Quarta-feira, 2 de novembro de 2016 - 05h16
Cidade do Vaticano (RV) - No avião que trouxe o Papa Francisco de Malmö, na Suécia, a Roma, na terça-feira (1º/11), o Pontífice conversou com os jornalistas que o acompanharam nesta 17ª viagem apostólica internacional.
Dentre os temas abordados durante a coletiva estão: imigrantes e refugiados, secularização, laicidade e laicismo, mundanidade espiritual, tráfico de seres humanos e voluntariado na Itália.
Depois de agradecer ao Diretor da Sala de Imprensa da Santa Sé, Greg Burke, pelas boas-vindas, o Papa iniciou a resposta da primeira pergunta, feita por uma jornalista sueca, agradecendo à Suécia por ter acolhido muitos argentinos, chilenos e uruguaios no tempo da ditadura militar. “A Suécia tem uma tradição longa de acolhimento, mas não somente de receber, mas de integrar, procurar moradia, escola e trabalho. Integrar num povo. Dos 9 milhões de habitantes na Suécia, 850 mil são novos suecos, ou seja, imigrantes, refugiados ou seus filhos”, disse Francisco.
Imigração
A seguir, o Papa fez a distinção entre migrante e refugiado. “O migrante deve ser tratado com certas regras porque migrar é um direito, mas é um direito muito regulado. Ao invés, o refugiado vem de uma situação de guerra, angústia, de fome, de uma situação terrível e o status de refugiado precisa de cuidado, de mais trabalho. Também nisso, a Suécia sempre deu um exemplo na organização, no fazer aprender a língua, a cultura e também integrar na cultura. Na integração das culturas, não devemos nos espantar porque a Europa foi formada com uma integração contínua de culturas, várias culturas”, disse o Pontífice.
Sobre o que pensa em relação aos países que fecham as fronteiras, o Papa disse que “na teoria não se pode fechar o coração a um refugiado, mas há também a prudência dos governantes: devem ser muito abertos a recebê-los, mas também fazer o cálculo de como organizá-los, porque um refugiado não se deve somente receber, mas o integrar. Se um país tem uma capacidade de vinte, digamos assim, de integração, faça os vinte. Se outro tem mais, faça mais. Mas sempre com o coração aberto: não é humano fechar as portas, não é humano fechar o coração. Quando um refugiado ou um migrante não se integra, entra num gueto. Uma cultura que não desenvolve em relação com a outra cultura é perigoso. Acredito que o pior conselheiro para os países que fecham as fronteiras seja o medo, e o melhor conselheiro seja a prudência. Conversei com um funcionário do Governo sueco estes dias e ele me falava de algumas dificuldades neste momento, pois chegam muitos e não se tem tempo de organizá-los, encontrar escola, casa, trabalho e aprender a língua. A prudência deve fazer este cálculo. Não acredito que se Suécia diminuir a sua capacidade de acolhimento o fará por egoísmo ou porque perdeu a capacidade; se há algo desse tipo é porque hoje muitos olham para a Suécia porque conhecem o acolhimento, mas para organizá-los não tem tempo necessário para todos.”
Sobre o que pensa em relação à Suécia ter como Primaz da Igreja Luterana uma mulher, o Papa disse que leu a história daquela área onde esteve e viu que existiu uma rainha que ficou viúva três vezes. Então disse: “Esta mulher é forte! Disseram-me que as mulheres suecas são muito fortes e que alguns homens suecos procuram mulheres de outra nacionalidade. Não sei se é verdade isso!”, disse o Pontífice.
Ordenação de mulheres
Sobre a ordenação de mulheres na Igreja Católica, a última palavra foi dada por São João Paulo II, e esta permanece. “Se lemos bem a declaração feita por São João Paulo II, vai naquela linha. Sim. Mas as mulheres podem fazer muitas coisas, melhor que os homens, também no campo dogmático. Para esclarecer, talvez para dar uma clareza, não fazer somente uma referência a um documento: na eclesiologia católica existem duas dimensões para pensá-la. A dimensão petrina que é a dos apóstolos, Pedro e o colégio apostólico que é a pastoral dos bispos, e a dimensão mariana que é a dimensão feminina da Igreja. Isso eu já disse aqui mais de uma vez. Eu me pergunto: Quem é mais importante na teologia e na mística da Igreja, os apóstolos ou Maria, no dia de Pentecostes? É Maria. Digo mais. A Igreja é mulher! É “a” Igreja e não “o” Igreja. E a Igreja esposa Jesus Cristo. É um mistério esponsal. À luz deste mistério se entende o porque dessas duas dimensões: a dimensão petrina, ou seja episcopal, e a dimensão mariana com tudo aquilo que seja a maternidade da Igreja, mas num senso mais profundo. Não existe a Igreja sem esta dimensão feminina, porque ela é feminina.”
