Sábado, 28 de janeiro de 2017 - 14h29
LUIZ LEITE DE OLIVEIRA (*)
Eles olhavam em torno da paisagem virgem verde, naquela clareira aberta na densa floresta amazônica, e aquele rio cor de ouro ali de frente para aquele lugar. Lindo. Os aspectos humanos daquela leva de trabalhadores imigrantes foram captados magistralmente pelos fotógrafos norte americanos Dana B Merril e seu auxiliar André Piles.
Às margens do rio Madeira, numa curva suave à direita, com uma baía do outro lado extremo côncavo e de outro convexa, de grande beleza, na antiga Porto Velho, próxima e sete quilômetros abaixo de Santo Antônio do Rio Madeira a p a r e c e, surpreendentemente, uma nova cidade, num padrão de modernidade inédito.
Getúlio [na capa da revista Life]veio aqui 1940. "Aquatizou" seu hidroavião, subiu o porto, bonachão, sorridente, elegante, deslumbrando-se. O barranco lotado, palmas, tudo lhe surpreende. Lindas senhorinhas c acompanharam a primeira caminhada. à noite participou de coquetel no Internacional Clube
Era uma vez um escritor, Raimundo de Moraes. Ao descrever Porto Velho, na segunda década do século passado, deparando com aquele aglomerado urbano, teve a impressão de estar diante de um cenário, cinematográfico, como se nascesse de um estúdio de Hollywood.
Essa era a impressão de Joaquim Tanajura: “...Quem pisa pela primeira vez em Porto Velho tem a sensação de visualizar uma dessas cidades cinematographicas, construídas, armadas e povoadas por todos os materiaes e por todas as gentes no far west da grande republica do pavilhão estrelado”.
Diziam ainda: “gleba moça, em plena floresta amazonense, chocam naturalmente a retina desavisada de quem olha pela primeira vez...”Um estilo elegante de falar...
Centro de Porto Velho, anos 1950: ruas calçadas de pedras ciclópicas de Santo Antônio, prédios e praças em arquitetura art decó. Orgulho do portovelhense /Foto Pereirinha
Assim era Porto Velho, cidade construída no extremo oeste da Amazônia entre 1907 a 1912, ponto inicial da Estrada de Ferro Madeira-Mamoré, inicialmente administrada por americanos, depois por ingleses. A outra Porto Velho, a municipal, nasceu no entorno desse monumental pátio ferroviário a partir de sua instalação, em 24 de janeiro de 1915, no Governo Jonathas Pedrosa. Na época era então, o menor município do País, ao lado do Santo Antônio (das cachoeiras), o maior do Brasil. A sede do município nasceu no entorno do pátio da ferrovia.
Elogiosa e glamurosa, a comparação apontada por Raimundo de Moraes, comparada como uma cidade far west. Tinha a ver, sim, observando-se que aqui não era desértica a exemplo da Califórnia: havia floresta, muita água, várzea, igarapés.
Exagero dizer? Diferente sim, estranho, mágico, assustador. Assim Porto Velho se erguia.
Quem via a movimentação naquele estranho lugar, no final da primeira década do século passado, tinha a impressão de enxergar uma babel, pois aqui se falavam muitas línguas. Era uma espécie de legião estrangeira e, aquele estranho surgimento sobre um grande aterro, naquela vargem com todo um trabalho feito a partir do levante da morfologia do terreno, que em parte do ano, no inverno amazônico alagava.
E aquele aterro no pátio ferroviário estendia-se na extensão ao longo dos trilhos, mecanicamente a máquinas pesadas, surpreendendo principalmente aos tranquilos beiradeiros da região, ou para os navegantes em barcos a vapor, navios de roda a popa, a hélice. Seus passageiros aportavam em três portos existentes em Porto Velho, na Madeira-Mamoré, ou se direcionavam para a vila de Santo Antônio das cachoeiras, olhando-a com curiosidade e medo.
O pátio ferroviário, a Porto Velho planejada, resplandeciam como uma miragem, algo sobrenatural. Edificações tão altas como o as sumaumeiras emolduravam uma cidade cosmopolita.
Praça Jonathas da Pedrosa, 1995: piso de pedras, portuguesas, luminárias francesas, em reconstituição e restauração do arquiteto Luiz Leite de Oliveira
Assim surgia a cidade planejada, pré-fabricada. As construções eram de portes imensos, como as sumaumeiras e castanheiras. A cidade nascida numa grande clareira, numa várzea sobre aterro, séria, arrojada, era metálica ou de madeira, foi para ser definitiva.
Suas obras, de peças pré-fabricadas eram levantadas por guindastes e montadas como se fossem de brinquedo. Torres, caixas-d’água metálicas e entrecortadas de largas ruas, com trilhos onde deslizavam os “motor car”, cegonhas automóveis, litorinas, trens puxavam vagões.
