Quinta-feira, 9 de janeiro de 2025 | Porto Velho (RO)

×
Gente de Opinião

Vinício Carrilho

Não errar ou fazer a coisa certa?


Precisamos de um dia de Spartacus: o gladiador que desafiou Roma

O que você prefere: “Não errar” ou “fazer a coisa certa”?

Não se trata apenas de jogo de palavras ou de figura de linguagem.

Como bem sabemos, não errar é impossível; fazer a coisa certa é difícil, mas é possível. Então, só não erram os santos. Pois, errar é humano – mas insistir no erro é fazer a coisa errada. O certo seria procurar evitar o erro. E fazemos isso procurando pelas coisas certas.

Diante do horrendo quadro político que vivemos, qual dos dois ensinamentos aplicar?

Vamos do básico: ser honesto é fazer a coisa certa?

Muitos dirão que sim. Mas, a realidade revela o contrário. Afinal, quem elegeu tantos políticos profissionais desonestos? Foram todos os que, bem ou mal, não deram a devida atenção para fazer a coisa certa. Por sua vez, os governantes sem escrúpulos são absurdamente nefastos, porque beneficiam a si e prejudicam a vida de todos.

Neste caso, o certo seria procurar por gente honesta. É difícil, mas do mesmo jeito que tem gente honesta dentro da sua casa, é preciso votar em pessoas de boa índole. E mesmo assim não é tão simples: o candidato honesto financiado por grandes interesses econômicos, quando eleito, irá beneficiar quem? Ou seja, não basta o candidato ser honesto, ele tem de atuar em razão do povo.

Sendo assim, qual a nossa parte no pecado político? Temos, de sobra, o eleitor que se serve do coronelismo (ou serve ao coronelismo) e o coronel que arrebata mais votos com capangas de todos os tipos... então, como deter essa relação? Alguns aceitam um milheiro de tijolos pra terminar o puxadinho, outros barganham cargos com cinco, sete mil de rendimentos. Nem trato aqui da corrupção.

Qual a diferença entre eles: o primeiro, por ser tão pobre, acredita que é o melhor que conseguirá da política; o segundo sonha em ser coronel. São relações de força diferentes, entre o aspone de coronel e a família famélica, mas são duas das pontas de um sistema político forjado para ser opressivo e desonesto para com o povo.

Nosso erro começa na procura de “candidatos amigos” ou naqueles que compram nossos votos (ou a consciência). Nosso erro está em confiar em sistemas nascidos para reprimir e na sua produção de leis, igualmente, desonestas, oportunistas e partidárias. O que precisamos requisitar do povo é participação, exatamente para que haja legitimidade – para além da legalidade e do formalismo. Afinal, mesmo diante de uma relação de poder brutal, o senhor nunca sairá de seu pedestal sem que o servo se mova em sua direção.

Quer fazer a coisa certa? Na próxima eleição, queime todos os que, desde agora, forem desonestos. Assim, fazer a coisa certa é “não errar” de novo na(s) escolha(s): no município, no Estado, no(s) comando(s) da União. No Legislativo e no Executivo.

Nossa mea culpa (a máxima culpa) ainda está presente nos pequenos atos de corrupção que vemos e nada fazemos ou naqueles em que somos os autores. E há muitas formas de se corromper ou de propor a corrupção: o suborno, o troco errado, a mentira, o engano proposital, a embromação profissional, a subtração de coisa alheia, a sonegação fiscal ou de informações, a procura do caminho fácil para se dar bem na vida.

Portanto, toda negação a fazer a coisa certa é uma corrupção. E, por isso, vivemos uma epidemia desmoralizante.

Fazer a coisa certa é combater toda forma e variação de corrupções: grandes e pequenas. Não errar, muitas vezes, é abandonar o caminho fácil (desonesto) e, mesmo sofrendo, procurar pela coisa certa. É certo que os bons e honestos não têm tempo de TV para se apresentarem em igualdade aos desonestos, contudo, ainda assim cabe a obrigação republicana de buscar informação mais qualificada. A república nunca se fez e nem se fará com passividade e inocência.

