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Gente de Opinião

Vinício Carrilho

Caso Vitória - o feminicídio em alta1


Tainá Reis - Vinício Carrilho Martinez - Gente de Opinião
Tainá Reis - Vinício Carrilho Martinez

Vinício Carrilho MartinezDoutor em Ciências Sociais

Tainá ReisDoutora em Ciências Sociais


Foi amplamente veiculado na mídia o caso de Vitória, jovem de 17 anos sequestrada e barbaramente assassinada. Não cabe entrar em detalhes do crime, pois aqui a intenção não é reproduzir o sensacionalismo muitas vezes encontrado na cobertura de casos como esse. O que buscamos é apontar, por um lado, o processo social que faz o feminicídio ser ainda tão presente na sociedade brasileira e, por outro, entender o papel do Estado frente a tal quadro.

O feminicídio passa a ser considerado crime específico no Brasil em 2015. A partir da promulgação da Lei 13.104/2015, que altera o Código Penal, o feminicídio foi incluído como uma qualificadora do homicídio, considerado como crime hediondo, com penas de 12 a 30 anos. Esse avanço na legislação vem no esteio da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência Contra a Mulher (Convenção de Belém do Pará) ocorrida em 1994[1]. Em 2024 entrou em vigor a Lei 14.994, que aumenta a pena para feminicídio (20 a 40 anos) e para outros crimes de violência contra a mulher, como lesão corporal, injúria e difamação, e o coloca não mais em um qualificador de homicídio, mas como crime autônomo.

Apesar de avanços na pauta de defesa das mulheres, o Brasil continuou figurando entre os países com maiores índices de violência de gênero, conforme dados do Mapa da Violência. O que se observou é que as mulheres eram assassinadas justamente por serem mulheres, em contexto de violência doméstica ou discriminação de gênero (quando o crime é motivado por ódio, desprezo ou sentimento de posse sobre a mulher). Desse modo, a lei do feminicídio surge exatamente por uma admissão jurídica de que as mulheres estão morrendo por conta de sua própria condição de mulher.

Segundo o 18º Anuário Brasileiro de Segurança Pública, 1.467 mulheres morreram vítimas de feminicídio em 2023 — o maior registro desde a sanção da lei que tipifica o crime, em 2015. As agressões decorrentes de violência doméstica tiveram aumento de 9,8%, e totalizaram 258.941 casos. (Agência Senado, online, 2024)

Desde a tipificação do feminicídio em 2015, 11.859 mulheres foram assassinadas pela condição de gênero (Folha de São Paulo, 2025). O 18º Anuário Brasileiro de Segurança Pública mostrou que, em 2023, mais de 65% das mulheres assassinadas de forma violenta eram negras, em sua maioria com idade entre 18 e 44 anos. 64,3% dos feminicídios ocorreram na residência das vítimas; 63% dos agressores eram parceiros íntimos das vítimas, 21,2% eram ex-parceiros íntimos.

Conforme a Rede de Observatórios de Segurança, que realiza o monitoramento dos casos de violência contra a mulher em nove estados (Amazonas, Bahia, Ceará, Maranhão, Pará, Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro e São Paulo), em 2024, uma mulher morria a cada 17 horas por uma razão de gênero, totalizando 531 vítimas no ano. Ainda em 2024, a cada 24 horas pelo menos 13 mulheres foram vítimas de violência nesses nove estados. Em 2025, Vitória foi uma delas, barbaramente assassinada poucos dias antes de completar 18 anos.

Por que os homens odeiam as mulheres?

A violência de gênero é um problema estrutural. Mas o que isso quer dizer exatamente? Quer dizer que desde que nascem, meninos e meninas são socializados, ensinados (em casa, na escola, pela mídia, enfim, pela cultura) que há uma hierarquia entre eles. Desde a tenra idade é disseminada uma noção de superioridade dos homens sobre as mulheres. Isso é o que se convencionou chamar de patriarcado, um sistema social em que os homens detêm o poder (moral, social, político), enquanto as mulheres seriam relegadas a papéis ditos secundários, como cuidadoras, mães e esposas[2], com menor autonomia e direitos (Federici, 2017, Saffioti, 2013).

A violência é um instrumento de manutenção do status quo de uma estrutura social patriarcal, ou, trocando em miúdos, é o meio pelo qual o poder masculino é mantido (Saffioti, 1995). Assim, a violência de gênero não é algo individualizado, apesar de ser um agressor que vai usar a violência como forma de reafirmar seu poder e controle sobre a mulher. Esse comportamento masculino é produzido socialmente, em uma sociedade de base patriarcal. O que houve com Vitória e com tantas outras mulheres não é uma monstruosidade de homens loucos, mas um sintoma de uma sociedade patriarcal.