A cidade era toda iluminada de luz elétrica e possuía telefone, serviços inovadores no Brasil daquele tempo, no início do século 20. Principalmente nos dias festivos, Porto Velho já nascia cosmopolita, pois no 4 de julho comemorava-se a independência dos Estados Unidos, festividade naturalmente promovida pelas empresas norte-americanas.
The Porto Velho Times era o nome do jornal em inglês. Antes de ser Município, com administração Americana ou Inglesa na ferrovia Madeira Mamoré. Uma estrutura de planejamento se estabelecia naquela cidade, feita talvez para funcionar como fábrica de trens.
Quando...
...Aglomeram-se coloridos, homens de todas as nacionalidades, trajados muitos deles, acrescentados de brincos ou argolas e roupas típicas de seus países de origem. Muitas vezes os seus semblantes desses homens, eram tristes, amedrontados, esperançosos, de voltarem, um dia às suas terras. Aqueles homens dentro de suas habilidades, sendo algumas até, escritores ou poetas.
Eles olhavam em torno da paisagem virgem – verde, naquela clareira aberta na densa floresta amazônica, e aquele rio de cor de ouro ali de frente para aquele lugar. Lindo. Os aspectos humanos, daquela leva de trabalhadores imigrantes, tudo isso magistralmente captado pelos fotógrafos norte americanos, Dana B Merril e seu auxiliar André Piles.
Anos depois dessa cena original, Getúlio vem aqui em 1940, aliás aquatiza no seu hidroavião, sobe o porto, bonachão, sorridente, elegante, fica deslumbrado, o barranco lotado, palmas, com tudo que vê parece lhe surpreender.
Instalação do marco divisório, Amazonas e Mato Grosso, 4,5 km da EFMM, 1915.
Lindas senhorinhas porto-velhenses acompanham naquela primeira caminhada. À noite, houve solenidade com coquetel na sede do International Club. E aqui ele prometeu formar um Território Federal, promessa cumprida. Três anos depois, cria-se o Território Federal do Guaporé.
Com a vinda de Getúlio Vargas em Porto Velho, em 1940 a região passou ser auxiliada, a partir da Avenida Divisória agora, acima da espaço da EFMM. Sim, houve um impulso para a criação da estrutura de melhoria de praças e avenidas, prédios públicos e privados, projetados por arquitetos e engenheiros brasileiros.
Ruas de pedras, luminárias de candelabros sustentadas por torres de trilhos...A capital do Território, passava ter um estilo em art decó.
Já nos anos dourados de 1940 e 1950, Porto Velho era uma cidade alegre, de personalidade, com população remanescente da miscigenação nos primeiros anos, embora cá estivessem nordestinos, amazonenses, paraenses, caboclos.Uma população ocupada de dia e que se divertia bastante à noite. Éramos também outra leva de novos pioneiros.
Tanto na EFMM como no governo do território ofereciam-se empregos para todos. Porto Velho que antes, do começo do século 20 parecia-se com uma Philadelphia. Era uma cidade bem brasileira, espécie de um Rio de Janeiro em pequeno tamanho.
Viajando na maionese...e daí?
Uma coisa é certa, nossa Porto Velho também era maravilhosa. Continuava uma cidade cosmopolita, apesar dos dissabores causados pela festa da Funcultural. Acrescente-se que ali ocorreu até a Independência da Madeira-Mamoré: hastearam a bandeira do município, uma farra. Deram continuidade ao crime iniciado pelo ex- prefeito Roberto Sobrinho. Mais uma vez, a célebre praça foi usada como palanque político.
O funk, o rock and roll dominaram, ou melhor, predominaram, pois anteriormente já estavam ali dentro. O que a nossa negritude teve a ver com isso? Nada, foi alijada. Por que não convidaram barbadianos e outras famílias estrangeiras para expor sua cultura? Ficamos ao largo da nossa mais tradicional cultura, enquanto outros ritmos pontificaram, sem nada ter em relação com a nossa cidade.
Esse desrespeito obedeceu ao comando do alegre deputado Garcom, do Iphan e da Funcultural. Ou seja, o novo mandatário municipal, Dr. Hildon caiu numa cilada. Resta à Associação dos Amigos da Madeira-Mamoré (Amma) denunciar tudo novamente ao agora ministro da cultura Roberto Freire. [Segue].
(*) Arquiteto, urbanista, estudou na UNB, trabalha na iniciativa privada. É autor do Projeto de Restauração e Elementos de Integração do Complexo Ferroviário da EFMM e Orla do rio Madeira (avalizou o Tombamento) em 2002. Autor do filme premiado O Delírio – Trilhos e Sonhos – Dreams and Tracks. Pesquisador do Patrimônio Histórico. Autor da proposta de tombamento da Estrada de Ferro Madeira-Mamoré (2005). Pesquisa fotográfica de Ricardo Peres e Luciano dos Santos, e Humberto Banchiere.
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