Atacado pelos índios, Rondon tem seu rosto riscado por uma flecha.
Um oficial grita: “é uma vergonha se o Exército não der um corretivo exemplar àqueles selvagens”. Rondon corta-lhe a palavra:" Quem representa aqui o Exército sou eu, e o Exército não veio aqui para fazer guerras. Os Nambikuára não sabem que a nossa missão é de paz. Se esta terra fosse vossa e alguém viesse roubá-la e, ainda por cima, vos desses tiros, o que é que os senhores fariam apesar de civilizados?"
Mão firme e palavras como estas é que disciplinam a tropa.
Entrevista que o brasileiro Diaí Nambikuára concedeu à jornalista portuguesa Aurora Matos.
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Rondon, fazendo os contatos com as tribos indígenas. |
A atuação do Marechal Cândido Mariano da Silva Rondon, foi fundamental para se revelar aos centros “desenvolvidos” do Brasil uma natureza fantástica, localizada no oco do absurdo mundo amazônico do início do século XX, com árvores gigantescas e retorcidas, rios, lagos, cachoeiras, animais, mitos e lendas que descortinaram uma realidade cultural profunda com temperos e cheiros exóticos e sedutores.
Enganam-se os que associam à Comissão Rondon somente a construção de uma linha telegráfica entre Cuiabá, capital do Mato Grosso e Santo Antônio das Cachoeiras, localidade até então inconveniente para a ocupação humana.
Alguns, ainda seduzidos por pobres polêmicas, buscam diminuir a trajetória de Rondon focando sua atuação como “matador de índios ou protetor de índios”. Afirmaria, com toda a tranquilidade, que esse é o debate pobre e fútil que ridiculariza quem o promove.
Rondon liderou uma expedição épica, fantástica, composta por profissionais de alta categoria e de várias especialidades que desenvolveram estudos na área de geologia, botânica, cartografia, topografia e geografia, além de estudos sobre as nossas fronteiras, produzindo farto material sobre nosso torrão.
Rondon não se contentou em revelar ao mundo somente as “Terras de Rondônia” como afirmou Roquete Pinto. Ele percorreu a maior parte do território nacional em missões que somente os “homens gigantes” enfrentavam.
Rondon se destacou nacional e internacionalmente por suas preocupações com os povos indígenas, que sofriam constantes massacres sem a mínima atuação do Estado em seu socorro.
Como criador e chefe do Serviço de Proteção aos Índios - SPI em 1910, instituição que se transformou em FUNAI em 1967, Fundação Nacional do Índio, Rondon procurou atuar na proteção e defesa dos povos e culturas indígenas.
Rondon é indiscutivelmente o maior sertanista brasileiro de toda a nossa história, é esse o foco que deveríamos investigar, pois sua atuação ainda ecoa sobre todos nós que moramos na porção ocidental do Brasil.
A ampla maioria dos estudos feitos sobre nosso mais conhecido personagem histórico nos informa sobre sua preocupação em preservar a cultura e as tribos indígenas, se em algum momento houve conflitos, precisamos lembrar que Rondon atuou em uma época onde a cultura existente pregava uma lógica desenvolvimentista que elegia os povos indígenas como inimigos ou empecilho ao desenvolvimento urbano e “civilizado” da época.
Em função de seus serviços Rondon foi, por mérito, transformado em um grande herói nacional. Pouquíssimos personagens históricos do Brasil merecem ser chamado de herói, Rondon faz jus ao título.
A idéia tradicional de heroísmo que temos é desvirtuada pela historiografia oficial que construiu personagens perfeitos, completamente virtuosos e comprometidos com os ideais elitistas, brancos, republicanos, cristãos, capitalistas e racistas da época. São os Pedros, Andradas, Izabéis e uma lista interminável de coronéis e latifundiários de outros tempos, Duques e Duquesas, Marquês e Marquesas, Barões e Baronesas, etc. Boa parte dos heróis brasileiros viveram o conforto dos altos escalões e salários, adormecendo em “Berço Esplendido”, pagos com o esforço do escravo negro e índio do Brasil Colonial, Imperial e até o assalariado do período Republicano.
