Segunda-feira, 24 de dezembro de 2012 - 15h34
Além de presentes e das comidas de sempre, penso que o período pode favorecer o pensamento sobre algumas das questões mais importantes para a Humanidade. Para você ter uma ideia de que a tarefa não é tão simples como parece, faça um teste e pergunte a quem está do seu lado o que é a Humanidade: a resposta deve vir na linha de que se trata do conjunto de todas as pessoas. Essa resposta não serve. Serve para iniciar a conversa, pois basta perguntar o que realmente é do interesse geral ou o que é feito em nome de todos.
Pois é, os gregos antigos que nos revelaram a filosofia e o pensamento holístico separavam o mundo entre os próprios gregos e os bárbaros. Não foi a religião que inventou a Humanidade. Cristo em carne e osso pode ter pedido clemência para todos, mas sempre houve a oposição entre filisteus e hebreus – os escolhidos por Deus e os não-convertidos. Muitos séculos depois, os Cruzados católicos ainda tinham em sua mente os puros e os infiéis. E até hoje se pode ofender chamando alguém de filisteu. Na faculdade tive um professor que usava a expressão para se referir aos traidores.
Além disso, um corrupto daqueles que arrepiam só de ouvir o nome também pode se comprazer com esse tipo de resposta simplista. O sujeito enche a boca para dizer do todo, mas ele nem sonha com o alcance e significado. Não dá para falar do conjunto se você surrupia o dinheiro da República. Não há Humanidade sem a preservação da coisa pública, de todos. O pensamento burguês tradicional, desde o início da acumulação primitiva, via com naturalidade seus trabalhadores morrerem de estafa, exaustão, penúria. Como posso falar de Humanidade se exploro os próximos e os distantes desse modo? Será que hoje é tão diferente?
Do século XIX para cá, formou-se um pensamento crítico – dialético/materialista – em que novamente a Humanidade era apenas uma miríade. Não há um sentido comum possível, enquanto o mundo estiver repartido entre opressores e oprimidos. Não há Humanidade se a fortuna de alguns poucos deve-se à miséria de milhões. Aliás, nesta linha de pensamento nem se fala da história ou da própria Humanidade, pois as narrativas contadas pelos opressores é a história dos vencedores, ou seja, uma pré-história. A ideia comum que se tem hoje não retrata o pensamento humano, mas sim de um grupo, uma classe que se impõe às outras, como classe de opressores.
A Humanidade, portanto, só se formou como pensamento a partir do aprofundamento da própria República, como coisa de todos, com forte inspiração socialista – sem que se admitisse a separação entre fortes e fracos –, abolicionista (na Revolução Americana) e, sobretudo, quando os franceses conseguiram pensar o direito para além dos muros da razão do Estado Nacional. Quando isto tudo se fundiu num conjunto marcado por ideais e por ações transformistas, aí sim uma nova complexidade se formou. Esta ideia, aliás, que une Humanidade e complexidade dá conta da dimensão que temos aqui: a Humanidade é um complexo que se tece em conjunto. Esta noção poucas pessoas têm mesmo hoje em dia; no século XXI, marcado pelos direitos planetários, a maioria só consegue ver o norte para seu destino pessoal ou de grupo de referência.
Enfim, a Humanidade nasceu como referência global na Revolução Francesa, com os direitos humanos. Isto ainda equivale a dizer que lutar contra este ideal dos direitos humanos é tão insano quanto lutar contra a Humanidade. Certamente há culturas que se empenharam e se empenham nesta árdua tarefa, como Hitler e Pol Pot (no Camboja), mas é insana sua tarefa, uma vez que, em última instância, implica em combater o pouco que resta de humano no próprio combatente. Outra forma de se visualizar isto é pela história do direito: do menos para o mais, do uno para o coletivo, de poucos para todos, de baixo para cima, de dentro para fora, do simples ao complexo.
Acima de qualquer noção de cultura geral, o sentido de Humanidade é bastante preciso. Para saber o que uma pessoa pensa sobre a Humanidade, pergunte-lhe o que acha dos direitos humanos e aí terá sua resposta. Só a Humanidade conta com esta convergência. Para pensar em Humanidade, não há exceção. A Humanidade se fez socialista/comunista, republicana, iluminista/abolicionista, universalista, holística.
Vinício Carrilho Martinez
Professor Adjunto II da Universidade Federal de Rondônia
Departamento de Ciências Jurídicas
Doutor pela Universidade de São Paulo
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