Sábado, 17 de junho de 2023 - 10h43
"O povo brasileiro
sabe, enfim, que as Forças Armadas não personificam senão as grandes tradições
da Pátria, na paz e na guerra, e os que não confiam nelas é porque têm razões
para desconfiar da Nação [...]. Mas o Exército, que não se compõe de
revolucionários, também não consta de janízaros. [...] É a guarda das
instituições contra a desordem e contra a tirania. É a soberania da Lei armada.
É o baluarte das nossas liberdades orgânicas contra as conspirações que as
ameaçarem; [...] aqui está porque as prevenções palacianas se voltam hoje
contra as Forças Armadas, ao mesmo tempo em que nelas se concentram as esperanças
liberais."
Rui
Barbosa
no artigo "Plano contra a Pátria"- Diário de Notícias -
09 novembro de 1889.
Em dois séculos, os
militares envolveram-se efetivamente na ordem política do País em 1821/1823, 1831,
1889, 1893, 1922, 1924, 1930, 1935, 1937, 1945, 1954, 1955, 1956, 1959, 1961, 1964,
1968. Contudo, essa impressionante sequência de “intervenções” apresenta características
que as classificam como únicas nas históricas relações políticos/militares, do continente.
Assim, embora as crises tenham sido sucessivas, o poder só foi exercido oficialmente
pelos militares brasileiros por pouco tempo: logo após a República e por duas
décadas em sequência à revolução de 1964. Malgrado o autoritarismo que eventualmente
acompanhou os militares na política, nossos soldados sempre se posicionaram em
defesa de uma república liberal e democrática, sem jamais promoverem a ditador
um caudilho fardado. Ressalte-se que nunca houve entre nós um militarismo que
isolasse a classe militar, tornando-a exclusiva nos centros de decisão, como
acontecido em países próximos, e que prevalece até hoje uma clara identidade entre
o pensamento militar e o da sociedade. Floriano Peixoto foi emblemático, em
carta de 1889, ao Coronel João Neiva: “Como liberal, que sou, não posso
querer para o meu País o governo da espada.” Mas foi o General Góes
Monteiro, intelectual e chefe militar da revolução de 1930, quem melhor expressou
as relações entre Forças Armadas e Estado, no caso brasileiro. Dizia ele que é inútil tentar fugir à essa relação
de poderes; “[...] o Estado e as Forças Armadas são dois entes
distintos [...] e sendo o Exército um instrumento essencialmente político, a
consciência coletiva deve-se criar no sentido de se fazer a política do
Exército e não a política no Exército.”
Ocorre que, no regime presidencialista
tupiniquim, governo e Estado têm se confundido promiscuamente na pessoa de seus
chefes. E para que essa correlação de forças se faça de forma legítima e harmônica,
há que se observar que as Forças Armadas, embora se diferenciem do Estado e
detenham o poder das armas (razão corporativa), destinam-se a servir a esse
mesmo Estado (razão legal). Por outro lado, é importante considerar que elas se
diferenciam, também, porque não se admite – como cláusula pétrea da própria
existência de uma força armada – que suas questões internas sejam resolvidas no
nível político estatal. É fundamental para a efetividade da democracia, que o
estamento militar, originariamente pautado em sua conduta pelas noções de
honra, hierarquia e disciplina, resolva suas questões interna corporis,
não pelos laços legais estabelecidos entre o Estado (ou seu núcleo de poder) e o
quadro administrativo, mas sim sem interferências político/partidárias.
Os acontecimentos das
últimas eleições confirmaram a velha dependência do respaldo militar nas crises
políticas do Brasil, assim como manifestou-se com todas as letras a ultrapassada
ojeriza de grande parte das autoridades, intelectuais e imprensa com relação à participação
das Forças Armadas nos assuntos de Estado. Além disso, posições de políticos e
militares naquele momento, acentuaram a fratura do sistema institucional,
consequência do indisfarçável ativismo persecutório do Judiciário, da covarde
omissão do Congresso quanto às suas obrigações constitucionais, e da criminosa indiferença
da grande imprensa, diante de reiterados atentados à democracia, intensificados
a partir do governo anterior.
Não cabe aqui julgar os
chefes militares, nem questionar sua “neutralidade” diante de um processo
eleitoral pouco transparente, conduzido de forma enviesada em relação a um
candidato, por uma justiça eleitoral carregada de ranço ideológico partidário. À
História cabe esse julgamento, pelo que fizeram e deixaram de fazer. Entretanto,
mostrou-se dramática a consequência dessa posição “legalista” adotada pelas
Forças Armadas: assiste-se hoje uma difamação diuturna e sistemática dos comandantes
militares, nas redes sociais, por gente de todas as classes e origens,
alimentada por uma desinformação orquestrada para – irresponsavelmente –
desacreditar o Exército, e neutralizar sua possibilidade de influência
política.
No atual momento geopolítico,
quando o poder militar está ditando mais que nunca a ordem mundial, é
conspiração contra a Pátria cidadãos promoverem o descrédito de suas próprias forças
militares, por meras divergências políticas domésticas. Mesmo porque, os homens
passam, mas um Exército centenário, de relevantes serviços ao País e à
democracia, permanece. Há que se pensar, portanto, em conciliar Estado,
Exército e brasileiros, porque no chamado estado democrático de direito não se
trata de “submeter” a Força Armada ao poder discricionário do governo, isto é, à
figura do Presidente de plantão. A instituição armada é detentora do monopólio
legal da violência do Estado, e não é aconselhável colocá-la à serviço de
políticos de ocasião, que diariamente explicitam suas incompetências quanto às
questões militares, e que sequer distinguem ameaças estratégicas de
possibilidades de emprego das Forças Armadas.
Na
verdade, os atuais líderes políticos estagnaram nos idos da luta do diretório
acadêmico contra o regime militar, e continuam assombrados pelo fantasma do
“golpe fascista”, a ameaça ideal para justificar o autoritarismo ideológico “democrático”
da hora. Por outro lado, o Presidente continua atuando no cenário diplomático
internacional como líder sindical. Alardeando ser capaz de resolver conflitos geopolíticos
na mesa de um bar, e declarando alinhamento de interesses com ditaduras, ele
tem demonstrado não só ignorância quanto à dimensão político/militar do seu
próprio País, mas também desprezo pelos princípios democráticos.
Aos indignados com os
rumos do governo depois das eleições de 2022, lembro que as Forças Armadas
ainda são as únicas instituições de Estado dotadas de poderes constitucionais,
e capacitadas legalmente para se contraporem aos atentados à democracia. À
gente das armas, exorto rever os fundamentos de seus deveres como agentes
políticos da defesa dos poderes constitucionais, os quais – que fique bem claro
– não incluem intervenção militar. E alerto: negligenciar a missão
constitucional de garantia da lei e da ordem (jurídica, inclusive), atrás do
escudo do silêncio, ou na comodidade da inação, é sim furtar-se das
responsabilidades herdadas das heroicas lutas pela democracia dos nossos
antepassados. Pois, como disse Benjamim Constant: "O militar não pode
nunca ser instrumento servil e complacente, responsável por obediência passiva,
inconsciente, que avilta seu caráter, destrói seu incentivo e degrada sua
moral. Quem se omite, indiretamente se associa”.
Gen Marco Aurélio
Vieira
Foi Comandante da
Brigada de Operações Especiais e da Brigada de Infantaria Paraquedista
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