Segunda-feira, 18 de agosto de 2014 - 19h39
Silvio Persivo(*)
Todos sabiam que a entrada de Marina Silva iria mudar o jogo. Os números, porém, da primeira pesquisa do Datafolha são estarrecedores não tanto por colocar a nova pretendente no jogo (o que já era esperado), mas, por configurar uma situação de favoritismo que não se coaduna com as tendências que pareciam estar estabelecidas. Há na pesquisa algumas coisas que não parecem bem colocadas (para não dizer que estão bem arrumadas). É uma pesquisa que, por tudo que mostra, e na hora que mostra, somente favorece a candidata oficial, apesar de, aparentemente, ser boa para a nova concorrente. Em primeiro lugar, ao colocar Marina num empate técnico (e na frente de Aécio) estabelece logo de início a condição de que será um dos dois que estará fora do jogo, ou seja, na prática, coloca Dilma como estabelecida no segundo turno e joga os dois para trocarem chumbo na arena eleitoral. E mais: quando o governo somente enfrenta problemas, e a presidente nem sai às ruas sem ser vaiada, apresenta uma melhoria, pequena, porém, importante, no momento, ou seja, quase só falta dizer que o governo conseguiu um fato inédito que é o de melhorar com as condições objetivas piorando.
Claro que o fato de Marina aparecer com 21% é perfeitamente plausível. Até se esperava que tivesse um pouco menos, no entanto, a possibilidade era visível na medida em que é muito mais conhecida que Campos. O que é difícil de engolir na pesquisa é que seu crescimento tenha se dado sem que perca parte do eleitorado de Campos e que somente retire votos de outros candidatos que não os de Dilma (favorita para ser fatiada por estar na mesma raia de Marina) ou mesmo de Aécio. É um pouco estranho que Marina consiga conservar todo o legado de Campos e suba apenas em cima dos votos dos indecisos e dos brancos e dos candidatos nanicos, como parece ser o caso da pesquisa. Bem, não vou colocar em dúvidas o Datafolha. Afinal pesquisas também podem errar por causa das amostras, ou até mesmo de manifestações extemporâneas de pessoas submetidas à massificação da mídia. O estranho, como estranhei na eleição de Lula que, apesar de ter ido para o segundo turno quando pensava em vencer no primeiro, subiu dez pontos sobre Alckmin, é o fato de que os números parecem não bater com as tendências que se observam de deterioração do governo, de desejo de mudança ( que se tenta vender que não é tanto) e da rejeição imensa que se observa de Dilma. É claro que a pesquisa é pesquisa. No máximo um retrato de determinado momento que pode ser mal fotografado e não é decisiva. Todavia, num momento como este o retrato que o Datafolha mostra, embora fingindo ser bom para o PSB, somente serve para consolidar a candidatura de Marina (atingindo Aécio) e para influenciar os eleitores a favor do governo. Além do mais incute na nova concorrente uma lufada de vento que levanta o balão numa hora extremamente perigosa. Afinal Marina, em que pese sua densidade eleitoral, enfrenta sérios problemas em relação ao empresariado (inclusive de financiamento de campanha) e ao agronegócio, por suas posições xiitas em relação ao meio ambiente, bem como, se é bem vista pelos jovens, esbarra numa desconfiança acentuada dos mais cultos e mais velhos, ou seja, se ficar embriagada com os confetes iniciais pode dar com os burros n’àgua muito mais cedo do que pensa. Para ser, de fato, uma candidata com chances terá que passar por muitas provas. Já a pesquisa feita, como foi feita, sob o calor da emoção da morte de Campos, parece mais uma missa encomendada, mas, como ninguém aponta a encomenda, nem tem como refutar seus dados é, hoje, mais uma peça do jogo eleitoral. Resta saber se resistirá no campo real da disputa verdadeira: a cabeça do eleitor.
(*) É doutor em Desenvolvimento Sustentável pelo NAEA/UFP.
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