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Gente de Opinião

Silvio Persivo

Um gol no último minuto


Silvio Persivo (*)

O Brasil vai ser campeão do mundo. Enfático, possesso, destemperado grito: -Vai! É evidente que, como vidente, estou muito próximo das versões repetidas do governo sobre as elevadas taxas de crescimento, quase todas as vezes que são previstas, estão erradas e é necessário retificar, o que, no meu caso, não me desonra, pois, jamais fiz grandes previsões sobre o que desconheço. E, como economista, me cerco de cuidados e me previno: grito que vai, mas, não digo quando. E esclareço que me incomoda muito um certo derrotismo que paira sobre  o nosso futebol, que desmerece a síntese de um talento nato que já provou, em campo, que temos na desconcertante arte de improvisar nossa mais temível e eficaz arma. Sem modéstia: nós somos bons até para os argentinos babarem.

O futebol é uma invenção inglesa, todavia, queiram ou não, os derrotistas, é o maior e mais profundo componente da alma brasileira, apesar de ter um concorrente negro, seu irmão siamês, o samba, que quase o alcança gingando próximo de sua altura. Antes de existir, como o samba, o futebol já era uma predestinação nacional. E, não por acaso, o retumbante fracasso de 50 prenunciava que, oito anos depois, nós, quando criávamos a base de nosso antropofágico caráter, pela primeira vez, levantamos a taça e criamos orgulho de nós mesmos cantando, e dançando pelas ruas, nossa nacionalidade recém-adquirida. O Brasil se fez Brasil musicalmente comemorando as glórias do futebol e a crença num amanhã luminoso que ainda tarda a chegar. É verdade que um time com Didi, Newton Santos, Garrincha e Pelé estava destinado a ser grande em qualquer país do mundo, no entanto, não é qualquer país que é capaz de produzir gênios assim, heróis assim. Tão acima do comum que, como os heróis de hoje, eram desacreditados. Eles venceram por serem de uma qualidade tão grande, de uma estirpe tão especial, que acreditaram em si mesmo até contra a versão maciça de que eram inferiores. Mas, o passado, a qualidade e as glórias do nosso passado, no futebol ou em qualquer outro setor, não conta na era da falta de memória, da ignorância ativa, do espetáculo e da mediocridade.

No mundo inteiro não há um jogador, um só, com a qualidade, com o talento de Neymar ainda que não tenha a aplicação que deveria de um Zico. Messi? Perdoem-me espanhóis, argentinos e os que não sabem de futebol. Maradona foi o grande jogador argentino. Messi é um talento da burocracia. As loas que cantam do Barcelona, como, agora dos clubes alemães, são as loas da mediocridade. Futebol, futebol mesmo temos nós, brasileiros, e, depois, num ritmo de milonga com a capacidade dos chicaneiros, os argentinos. O resto, bem, o resto produz um talento de vez em quando. Talvez, a África e a China, quando despertarem para o encanto, a surpresa e a delícia do jogo, criem rivais para nós. Ainda hoje não há.

Não contesto que os analfabetos da governança, os risíveis e trágicos cartolas nacionais, conseguiram transformar nossos craques em grupos amontoados em campo, grandes promessas de craques, exaltados sem o devido preparo, presenteados com milhões e elogios indevidos, quando nem se preparam fisicamente, nem aprenderam a chutar direito, viraram peladeiros e recuperaram o complexo de vira-latas, daí, nossos tristes resultados atuais nos campos. Até mesmo Neymar, deslumbrado, não jogou, para olhar o Barcelona passear. Sem aplicação, sem esforço, Pelé jamais seria Pelé. Agora, se, em qualquer parte do país, se pegar um time razoável e fizê-lo aprender e treinar os fundamentos do futebol durante algum tempo, podem, sem receio algum, colocá-los para jogar contra qualquer time do mundo, que eles, com confiança e suando a camisa, farão, como fazia a molecada do Santos alguns anos atrás, quatro ou cinco gols em qualquer time sem perdão.

O futebol brasileiro, para o bem ou para o mal, é o retrato acabado do país. Só revela o imediatismo, a falta de compromisso, a politicagem e o despreparo dos seus dirigentes rebaixando a qualidade do material que deveria produzir sucesso. No futebol isto se revela pelas dispensas mensais dos técnicos, pelas derrotas, pelo baixo desempenho dos jogadores e pelos passes e chutes errados, a falta de gols. Na vida, o futebol de verdade, pela corrupção, pelo desperdício, pela ignorância popular que elege os Silvas iletrados e sem visão de futuro. Tudo igual: perdemos no futebol e na vida por não cuidar do essencial: a administração e os fundamentos.

O Brasil, entretanto, é muito maior que esta mediocridade visível. O Brasil vai ganhar, vai cumprir seu destino de ser, como previa Darcy Ribeiro, a “Nova Roma”. Nosso talento e criatividade é tão grande que vai soterrar a mediocridade. Posso estar errado, porém, intimamente, tenho a certeza de que não estou. Sou um otimista não congênito. Sou um otimista por militância. Sobrevivi a tantos dirigentes ruins que, na vida como no futebol, sou obrigado a acreditar em gol no último minuto. O Brasil vai ser campeão.  

 

(*) É Doutor em Desenvolvimento Sustentável pelo NAEA/UFPª e professor de Economia da UNIR.

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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