Renovação carismática
Um jornalista disse, em espanhol, que houve encontros ecumênicos ricos com as Igrejas tradicionais: ortodoxa, anglicana e agora a luterana, e que soube que na vigília de Pentecostes, do próximo ano, haverá um evento no Circo Massimo, em Roma, para celebrar o 50º aniversário da Renovação Carismática.
O senhor promoveu muitas iniciativas em 2014, talvez a primeira vez para um Papa, com os líderes evangélicos. O que aconteceu com estas iniciativas e o que se espera obter da reunião, do encontro do próximo ano?
“Com estas iniciativas... Eu diria que fiz dois tipos de iniciativas. Uma quando fui a Caserta à Igreja Carismática, e também na mesma linha quando, em Turim, fui à Igreja Valdense. Uma iniciativa de reparação e pedido de perdão porque os católicos, parte da Igreja Católica não se comportou de maneira cristã, não se comportou bem, em relação a eles. Ali se devia pedir perdão e curar uma ferida.
Outra iniciativa foi a do diálogo, e isso em Buenos Aires. Em Buenos Aires, por exemplo, fizemos três encontros no Estádio Luna Park de Buenos Aires que tem a capacidade de acolher 7 mil pessoas. Três encontros com fiéis evangélicos e católicos em linha com a Renovação Carismática, mas também aberta. Encontros que duravam o dia todo: pregava um pastor, um bispo evangélico e pregava um sacerdote católico ou um bispo católico, ou dois e dois, se alternavam. Em dois desses encontros, ou talvez em todos os três, mas em dois com certeza, pregou o Pe. Cantalamessa, pregador da Casa Pontifícia.
Acredito que a coisa venha já dos pontificados precedentes, desde quando eu era em Buenos Aires. E isso nos fez bem. Fizemos também retiros espirituais de três dias com pastores e sacerdotes juntos, com a pregação feita por pastores e um sacerdote ou um bispo. Isso ajudou muito o diálogo, a compreensão, a aproximação, o trabalho, sobretudo o trabalho com os mais carentes. Juntos. E o respeito, o grande respeito. Isso em relação às iniciativas em Buenos Aires e esta agora, aqui em Roma, eu tive várias reuniões com pastores, dois ou três. Alguns vieram dos Estados Unidos e daqui da Europa.
O que você mencionou é a celebração que organiza a Iccrs, a celebração para os 50 anos da Renovação Carismática, que nasceu ecumênica, e por isso será uma celebração ecumênica neste sentido, e se realizará no Circo Massimo. Eu espero, se Deus me der vida, de ir falar ali. Parece-me que dura dois dias, mas ainda não foi organizada. Só sei que se realizará na vigília de Pentecostes, e eu falarei em algum momento.
A propósito de Renovação Carismática e Pentecostais, a palavra pentecostal, a denominação pentecostal hoje é ambígua, porque se refere a muitas coisas que não são iguais, aliás, são opostas. Difundiu-se que se tornou um termo ambíguo. No Brasil, isto é típico, onde se propagou muito.
A Renovação Carismática nasce, e um dos primeiros opositores que houve na Argentina fui eu, porque eu era Provincial dos Jesuítas naquela época, quando iniciou na Argentina, e proibi os Jesuítas de ter contatos com eles. Eu disse publicamente que quando se fazia uma celebração litúrgica era preciso fazer uma coisa litúrgica e não uma escola de samba. Eu disse isso. Hoje, penso o contrário, quando as coisas são bem feitas.
Em Buenos Aires, todos os anos, uma vez por ano, tínhamos na catedral a missa do movimento da Renovação Carismática à qual vinham todos. Eu também experimentei o processo de reconhecimento do bom que a Renovação deu à Igreja. Não podemos nos esquecer da grande figura do Cardeal Suenens, que teve aquela visão profética e ecumênica.”
A visita do presidente venezuelano Maduro
Sobre a visita do presidente venezuelano, Nicolás Maduro, e o início dos colóquios, o Papa explicou que o próprio Presidente lhe pediu uma audiência porque faria uma escala técnica em Roma. A Maduro, reiterou que o diálogo é o único caminho:
“O único caminho para todos os conflitos, eh? Para todos os conflitos! Ou se dialoga ou se grita, mas não há outro caminho. Eu com o coração aposto tudo no diálogo e acredito que seja necessário seguir este caminho”.
Tráfico de seres humanos
O Papa falou ainda do tráfico de seres humanos. “Sempre me comoveu o fato de que Cristo seja continuamente crucificado em seus irmãos mais fracos”, disse o Papa. E citou o trabalho na Argentina de grupos de fiéis e da sociedade civil contra o trabalho escravo de tantos imigrantes latino-americanos, de um indústria que pegou fogo e da morte de crianças. Francisco falou ainda do trabalho das freiras com as mulheres escravas da prostituição e da Missa que uma vez por ano celebrava na Praça da Constituição com essas pessoas e com quem as ajuda. Por fim, elogiou a Itália no campo do voluntariado.
Fonte: rádio Vaticano
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