Historicamente, Rondon não pertenceu a esse quadro, pois era descendente de índios e adorava atuar em campo, enfrentando estiagens e tempestades, caminhadas árduas por terrenos desconhecidos montanhosos, encharcados, espinhentos, florestas intocadas com seus mistérios sem fim, a escuridão e o calor medonho com centenas de quilômetros, trabalhos fatigantes, doenças, feras e toda a sorte de insetos, distante do conforto dos escritórios e benefícios oferecidos pelos altos cargos políticos e militares.
Rondon, a exemplo de uma lista imensa de outros sertanistas, demonstrou incrível coragem e determinação ao atuar em regiões tão inóspitas no interior do Brasil, deve ser citado ao lado de Antônio Rolim de Moura Tavares, primeiro governante da Capitania do Mato Grosso. Domingos Sambucet, Engenheiro que iniciou as obras do Real Forte Príncipe da Beira e faleceu de malária. Ricardo Franco de Almeida Serra, Engenheiro que trabalhou no Real Forte do Príncipe da Beira após o falecimento de Sambucet. Francisco de Melo Palheta, bandeirante que introduziu as primeiras mudas de café no Brasil e percorreu o trajeto entre Belém do Pará e Vila Bela da Santíssima Trindade no Mato Grosso em meados do século XVII. Luis de Albuquerque Melo Pereira e Cáceres, quarto Governador da Capitania do Mato Grosso, foi na sua gestão que se construiu o Real Forte Príncipe da Beira. Trabalhadores dos Seringais e da Madeira Mamoré. Apoena Meireles, grande sertanista e indigenista.
Rondon foi um homem que honrou o Brasil e especialmente Rondônia. Eternizou-se por seus grandes feitos. É um personagem que merece ser chamado de “herói da pátria”, sinto orgulho de pisar no solo que o acolheu.
Entre os vários títulos e homenagens, lembro que, Rondon foi indicado para receber o premio Nobel da paz no ano de 1925 por 15 países.
Em seqüência, uma pequena amostra das ações do Marechal Candido Mariano da Silva Rondon
Nos anos de 1892 e 1898 ajudou a construir as linhas telegráficas de Mato Grosso a Goiás, entre Cuiabá e o Araguaia, e uma estrada ligando Cuiabá capital do Mato Grosso a Goiás.
Entre 1900 e 1906 dirigiu a construção de mais uma linha telegráfica, ligando Cuiabá e Corumbá, alcançando as fronteiras do Paraguai e Bolívia.
Em 1919 encontrou as ruínas do Real Forte do Príncipe da Beira, uma das maiores relíquias históricas de Rondônia.
Em 1907, no posto de major do Corpo de Engenheiros Militares, foi nomeado chefe da comissão que deveria construir a linha telegráfica de Cuiabá a Santo Antônio do Madeira, a primeira a alcançar a região amazônica, e que foi denominada “Comissão Rondon”. Seus trabalhos desenvolveram-se de 1907 a 1915.
Em 1910 organizou e passou a dirigir o Serviço de Proteção aos Índios (SPI), criado em 07 de setembro de 1910.
Em 12 de outubro de 1911 inaugurou a estação telegráfica de Vilhena, na fronteira do estado do Mato Grosso e Rondônia.
Em 1914 participou da denominada expedição Roosevelt-Rondon, junto com o ex-presidente dos Estados Unidos da América, Theodore Roosevelt. Realizando novos estudos e descobertas na regiãoDurante o ano de 1914 a Comissão Rondon construiu em oito meses, 372 km de linhas e cinco estações telegráficas: Pimenta Bueno, Presidente Hermes, Presidente Pena (mais tarde Vila de Rondônia, atualmente Ji-Paraná), Jaru e Ariquemes.
Em 1º de janeiro de 1915 inaugurou a estação telegráfica de Santo Antonio do Madeira, concluindo a gigantesca missão que lhe fora conferida.
Em 5 de maio de 1955, data de seu aniversário de 90 anos, recebeu o titulo de Marechal do Exército Brasileiro concedido pelo Congresso Nacional.
Homenageando o velho Marechal, em 17 de fevereiro de 1956, o Território Federal do Guaporé teve seu nome alterado para Território Federal de Rondônia. Faleceu no Rio de Janeiro, aos 92 anos, em 19 de janeiro de 1958.
Que todos nós, cidadãos e cidadãs de Rondônia, possamos honrá-lo como ele nos honrou.
Fonte: Emmanoel Gomes / Professor e Historiador