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Silvio Persivo

O descontentamento surdo


Silvio Persivo (*)

Quando se olha para trás e se observa a eleição da atual presidente, Dilma Roussef, se constata que o Partido dos Trabalhadores-PT e seus candidatos estavam numa situação muito mais confortável. Lula conseguiu, com uma estratégia esmagadora e a fragilidade e incompetência da oposição, fazer Dilma vencer a eleição para a Presidência, em grande parte pelo fato da economia brasileira, aparentemente, andar bem, pois, se gabavam, com farta publicidade, de ter superado o baque causado pela crise mundial de 2008 e, para demonstrar isto, mesmo sem pesar os custos, trabalharam (e abriram generosamente os cofres) para que o crescimento do Produto Interno Bruto-PIB, em 2010, atingisse, na única vez que se conseguiu isto no governo petista, o recorde de  7,5%. Nem mesmo o alerta da inflação alta de 6,71% afetou o resultado, de vez que, para gregos e troianos, se exibiam os números do aumento de emprego, de renda da população e a continuidade de uma política que se trombeteava correta.

Calaram-se, sufocados pelos alaridos e a propaganda eleitoral, o fato de que nada havia mudado substancialmente. A carga tributária continuava a ser a mais elevada do mundo, os juros continuavam a ser altos (embora suavizados), a desindustrialização era, como tem sido, contínua e, o mais significativo dos sinais, os investimentos, para quem conhece economia a única forma possível de aumentar o PIB no médio prazo, continuava no mesmo patamar do início do século. De nada adiantava alertar, como se alertou, que as palavras otimistas de Mantega de que teríamos “quinze anos de crescimento sustentável” não se sustentavam; que, sem investimentos, o voo de galinha voltaria a se repetir, seria inevitável. E, para tentar evitá-lo, houve mesmo esforços de facilitar o crédito, estimular o consumo e até mesmo de desonerar certos setores, mas, como seria de se esperar, esforços inúteis.

O governo petista tem um pecado original: é contra o sistema de mercado. Tem a filosofia de tentar controlar o mercado, de influir no mecanismo da oferta e da procura por um voluntarismo que a história já provou ser inútil. E, dentro de tal filosofia, construiu uma política econômica contraditória que, ao mesmo tempo, que não faz a lição de casa de cortar os gastos públicos e tornar as despesas públicas mais eficientes tenta controlar a inflação aumentando as taxas de juros, ou seja, dando um tiro no próprio pé, de vez que, pelo menos, um terço de suas dívidas são indexadas aos juros. Também apresenta uma péssima execução dos programas e projetos, inclusive o Plano de Aceleração do Crescimento-PAC, uma peça publicitária que envolve no mesmo saco investimentos públicos e privados, mas, onde a execução acontece apenas nos projetos privados. Nunca antes neste país, para usar o chavão lulista, se conseguiu um recorde tão grande de obras públicas paradas, de projetos que não saem do papel. E o resultado também é visível: os gargalos da infraestrutura, os péssimos serviços públicos, o sucateamento da educação e da saúde.

Acrescente-se que o bem-estar que as pessoas sentiam antes, com o crédito farto e ganhos salariais, desapareceram com Dilma. Hoje, o endividamento geral e os salários que despencaram, a falta de bons empregos (o mercado desemprega os salários altos e emprega os de baixo custo), a reposição magra azedam o humor em relação ao governo. E a inflação se tornou um perigo real, embora o governo deseje pregar que se trata da oposição ou de muita imaginação de quem afirma isto. Porém, é a realidade do mercado onde a alta dos preços atinge quase todos os setores econômicos, mas, bate mais forte na alimentação e nos produtos dos supermercados, os insumos básicos, do dia a dia. Hoje, o descontentamento surdo vem de quem tem contas para pagar e, no fim do mês, percebe como subiram os serviços de cabeleireiro, manicure, escola, curso de inglês, telefone, gasolina, passagem de ônibus, alimentação e tantas outras coisas. Se Dilma Rousseff e Lula desconhecem esta realidade, e somente tratam de agradar o PMDB e o PT que brigam pelo supérfluo , é porque suas despesas são custeadas por outros. Mas, seria de se esperar que, pagando tantos assessores regiamente, estes, pelo menos, alertassem que, com a situação inflacionária atual, com o descontentamento silencioso que se propaga, a reeleição petista é um osso duro de roer mesmo contando, como conta, com uma poderosa máquina de propaganda, a boa vontade da imprensa e dos institutos de pesquisa e uma imensa quantidade de comissionados. Afinal o Titanic também parecia sólido.

(*) É economista e doutor em Desenvolvimento Sustentável pelo NAEA/UFPª.

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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