Sexta-feira, 12 de abril de 2013 - 20h48
Tempos depois, muito depois, Pilim, o filho de Manoel, o seringueiro, já adulto, guia do turismo de selva dos melhores, foi alertado pelo vigia do hotel que um boi graúdo, subiu no píer e chegara até a porta envidraçada da recepção. Depois retornara e adentrara na passarela que demanda à Baia existente no entorno.
Ora, nas passarelas costuma-se observar quatis, macacos, porcos-espinho, até distraídas capivaras, mas, bovinos, jamais!
E o acintoso mamífero trotava e trotava pelas palafitas (Pocotó, pocotó = onomatopeia do som dos cascos na madeira), fazendo um barulho seco, compassado que ecoava durante a noite e na fria madrugada do lugar.
Quem fosse corajoso, mas desconhecesse o fato, certamente, se amedrontaria com o barulho que vinha do Norte, posto que o bovino resolveu amuar-se lá pelos quintos da baía, numa plataforma.
Cedo, os dois administradores do estabelecimento resolveram ver, com os próprios olhos, a tal figura que, insolentemente insistia em transitar nas palafitas, um lugar de passeio e lazer para os hóspedes. Ação que quase lhes custava muito caro.
Pilim, munido do celular do patrão, iria fotografar o ruminante que vinha atemorizando a todos. Surpresa total: vendo-os, o touro “embilocou-se” na direção daqueles três, retirando a chance de ser fotografado, concorrendo para que o Franciscleudo (nome do Pilim) pulasse de cima da passarela, caindo sentado, 4 metros abaixo, no chão, sem ter-se quebrado, nem causado dano ao equipamento eletrônico, graças a Deus.
Aquele mamífero bovídeo tão bravo, ao passar bem ao lado das duas figuras, sem pedir licença, sacudiu os chifres pontiagudos em direção daqueles, que, mesmo em nome da física ocuparam um pequeníssimo espaço, tão salvador naquela hora.
Nem tiveram tempo para sentir medo. Mas, o pocotó, pocotó, pocotó já de forma acelerada, do endiabrado Nelore mestiço até hoje ainda está gravado nos cérebros dos três.
Não fosse uma árvore em tão boa hora poupada de ser derrubada pelos operários construtores da palafita, que os escondeu, aqueles dois restantes não estariam vivos para contar a história, visto que a desenfreada corrida do boi no rumo de ambos far-lhe-ia passar por cima deles, furando-os e/ou amarrotando-os.
E nenhuma foto do animal foi tirada, pois na rota em que estava não retrocedeu... e redescobriu o Píer, sumindo.
Apesar da queda que Pilim chama de salto, quase o carpado dos atletas olímpicos, o celular mantido na mão, nenhum arranhão sofreu e nem foi danificado
Aqueles três, ainda sentem os tremores, pelas lembranças que, de maneira profunda experimentaram quando o touro em desabalada carreira os teve como alvo. Mas, jamais reagiram como o Carlos, personagem da segunda história do texto anterior.
Mas, fato estranho, sem palafitas e sem ruminante aconteceu no Seringal São Pedro, lá pelas bandas do Rio Ouro Preto, lugar aonde trabalhavam Huascar Alvarado, profissional “de La Goma” dos melhores e o “Brabo” Ataualpa Nepomuceno Caparoeiro.
O brabo, aprendiz de seringueiro, do tipo caladão era muito trabalhador e se interessava na busca da experiência necessária para poder ganhar umas estradas de seringa, no ano seguinte, com vistas a ampliar o seu ganho, extraindo o látex, defumando-o, transformando-o em pesadas pelas de borracha.
Dava-se bem com o temporário chefe e mestre. Conversavam pouco, a não ser o necessário.
O barracão aonde poderiam buscar os gêneros de primeira necessidade, munição e outras mercadorias ficava distante 1 dia e meio de caminhada através de tosco varadouro.
Uma vez por mês o camboeiro e acompanhantes chegavam à colocação, deixavam o rancho, pesavam a produção gumífera e levavam o produto pronto para depois ser embarcado para a cidade mamorense.
Nessa vez o comboeiro trouxe para Huascar Alvarado um envelope. Certamente trazia uma carta, mensagem, por sinal, não aguardada. Aquele seringueiro jamais tinha recebido uma correspondência. Mas deixara parentes no lugar de sua origem.
E aqueles dois retornavam à rotina diária, cansativa, extenuante e perigosa.
E a carta continuava sem ser lida, guardada, presa num pegador no punho da rede, até que Huascar resolveu rasgar o tal envelope, que, aberto, trouxe uma correspondência, que lhe caiu desfolhada, com uns caracteres... um balançar de cabeça demonstrou uma febril angústia. E aquele homem, para desespero do companheiro, só balançava a cabeça sem pronunciar palavra alguma que fosse.
Um silêncio entediante compareceu, reinando naqueles momentos... até que... Aleluia! Aleluia!
Pegando novamente o documento, Huascar finalmente abriu a boca e ponderou:
–É triste!
–?... Ataualpa franziu o cenho e olhou para o único interlocutor presente ali na selva.
–É triste! Muito triste! E ponha tristeza nisso! Huascar, concluia revoltado!
–É triste, o que, “seu” Huascar?
–É triste! Meu Deus, como é triste!
–Meu Deus, que noticia essa carta lhe trouxe?
–É triste, meu bom companheiro. Como é triste!
–Morreu alguém da sua família, homem? Ataualpa já se impacientava.
–É triste, mas é muito triste, meu amigo, nem eu, nem você “sabê” ler. É triste nós “ser” dois “analfabeto”...
Só quando desceram para a cidade, no fim do fabrico, Huascar descobriu, no Colégio das freiras, que tinha ganho uma herança de um avô que enricara por conta da borracha e da castanha que produzia lá no rio Purus.
Crônicas Guajaramirenses - O poder do m da palma da mão
O M que lembra a palavra Mãe é o mesmo M que, conforme o Cantador nos ensina: é onde na palma de nossa mão principia o nome Maria.M que se une a ou
Crônicas Guajaramirenses - Olha pro céu, minha gente!
Azul, o nosso céu é sempre azul... Diz uma estrofe do Hino de Rondônia. Será?Bem antes do nosso “Sob Os Céus de Rondônia”, tentaram nos ensinar que:
Crônicas guajaramirenses - Por quê?
Por quê os prédios públicos são tratados pelos homens e mulheres do meu tempo com tamanha indolência? Preguiça, ou será má vontade?Por quê o edifíc
Crônicas Guajaramirenses - As águas negras e as águas barrentas
Sempre me comovo ao observar o encontro das águas, que, no caso rondoniense, são os beijos gelados entre os rios Guaporé e Mamoré e deste com o rio