Cada cidadão ativo, informado, precursor de uma qualidade melhor nas relações sociais e políticas é, por definição, um cidadão-governante. E é destes que precisamos, muito mais do que de políticos profissionais e ainda que sejam honestos. O Estado, corrompido pelos grupos de poder (fração de classe) e por toda sorte de alcoviteiros do capital, não será bom mediador.

Infelizmente, o concurso público também não mede a integridade moral, ideológica e política dos servidores públicos. O que evidencia a capacidade do Poder Econômico em manobrar o Estado a seu serviço. A obrigação do servidor, por seu turno, é atuar de forma contra-hegemônica, agindo pela legalidade sempre; mas, sobretudo, em busca de legitimidade e de justiça diante daqueles que são mais vitimados pelo sistema que os emprega.

É óbvio que a diferença de forças entre o Poder Econômico nacional e internacional e o eleitor (simples mortal e pauperizado pela desinformação política) é gigantesca. E talvez nem devêssemos cobrar tanto daquele que se vende por uma dentadura ou que é açoitado pelo “bico de pena” (como no passado), ou que ainda se encanta pelo noticiário da TV.

Entretanto, há uma classe ou estrato bem remediado (educado formalmente) e que é capaz do discernimento. Assim, se não cobramos tanto dos primeiros, cobremos em dobro da tal classe média. O problema, no entanto, é que a classe média (em que me encontro) costuma ser fascista; esgueira-se pela moralidade pública e privada (ainda arruma casamentos de interesses) a fim de ter suas “boquinhas” de poder; via de regra massacrando – sempre que pode – os mais famélicos. Esta é uma leitura histórica e não xingamento do articulista.

Seja como for, coisa certa é igual à Coisa Pública – se tomarmos por referência que a “res publica”, coisa pública, é a própria República. A Coisa Pública, por sua vez, exige de seus cidadãos fazer a coisa certa. Na República não cabe arrependimento, ou seja, não errar. A República exige o acerto inconteste. Se há o Princípio da Moralidade Pública não podemos, simplesmente, alegar arrependimento pelo Mal Feito.

E isto vale para todos os cidadãos, governantes ou não. Pois a República depende de todos. Ou acertamos, ou a República esvanece. Não há meia culpa (desculpe, vou votar melhor na eleição que vem), não há culpa inteira a ser perdoada (desculpem, errei, mas prometo não cometer o mesmo erro da corrupção).

A República é de todos e, de todos(as), exige o mesmo empenho. Porque é desse empenho que decorrerá o próprio desempenho da República. Por isso, a educação política será fundamental para sairmos do lodo em que estamos atolados. E também por isso não se investe com dignidade em educação para o povo. São doses diferentes, mas cada um de nós carrega sua parcela – portanto, a primeira lição moral de hoje é sair do sofá, para ler algo que enriqueça a cultura política. Afinal, não será na inércia que conseguiremos adquirir a “consciência do usurpado”.

E é por tudo isso que precisamos de um dia de Spartacus: o gladiador que desafiou Roma.

Vinício Carrilho Martinez

Professor da Universidade Federal de São Carlos

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

Gente de OpiniãoQuinta-feira, 9 de janeiro de 2025 | Porto Velho (RO)

VOCÊ PODE GOSTAR

 Toda tese é uma antítese

Toda tese é uma antítese

A ciência que não muda só se repete, na mesmice, na cópia, no óbvio e no mercadológico – e parece inadequado, por definição, falar-se em ciência nes

A Educação Constitucional do Prof. Vinício Carrilho Martinez

A Educação Constitucional do Prof. Vinício Carrilho Martinez

Introdução Neste texto é realizada uma leitura do livro “Educação constitucional: educação pela Constituição de 1988” de autoria do Prof. Dr. Viníci

Todos os golpes são racistas

Todos os golpes são racistas

Todos os golpes no Brasil são racistas.          Sejam grandes ou pequenos, os golpes são racistas.          É a nossa história, da nossa formação

Emancipação e Autonomia

Emancipação e Autonomia

Veremos de modo mais extensivo que entre a emancipação e a autonomia se apresentam realidades e conceitos – igualmente impositivos – que suportam a

Gente de Opinião Quinta-feira, 9 de janeiro de 2025 | Porto Velho (RO)