Quarta-feira, 22 de novembro de 2023 - 10h11
Foi noticiado em 2018 que o juiz
Sami Storch, que atua na Bahia, fez uso da Constelação familiar para resolver
conflitos. Lembram desse assunto? Ou seja, 5 anos atrás o juiz por meio da
técnica de Constelação conseguiu mostrar o que a filha realmente buscava e que
não tinha correlação com os alimentos propriamente dito e deixar claro os
sentimentos do pai. Resultado, a moça desistiu do processo e os dois se
abraçaram e se emocionaram.
A Constelação familiar trata-se de
uma técnica terapêutica, fruto de anos de observação, em que as pessoas, que
desejam atuar com ela, devem fazer um trabalho interno para poder olhar com
isenção o que se apresenta a sua frente. É preciso ter vivenciado o caminho
para conduzir alguém; assim como fez o juiz e outros profissionais.
Além disso, a Constelação é um
método que visa identificar a razão de um conflito estudando a base dos
sistemas de relações, observando determinado indivíduo e suas interações para
conhecer a origem, muitas vezes oculta, de uma questão e resolvê-la; muitas
vezes trazendo paz aos envolvidos.
Recentemente, a - Associação
Brasileira de Constelações Sistêmicas (ABC Sistemas) com o objetivo de promover
a regularização da adoção da Constelação no contexto dos métodos consensuais de
resolução de conflitos entrou com um pedido no Conselho Nacional de Justiça
(CNJ). No último dia 17 de outubro, teve início o processo de análise da
Constelação familiar ser utilizada no âmbito no judiciário. Sendo o cenário o
seguinte até então: voto do relator conselheiro contra o uso da técnica porque,
na visão dele, a prática utiliza um estereótipo de família imutável e misógino
baseado em leis imutáveis trazendo o risco de uma revitimização; além de não
possuir respaldo científico, não podendo ser adotado como política pública.
Atualmente o tema está com vista para a conselheira Sanchotene.
A abordagem deste assunto nos leva
por um caminho que vale muito a pena refletir. O cenário jurídico é milenar,
existe a milênios antes de Cristo e a Constelação, surgiu nos anos de 1980, na
Alemanha, sob a batuta de Bert Hellinger, que defendia a existência de um
inconsciente familiar que tem grande importância e afetação na vida dos
indivíduos e para as organizações. Por isso é bastante compreensível o desafio
que o CNJ possui para examinar um tema tão novo com lentes antigas, formais e
altamente “estruturadas” podendo chegar a uma inflexibilidade que causa a
famosa morosidade.
Não obstante, sabemos que o Direito
é uma ciência eminentemente social, cujo foco são as relações humanas, as
relações sociais. Muitas questões, que são levadas ao Judiciário, constatam-se
que são questões relacionadas a aspectos familiares relativos às
disfuncionalidades na ordem das famílias, na hierarquia das famílias e no
pertencimento. Por exemplo, filhos cuidados por avós viram irmãos de seus pais
e isso causa desordem.
Outro aspecto importante estudado
na Constelação familiar é o pertencimento, nascemos então pertencemos a uma
família e a um lugar. Por vezes nota-se uma desordem de pertencimento. A
exemplo do caso dos excluídos, abortos espontâneos ou não, há as exclusões
sociais, como também os suicidas, pessoas deficientes etc.
Papel do
constelador
Há uma doutrina vasta sobre o tema
Constelação familiar e quem domina a técnica sabe que não há um estereótipo de
família imutável e misógino baseado em leis imutáveis nesta prática. Muito pelo
contrário, a prática é aberta e só no desenvolvimento dela é que o cenário de
cada um vai se formando e emergindo para trazer a compreensão.
Tal ferramenta traz clareza de que é o ser humano que tem dentro de si tudo o que precisa para os seus processos de transformação, tomada de consciência e cura, devendo responsabilizar-se por seu processo de desenvolvimento. Ou seja, é algo mais sofisticado que aplicar a decisão de um terceiro (juiz) a determinado caso concreto envolvendo determinadas pessoas.
A Constelação está a serviço da conciliação, da paz e
do equilíbrio entre o dar e o receber. Ela ajuda a restabelecer o fluxo da
vida, por meio do assentimento que é o SIM da alma para algo; e de trabalhar os
emaranhados que a maioria das pessoas e famílias possuem.
Um exemplo é o caso de pessoas que
não sabem mais se amam ou odeiam seu pai ou sua mãe, em razão de uma ação ou
omissão. Com isso prejudicam-se as relações familiares.
Um emaranhado pode se arrastar por
gerações, prejudicando os descendentes. Sabemos que as crianças são o reflexo
dos adultos. E, mesmo sem intenção, por vezes, transmite-se aos filhos
comportamentos que eles irão reproduzir sem refletir a respeito. Assim, é
criado um ciclo de ações prejudiciais, os emaranhamentos.
Mesmo nas organizações acontecem
esses emaranhados e podemos trabalhar por meio das constelações para trazer
clareza e luz às relações melhorando o ambiente e a produtividade
organizacional.
A Constelação, como ferramenta de
apoio, não se restringe somente ao âmbito do Judiciário, pois aplica-se também
no âmbito educacional, de saúde e como disse acima ao sistema corporativo.
Na saúde pública, a Constelação
familiar foi indicada pela portaria 702, do Ministério da Saúde, de 2018, sendo
que o SUS já realizou mais de 24 mil sessões de constelações familiares no
país.Explique-se também que a postura exigida para um bom constelador demanda
saber ouvir, estimular a pessoa a emergir suas questões e as soluções,
presença, acolhimento, ter total respeito ao contexto das pessoas, conexão,
atenção, linguagem respeitosa.
Haja vista os grandes problemas do
Judiciário e sua não efetividade em muitos casos, a sociedade já entendeu a
importância da conciliação, mediação e arbitragem como técnicas eficazes para a
solução de conflitos, pois as mesmas fortalecem a confiança não só pela
celeridade com que resolvem a demanda, mas também pelo estado emocional de paz
que envolve os participantes. Assim sendo, por que não colocar a serviço de
quem necessita também a ferramenta de Constelação familiar?
Vamos dar uma chance às
constelações? Assisti a várias e várias constelações, passei por elas na minha
caminhada e não testemunhei cenários de piora para as pessoas mas sim cenários
de maior compreensão sobre padrões familiares ,nem sempre saudáveis, que se
repetem de geração em geração e maior leveza e paz interna para os que
vivenciam essa prática.
* por
Viviane Gago, advogada e consteladora pelo Instituto de Psiquiatria da USP
(IPQ/USP) com parceria do Instituto Evoluir e ProSer e facilitadora pela
Viviane Gago Desenvolvimento Humano. Mais informações no site
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