Nesse sentido, podemos entender também a misoginia (o ódio às mulheres): não se trata de um sentimento individual de um homem machista, mas uma espécie de sistema disciplinador que pune as mulheres que desafiam os papéis de gênero tradicionais (Manne, 2017). A busca por igualdade e independência das mulheres gera insegurança e hostilidade nos homens (Beauvoir, 2016), e a violência serve para intimidar as mulheres, reforçando sua submissão. O discurso misógino normaliza esses atos de violência.

Ainda, a partir dos dados apresentados anteriormente, mas também contando com a discussão teórica de diversas autoras feministas, entendemos que a maneira como as mulheres estão submetidas aos padrões de poder não é igual, há de se destacar a intersecção entre raça e classe (Davis, 2016, Collins, 2019, Gonzalez, 2020). Lélia Gonzalez discute como a violência contra a mulher negra é historicamente naturalizada, resultado de uma herança escravocrata que consolidou estereótipos legitimadores do controle masculino sobre seus corpos. Segundo a autora, essa violência é invisibilizada por uma sociedade estruturalmente racista, justamente por reforçar estereótipos como da "mulata fogosa" e da "mãe preta" sacrificada, ignorando o sofrimento dessas mulheres.

Gonzalez (2020) denuncia a negligência do Estado em relação a essas pautas, que contribui para a perpetuação dessa opressão. A Rede de Observatórios da Segurança, ao tratar sobre os dados de violência contra a mulher e feminicídios de 2024, afirma:

Continuamos chamando a atenção, ano após ano, para um fenômeno muito maior do que essa amostragem, que foi normalizado pela sociedade e pelo Poder Público como apenas mais uma pauta social. E por isso os números seguem aumentando, enquanto as políticas de assistência estão sendo fragilizadas. (...) Apesar de importantes avanços ao longo dos anos com a institucionalização dos mecanismos de proteção às mulheres, como as Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (Deams), a Lei Maria da Penha e a tipificação do feminicídio como crime – que deveriam estar mais consolidados e dotados de melhores condições de funcionamento –, a violência contra mulheres e o feminicídio continuam sendo uma realidade alarmante em nosso país. (Campo, online, 2025)

O que observamos é que, a despeito de algumas políticas, os números de feminicídio e violência contra a mulher continuam alarmantes, vitimando mais as mulheres negras. Assim, entendemos que é necessário combater as raízes sociais e culturais do racismo e do patriarcado, além de garantir a aplicação efetiva da legislação já vigente.

Políticas de Estado no Estado Democrático de Direito Social

Diante do exposto, além das óbvias previsões criminais, crimes como o feminicídio, racismo, fomento aos crimes de ódio social, tentativas de golpe, homofobia e outros – em que se destaca não apenas o barbarismo dos indivíduos, mas também o laivo fascista, de claro atentado à condição humana – deveriam/precisam receber a atenção pública e os aportes institucionais adequados.

Como se vê cotidianamente, não bastam as políticas públicas (as que existem, se é que existem), é necessário haver uma mudança estrutural (social, cultural) e institucional, constitucional. Esse “outro paradigma” colocaria essas ações abomináveis sob a inflexão de Políticas de Estado. Isso é urgente, acima de tudo, para que as trocas governamentais não acabem com as poucas políticas públicas já previstas.

Com o entra e sai de governos, as políticas públicas são abaladas ou fortalecidas, é do “jogo político” (ideológico) de quem detém a caneta da heteronomia. Sob a forma de Políticas de Estado, como ocorre com a educação pública e com o SUS (Sistema Unificado de Saúde), as travas institucionais, constitucionais, são efetivamente imunes às ações reacionárias, negacionistas, desconstitutivas da condição humana.

A palavra mágica que as protege é conhecida como “cláusula pétrea”: são as cláusulas de pedra irremovíveis do estofo da Constituição Federal de 1988. Não se mexe nelas e é só por isso que ainda não acabaram com o SUS – que atende milhões de brasileiras e de brasileiros totalmente desamparados, famélicos, submetidos à selva capitalista desse Brasil que se alinha e se alimenta dos restos do Pensamento Escravista.

Portanto, antes de avançarmos mais, é oportuno buscarmos a distinção entre Estado e governo. Empregaremos aqui dois dicionários não-usuais porque trazem luz a um outro problema também: o chamado Partido de Poder[3].

