Terça-feira, 17 de julho de 2012 - 16h17
É tão chato escrever sobre corrupção no Brasil que o leitor já deve ter abandonado o artigo. Não há revelações, surpresas, brilhantismo e nem alguém que se choque com revelações de trapaças ou safadezas.
Em todo caso, é preciso deixar claro que a corrupção que mais nos afeta é a do dia a dia, a que nos cerca e nos atinge de perto. É esta pequena falha de caráter que acaba absolvendo, instigando nossa flexibilidade moral em aceitar os grandes golpes.
A corrupção não é menor, menos grave ou pior assim ou acolá. A corrupção é uma só, seja grande, pequena, leve, imensa, sempre terá o mesmo significado. Corromper significa adulterar, perverter a substância, a integridade de algo, modificando a estrutura de tal forma que seus efeitos sejam o oposto do que se esperava.
No Brasil, a manifestação mais clara da corrupção ocorre com a mistura entre público e privado; pensa-se, de forma corrompida, distorcida, que o espaço público é a extensão de nossa casa, vê-se nos recursos públicos uma reserva para cobrir despesas pessoais e familiares. Isto ocorre porque pensamos que “o que não tem dono pode ser abocanhado”, “achado não é roubado” e tantas outras.
Por meio da corrupção do próprio conceito, na cultura brasileira, formou-se a visão deformada de que o público não é de ninguém, sem um responsável específico. Como não formamos uma cultura política pública, o espaço público não se constitui em responsabilidade comum, partilhável por todos.
Com o significado original torcido pelo ato da corrupção, o resultado é a deformação total das intenções, com seu apodrecimento e decomposição. Por exemplo, quando há uma lâmpada acesa, em uma escola pública, ninguém apaga, porque a escola não é de ninguém. Quantos livros com carimbos de biblioteca pública são vendidos livremente em sebos?
A corrupção miúda, diária, portanto, soma-se àquela podridão que vemos na TV, nos jornais ou na Internet. A diferença são os números que envolvem ambas. Os milhões desviados da saúde pelo secretário ou ministro de saúde, é óbvio, matam milhares de pessoas, diretamente. Mas, os remédios desviados pelos servidores, atendentes, se somados pelo país afora, é igualmente óbvio, também aniquilam milhares de pessoas.
Não há o “menos pior”, há o volume de recursos desviados que chama a atenção. É como se fosse aplicado um marketing à corrupção e aí só observamos e falamos do peixe-grande. Aliás, diz-se que rico no Brasil não vai à cadeia – o que é verdade – e isso mostra a corrupção do sistema judiciário e prisional. No entanto, apesar dessa verdade, não podemos nos esconder sob os escombros dos outros.
A desculpa de que meu líder é corrupto e por isso seu exemplo autorizaria minha deterioração pessoal não é válida. É certo que as elites brasileiras sempre foram corruptas, mas isto não pode ser uma bacia das almas em que todos se lavam. O peixe-graúdo deve ser preso, certamente, mas o peixe-miúdo não pode passar impunemente pelo vão da rede pública do direito e da justiça.
Vinício Carrilho Martinez - Professor Adjunto II (Dr.)
Universidade Federal de Rondônia
Departamento de Ciências Jurídicas
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