Domingo, 28 de outubro de 2012 - 05h05
Sempre é chocante se deparar com a morte de crianças e jovens, principalmente se são provocadas por outros adolescentes. Em um desses casos, a delegada disse ter ficado chocada com a frieza, o deboche dos supostos menores assassinos. Teriam atirado contra uma jovem de 15 anos, mesmo depois da entrega do celular e, para a delegada, afirmaram que “a menina recebeu o que merecia”.
É uma loucura sem dúvida, ninguém pode se sentir indiferente a tais casos, sobretudo, porque o cinismo dos jovens é revelador de algo bem mais profundo. Infelizmente, muitos de nós conhecem pessoas extremamente cínicas, sempre prontas para debochar das condições que cercam a vida de outras pessoas. Toda vez que me vejo diante de uma pessoa desse tipo, ao ouvir suas gargalhadas cínicas, como se estivesse querendo encobrir algum crime que ele próprio cometeu, sinto um queda de energia, um baixo-astral, um “vodu”, como se sombras do Mal cobrissem a todos que estão próximos.
A maioria de nós gostaria de nunca mais ver tal situação, passar pelo constrangimento de não poder repreender publicamente, até porque muitos não entenderiam de imediato e quem repreende é que passaria por chato, babaca, mal humorado. Como é que se vai explicar, em ambiente pretensamente descontraído, que o cinismo daquele indivíduo não pode ser considerado de bom humor? Como é que se explica, para pessoas que não querem saber, ao menos naquele momento, a diferença abismal entre ironia e cinismo?
Na verdade, aí sim estaria sendo chato demais, porque estaria considerando a todos como tolos, que não sabem uma diferença óbvia do comportamento humano: a inteligência crítica, irônica, que lança dúvidas sobre questões aparentemente solidificadas; o cínico que despreza a condição humana que não lhe provenha proveitos imediatos.
Será que um cínico desse porte, adulto, escolarizado, de grandes posses econômicas, usufruindo de prestígio social, é realmente diferente dos jovens que matam e dão risadas? Imagine, então, o desastre que esse tipo provoca quando é professor, que lição passa a seus alunos – daria para fazer um conto. Aquelas crianças que atiraram em outras bem poderiam ter sido criadas por este “professor dos cínicos”.
Se este tipo, essa pessoa lhe diz que “todos têm preço” e que ele mesmo está pronto e ávido por corromper a sorte de qualquer um, mesmo que isso implique em falta de remédios para doentes e idosos, seu desprezo pela vida alheia é diferente dos jovens pistoleiros? Se esta pessoa lhe diz que você é igual a ele, porque ninguém é santo, imune aos pecados terrenos e assim mitiga a moral de todos, rebaixando-as no sopé da sua indecência, esta pessoa age com mais honestidade do que os jovens batedores de carteira?
Lembremo-nos da resposta clássica: “se agi mal e errei, isso me fez sentir podre ao pensar nos erros, foi um esforço absoluto para fazer o que não queria e que contrariava a consciência do homem médio; mas, para você, aniquilar a moral, subtrair o direito dos outros, render sua dignidade, é uma atitude corriqueira. Se eu me esforço, quase morrendo, para engolir o sapo, você não consegue ser de outro modo, que não seja corrompendo, apodrecendo as pessoas a sua volta”.
É quase certo que esta pessoa não leu o artigo. Mas, conforta pensar que um dia a maioria de nós saberá evitar a ação corrosiva do cinismo.
Vinício Carrilho Martinez
Professor Adjunto II da Universidade Federal de Rondônia
Departamento de Ciências Jurídicas
Doutor pela Universidade de São Paulo
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