Por Estado podemos entender uma:

Sociedade juridicamente organizada, com um território e um povo determinados. Permite e favorece a convivência pacífica e a realização da totalidade dos fins humanos [...] Aparece aqui o poder monopolizado territorialmente, a existência de uma ordem jurídica e administrativa organizada como um sistema, que repousa sobre disposições fundamentais, e a existência de um corpo administrativo consignado a esse cumprimento [...] Jellinek define o Estado como a “corporação territorial dotada de um poder de mando originário”[4], devendo-se entender por corporação a síntese jurídica que expressa as relações jurídicas da unidade associativa e considerando a corporação como um sujeito de direitos (Rojas, 2001, p. 436-7 – tradução livre).

Já por governo temos que[5]:

É, por oposição (antonomásia), a complexa função de conduzir as pessoas e administrar as coisas do Estado ou o conjunto de órgãos que lhe cabe. A tarefa de governar compreende dois grandes aspectos: conduzir pessoas e administrar coisas (as coisas públicas). O governo das pessoas implica dirigi-las, induzi-las, motiva-las, alenta-las, desalenta-las, estimula-las, disciplina-las, empurra-las, detê-las, coordenar seus esforços, assinalar metas, articular suas atividades para que cada uma delas cumpra a parte que lhe corresponde na vida comunitária[6] [...] A administração das coisas do Estado é a promoção ou gestão delas mesmas e a supervisão do processo de produção, circulação e distribuição dos bens econômicos (Borja, 1988, p. 477 – tradução livre)[7].

          Retomando o paralelo, cabe a certeza de que as Políticas de Estado não abdicam das políticas públicas; pois, pelo contrário, espera-se atribuir-lhes maior robustez, profundidade e alcance estrutural – a exemplo da dotação orçamentária específica e sob o guarda-chuva constitucional das cláusulas pétreas.

          A primeira conclusão lógica, portanto, nos diz que as Políticas de Estado são mais resistentes do que indicam as políticas públicas e esse aspecto, per si, aumenta nossa aposta institucional, constitucional, para acirrarmos formas de combate aos piores crimes cometidos no país. Lembremos ainda que a mudança estrutural no enfrentamento desse tipo de violência acarretaria um enfrentamento mais decisivo contra os mesmos problemas estruturais (históricos) e que desembocam na violência diária.

Possivelmente, com a imposição de Políticas de Estado, para os casos gravíssimos de crimes como feminicídio e os variados crimes de ódio social (aos que se soma a misoginia), chegaríamos mais próximos de alguma Justiça Social e do ideal definido pela Constituição Federal de 1988 na forma do Estado Democrático de Direito Social (Martinez, 2025). Tecnicamente, diz-se que o Estado de Direito[8] estaria (se isso ocorrer) redefinido a fim de um efetivo cumprimento dos direitos humanos – agora assentados sob a guarida constitucional dos direitos fundamentais.

Neste ponto, ainda podemos inflexionar que o Poder Político[9] não mais estaria apartado de suas “obrigações públicas de fazer” – uma vez que, sob o escopo das cláusulas pétreas, o Estado é obrigado a obstinar-se a tal efetividade, sendo ele mesmo corresponsável e, portanto, sujeito aos rigores do Império da Lei – especialmente, no sentido de que a juridicidade estaria alinhada à administração das coisas públicas (República) em prol de um mínimo de segurança social aos grupos, classes e indivíduos mais desassistidos e subjugados pela disparidade política e desigualdade social. Este seria o maior e melhor âmbito protetivo dos direitos fundamentais (Sarlet, 2012), na vanguarda das cláusulas pétreas. 

Conclusões em aberto

Por fim, mas não menos importante, cabe ressaltar que (finalmente) a legalidade (Políticas de Estado) se alinharia politicamente, juridicamente, com a legitimidade[10]: a pretendida Justiça Social.

No caso aqui interposto, sob a alcunha de Políticas de Estado, o Estado brasileiro (do patriarcado, machismo, misoginia) estaria obrigado a agir de um modo que lhe é inusitado, bem como estaria barrado nas suas intenções/ações costumeiras até então (de provocar mais racismo e desigualdade social). O resultado técnico, pode-se dizer, ver-se-ia na subsunção do governo aos postulados éticos e institucionais do Estado Democrático de Direito Social – ao contrário do que verifica historicamente, e mesmo no pós-1988[11].

