra de
Teresópolis. Estava feliz e não pressentia nenhuma nuvem negra sobre a minha
cabeça!
Era a hora do almoço. Enquanto eu ria,
brincava, andava numa pequena moto, minha mãe definhava e morria numa clínica
na cidade de Guayaramerín, Bolívia, para onde fora transferida em função do
desespero que pairava no seio de minha família, que não conseguia fazê-la
reagir no hospital de Guajará-Mirim. Foi um baque no campo sentimental e uma
pancada no material. Minha mãe vivia para o marido e para os filhos. No plano
material, como funcionária federal, seus proventos ajudavam a prover a família.
Mesmo assim, para manter o meu tratamento e os meus estudos no Rio, fez
implantar aqui na cidade um instituto de beleza. Com o faturamento mantinha-me
nas terras cariocas.
Lembro-me de como a notícia me foi
revelada pelos meus tios Ivo e Norma. Cedo, na segunda-feira, disseram-me que
minha mãe tinha tido um problema e estava internada. Mais tarde, disseram-me
que tinha piorado. Lá pelas duas horas, chegaram ao apartamento dois grandes
amigos de minha família: o ex-governador Paulo Nunes Leal e dona Talita, sua
mulher. Tia Norma, então, me disse que minha mãe tinha piorado muito. Começamos
a chorar. Deram-me um remédio e, em seguida, a infausta notícia de sua morte,
no dia anterior. Chorei muito! Com pouco mais de 15 anos, nunca tinha feito
nada por meus pais. O sentimento de perda é enorme, e o de culpa, muito maior!
Será que lhes dei amor, desvelo e compreensão? Não tive tempo, pensava, de lhe
ter beijado mais vezes, abraçado bem apertado. Lembro-me que escrevi dizendo
que a amava, mas não lembro de lhe ter dito, com palavras faladas: “mãe, eu te
amo”. Em contrapartida eu fui abençoado com muito amor e desvelo. Cuidado e
zelo. Com ternura e ensinamentos.
A morte de minha mãe atingiu-me de
forma violenta. Pensava nos meus irmãos mais novos que eu, e já órfãos de mãe.
Minhas notas caíram e eu só pensava em retornar.
Com
a passagem da Mita para o Oriente Eterno, o amor de mãe continuou a me alcançar
através da Norma Alves da Silva, na cidade do Rio de Janeiro, quando no dia 12,
após o fatídico 11 de fevereiro de 1962, entre lágrimas, eu a olhei bastante
comovido e lhe disse: “agora a senhora será a minha mãe”.
E a partir daí, enquanto vida ela teve, eu já adulto,
a Norma me acompanhou, escrevendo-me e aconselhando-me. Apresentei-lhe a minha
mulher Olgarina e ela abençoou a escolha.
Tia
Norma, suas filhas Vera Lúcia e Cristina e seu marido Ivo Jansen de Azevedo eram
uma família bem formada e acolhedora e da qual tive a felicidade de poder ter
sido parte, até que retornei para Guajará-Mirim.
A
Tia Norma representa as saudades que aprecio sentir porque a amei e amo com a
ternura do filho que não vê limite no sentimento verdadeiro, tendo a gratidão
que me envolve sempre que nela penso, porque quando me elevo imaginando-a, eu
sinto que esse fato me aperfeiçoa!
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