Quinta-feira, 23 de agosto de 2012 - 16h09
Vinício Carrilho Martinez
Professor Adjunto II da Universidade Federal de Rondônia
Departamento de Ciências Jurídicas
Doutor pela Universidade de São Paulo
A educação pública deve ser de qualidade e universal. Não há dúvida. Além disso, deve seguir a metodologia ou orientação ideológica da “escola histórico-crítica”. Levantaria um busto para tanto. Mas também deveria ser libertadora. Claro, levantaria outro busto. E ainda deveria ser reflexiva, criativa. Ótimo, teríamos o terceiro busto.
Mas como fazer com que isto aconteça? Em primeiro lugar, e é bem óbvio, é preciso ter vontade. Depois, aproximar os meios e as pessoas. Por fim, definir claramente que o resultado esperado só pode ser a educação inteligente. E este é o ponto chave, o que mais necessitamos atualmente é de inteligência.
Definiria a educação inteligente como aquela capaz de adequar meios e fins, forma e conteúdo, ética e técnica, o composto e o componente, em que não se sobrepõem a epistemologia e a ontologia, em que se alinham o bom senso e a busca do equilíbrio, em que os resultados não subvertem os valores, em que a autoridade é constituída pela meritocracia e tem no diálogo o primeiro recurso.
A essa altura, o leitor poderá me dizer que isto tudo é muito bom, mas que é um ideal. Em primeiro lugar, responderia que este ideal é bastante real, como veremos no exemplo da Polícia Militar do Distrito Federal. A utopia, é bom lembrar, não é uma ilusão inalcançável, mas somente o que se deseja e que ainda não se materializou. Do contrário, a distopia, a falta de direção, de vontade se apresentaria sempre aliada à desilusão. E o que constrói a desilusão?
Para não se iludir com a utopia é melhor limitar-se à desilusão, à falta de sonhos, à incapacidade de ter desejos? Neste caso, o que é um sujeito sem perspectivas, projetos? Os projetos alimentam as esperanças e isto move nossa ação. Projeto, do latim “projícere”, indica o que vem de dentro, é transbordante, o que irradia. Portanto, uma educação inteligente que se espraia por todo lugar, que alcança a todos, que é capaz de levar a inteligência a todos e não apenas as regras e os conteúdos que se espera decorados.
A educação inteligente é fecundante, duplica – ao invés de apenas replicar; a educação inteligente é eficiente em edificar a autoridade, ao mesmo tempo em nega o autoritarismo. No exemplo dado da PM do Distrito Federal, vê-se um coronel citar de forma muito bem colocada o grande Paulo Freire, logo após ter passado instruções de treinamento no BOPE (Batalhão de Operações Especiais). Este mesmo coronel faz mestrado em ciência política.
E há muito mais a se verificar. Veja-se que é recém criado o Instituto Superior de Ciências Policiais e a direção de pesquisas está a cargo de um cabo que faz doutorado em ciências sociais. Há outro cabo que é doutor em literatura. Neste exato momento, há sete oficiais concluindo o doutorado. Um oficial retornou de Portugal, onde concluiu a pesquisa, e há outro que vai retornar à França, para fechar sua pesquisa.
Lembre-se que a PMDF tem 95% de seus policiais com nível superior – há anos, o edital de concursos exige esta titulação mínima. Hoje, o comando paga uma centena de bolsas de estudos de pós-graduação para soldados e oficiais interessados, em uma das melhores instituições nacionais. O comandante-geral tem livros publicados.
Onde o leitor imaginaria encontrar um soldado com mestrado em filosofia? Custei um pouco para crer, mas lá encontrei. Na academia de policia, convivem lado a lado a autoridade e o saber. Muitos são egressos da Universidade de Brasília/UNB. Pode-se dizer que a proximidade com a UNB é que propiciou esta formação; certamente que auxiliou, mas devemos lembrar que todas as capitais têm universidades federais e nenhuma apresenta essa excelência na sua polícia.
A Polícia Militar de Brasília é inteligente, uma referência nacional. Mas é uma polícia inteligente porque investiu e investe maciçamente em educação. Desse modo, agindo inteligentemente em busca de educação, a PMDF consegue atrair os melhores profissionais, as melhores pessoas. Além dos policiais militares, civis com grande qualificação e senso ético auxiliam na formação.
A sensação para quem visita pela primeira vez é de pasmo: pensei que estava na Universidade de São Paulo; depois, que precisaria rever meus próprios conceitos acerca da polícia. Para entender a PMDF é preciso esquecer toda a falta de inteligência que vemos espalhada pelo Brasil.
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