Temos, então, que as Políticas de Estado nos beneficiam – retirando-nos do escopo basicamente passageiro, ocasional, dos governos de plantão – uma vez que também se alicerçam nas definições e amarras institucionais e constitucionais que devem alinhar o Poder Político (Estado, porquanto seja a “instituição por excelência”, a instituição por definição preliminar e diretiva das demais instituições: a instituição com o poder de status). Se as políticas públicas estão ao sabor das intempéries ideológicas de governos transitórios, as Políticas de Estado se compõem e se articulam na perenidade da definição e das ações constitutivas do Estado Democrático de Direito Social.

Quem sabe, neste momento ideal, o Caso Vitória viesse a refletir uma infinidade de meninas vencedoras e de vida longeva, e não mais as derrotas do país todo.

 

Bibliografia

AGÊNCIA SENADO. Lei que pune feminicídio com até 40 anos de reclusão entra em vigor. Brasília. 10/04/2024. Disponível em: https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2024/10/10/lei-que-pune-feminicidio-com-ate-40-anos-de-reclusao-entra-em-vigor. Acesso em 16 mar. 2025.

ALLAND, Denis; RIALS, Stéphane. Dicionário da Cultura Jurídica. São Paulo: Martins Fontes, 2012.

BEAUVOIR, Simone de. O segundo sexo: a obra fundamental do feminismo moderno. Tradução de Sérgio Milliet. 1. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2016.

BOBBIO, Norbert. et. al. Dicionário de Política. 5. ed. Brasília: Universidade de Brasília: São Paulo: Imprensa Oficial do Estado, 2000.

BORJA, Rodrigo. Enciclopedia de la Politica. (2ª ed.). México: Fondo de Cultura Económica, 1998. 

CAMPOS, Ana Cristina. A cada 17 horas, ao menos uma mulher foi vítima de feminicídio em 2024. Agência Brasil, 13 mar. 2025. Disponível em: https://agenciabrasil.ebc.com.br/direitos-humanos/noticia/2025-03/cada-17-horas-ao-menos-uma-mulher-foi-vitima-de-feminicidio-em-2024#:~:text=Os%20dados%20apontaram%20um%20total,o%20%C3%ADndice%20%C3%A9%20de%2070%25. Acesso em: 16 mar. 2025.

COLLINS, Patricia Hill. Pensamento feminista negro: conhecimento, consciência e a política do empoderamento. Tradução de Heci Regina Candiani. São Paulo: Boitempo, 2019. 

DAVIS, Angela. Mulheres, raça e classe. Tradução de Heci Regina Candiani. São Paulo: Boitempo, 2016.

FEDERICI, Silvia. Calibã e a bruxa: mulheres, corpo e acumulação primitiva. Tradução de Coletivo Sycorax. São Paulo: Elefante, 2017.

FOLHA DE SÃO PAULO. Feminicídio fez mais de mil vítimas por ano no Brasil desde 2015. 12 mar. 2025. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2025/03/feminicidio-fez-mais-de-mil-vitimas-por-ano-no-brasil-desde-2015.shtml. Acesso em: 17 mar. 2025.

FÓRUM BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA. 18º Anuário Brasileiro de Segurança Pública. São Paulo, 2024. Disponível em: https://publicacoes.forumseguranca.org.br/items/f62c4196-561d-452d-a2a8-9d33d1163af0. Acesso em: 17 mar. 2025.

GONZALEZ, Lélia. Por um feminismo afrolatinoamericano. Rio de Janeiro: Zahar, 2020

HOOKS, bell. A vontade de mudar: homens, masculinidade e amor. Tradução de Stephanie Borges. 1. ed. São Paulo: Elefante, 2023.

JELLINEK, Georg. Teoria General del Estado. México: Fondo de Cultura Económica, 2000.

MANNE, Kate. Down Girl: The Logic of Misogyny. New York: Oxford University Press, 2017.

MARTINEZ, Vinício Carrilho. *Ensaio sobre o estado democrático de direito social*: concepção jurídica burguesa ou socialismo na modernidade tardia? São Carlos: Pedro & João Editores, 2024b. Disponível em: https://pedroejoaoeditores.com.br/produto/ensaio-sobre-o-estado-democratico-de-direito-social-concepcao-juridica-burguesa-ou-socialismo-na-modernidade-tardia/

OUTHWAITE, William; BOTTOMORE, Tom. Dicionário do pensamento social do século XX. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1996.

ROJAS, Andrés Serra. Diccionario de Ciencia Politica. v. II. Fondo de Cultura Económica – Facultad de Derecho/UNAM: Ciudad de México, 2001.

SAFFIOTI, Heleieth. A mulher na sociedade de classes: mito e realidade. 3. ed. São Paulo: Expressão Popular, 2013.

SAFFIOTI, Heleith Iara Bongiovani. Violência de gênero. Poder e impotência. Rio de Janeiro: Revinter, 1995.

SARLET, I. W. Curso de Direito Constitucional (et al). São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2012.


[1] A Convenção de Belém foi um marco internacional que pressionou o Brasil a adotar medidas específicas para proteger as mulheres, como: reconhecer a violência contra a mulher como violação de direitos humanos; promover campanhas de prevenção e conscientização; garantir mecanismos de proteção e assistência às mulheres; realizar coleta de dados sobre esse tipo de violência, entre outros. Uma das políticas que se consolidou para atender essa demanda foi a expansão das delegacias especializadas de atendimento à mulher (DEAM) para todo o território nacional, criação de centros de referência e de casas abrigo. Outra medida, foi a Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006), que criou mecanismos para proteger as vítimas de violência doméstica e punir os agressores.

[2] Diz-se ditos secundários pois, na realidade, esses são trabalhos profundamente necessários para a reprodução social, porém, invisibilizados e não remunerados.

[3] Empregamos dicionários de ciência política lastreado na reflexão mexicana porque nos permitem um paralelo entre o PRI (Partido Revolucionário Institucional), no poder durante 70 anos no México – com profundos desvios diante do ideário da Revolução Mexicana (décadas de 1910/1920) – e alguns partidos brasileiros, como o PSDB e o PT: o primeiro foi um “partido de quadros”, acostumado ao neoliberalismo, nascido dessa ideologia; o segundo veio se acostumando ao poder, em troca de se distanciar de suas bases, da militância que fora composta por estudantes, trabalhadoras e trabalhadores e pelo povo pobre, negro e oprimido. Seja como for, à direita ou mais à esquerda do limite neoliberal, temos nessa dança de cadeiras do governo federal brasileiro mais uma contraprova da urgência de postarmos mais proteção social na condição de Políticas de Estado.

[4] O que ainda corresponde ao longo processo histórico de maturação das institucionalidades no âmago do Estado de Direito (Jellinek, 2000).

[5] Cabe uma nota de acréscimo no sentido de que ao governo tem imbricação tanto a governança (via de regra descrita como suporte institucional, legal) quanto a governabilidade: sendo que a esta refletem as próprias “condições de governabilidade”, ou seja, os humores, a situação, as condições objetivas que permeiam “melhores ou piores condições de governabilidade”.

[6] Não é difícil perceber, pela articulação dos verbos impostos, como se imiscuem o espaço público e o privado, no tocante à gestão governamental de pessoas.

[7] Por sua vez, seu antípoda, é o Estado de não-direito, Estado Paralelo, “governo dos homens” (em revés do “governo das leis”) ou simplesmente “governo de fato”: “É o que se instaura ou se exerce à margem ou contra a lei. O de fato sugere necessariamente a ideia de antijuridicidade. O de fato está em permanente contradição com o de jure em matéria política. De maneira que governo de fato é o que se origina à margem da lei ou o que se exerce contra ou fora do direito” (Borja, 1988 p. 478 – tradução livre).

[8]estado de direito é aquele no qual a lei elaborada pelos legítimos representantes da comunidade está acima dos indivíduos, grupos ou instituições” (Rojas, 2001, p. 438).

[9] “O que caracteriza o poder político é a exclusividade do uso da orça em relação à totalidade dos grupos que atuam num determinado contexto social, exclusividade que é o resultado de um processo que se desenvolve em toda a sociedade organizada, no sentido da monopolização da posse e uso dos meios com que se pode exercer a coação física. Este processo de monopolização acompanha pari passu o processo de incriminação e punição de todos os atos de violência que não sejam executados por pessoas autorizadas pelos detentores e beneficiários de tal monopólio (Bobbio, 2000, p. 956).

[10] “A questão da relação entre legitimidade e legalidade apresenta-se principalmente no direito político quando se trata de saber se a existência de dado governo está ou não fundamentada em direito. Contudo, por analogia, pode-se pensar a legitimidade de um ato jurídico ou de um comportamento em termos de conformidade com a regra ou com a lei em vigor, em dado sistema” (Alland e Rials, 2012, p. 1090).

[11]O paradoxo do poder do estado

A teoria tradicional preocupava-se com o alcance dos poderes discricionários do estado – na verdade foi estabelecida por ele – isto é, a oposição polarizadora entre regimes despóticos e constitucionais [...] Disso resulta um paradoxo. A força do estado é, em geral, resultado de até que ponto ele pode colaborar com agrupamentos da sociedade civil, e essa colaboração é normalmente garantida por alguma limitação dos poderes despóticos do estado” (Outhwaite & Bottomore, 1996, p. 258-9).

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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