Segunda-feira, 27 de janeiro de 2025 | Porto Velho (RO)

×
Gente de Opinião

Crônica

A magia da plateia


A magia da plateia - Gente de Opinião

O comportamento do público/plateia varia conforme o tipo de espetáculo − do futebol às igrejas, do show de cantor popular ao teatro, do erudito ao brega, do circo à praça − a participação do público é diferenciada e exerce um efeito nem sempre positivo. O discurso, a palavra religiosa, uma partida de um jogo qualquer, o show, o espetáculo, a peça teatral e até mesmo o comício, precisam de um ponto de apoio da plateia, uma espécie de “bate e volta”, ou seja, alguma coisa da apresentação pública precisa ser simpática, para despertar a empatia da plateia, o efeito magia.

Um candidato a prefeito de uma cidade do interior de Minas Gerais, mandou armar um palanque para um comício, às margens de um rio da cidade, onde havia um extenso gramado: − Quando eu vejo essa grama verde, eu me lembro de minha mãe. Um malandro da plateia perguntou em voz alta: − Ela era égua? E o político respondeu sem titubear: − Era não, filho da puta, era lavadeira.

Impossível analisar uma plateia a partir de uma única pessoa, embora o efeito liderança possa se sobressair e influenciar o comportamento dos demais, numa espécie de contágio, porém o normal é o conjunto, o grupo funcionar como vibração estimulante do entorno da glândula pineal coletiva, a abracadabra responsável pela magia do retorno, em forma de aplausos e gritos de incentivo. Nada mais importante para o pacto, para a interação cerebral do que aplausos seguidos de: Evoé, bravo, valeu, viva, mengoool, é isso aí, parabéns, bis bis, sensacional, Sandy! Sandy! Sandy!

O público de um espetáculo de futebol tem um comportamento diferenciado, porque já possui o rótulo “torcida”, o mesmo acontece com as chamadas “macacas de auditório”, que já saem de casa com o propósito de “causar”, durante um show. Para esses públicos, o efeito magia já vem embutido na exibição, exercendo um certo entusiasmo, no time ou no artista que está se apresentando. A frieza do botão “curtir” não influencia do mesmo modo, daí porque as “lives” dos cantores, em tempos de pandemia, são tão sem graça e os jogos sem público acontecem sem o mínimo entusiasmo. Imaginem a algazarra, se houvesse público, na vitória do Bayern sobre o Barcelona por 8X2: Cabróns, cagóns, gilipolhas, mételo por el culo, em espanhol, ou em catalão: mare meva, ostres, caram, gep de burra, cagadubtes, escalfabraguetes, enquanto os alemães retrucariam: tor, eigentor schiribarças, tot, tor, tor, tor, tor, tor, tor.

Na cidade de Feira de Santana,  interior da Bahia, a Orquestra Sinfônica da UFBA fazia uma apresentação rara, tocando em praça pública, ao término de uma composição de Mozart, um espectador se levantou e em voz alta pediu: − Maestro, num dava pra tocar uma sofrência, pra nóis? O maestro tentou sorrir, mas não evitou as palavras que lhe brotaram da boca, em voz baixa: puta que pariu, era só o que me faltava. O maestro respondeu com Elisa de Beethoven, o tabaréu esperou educadamente a orquestra terminar e retrucou: num sabe tocar sofrência, mas sabe a musiquinha do caminhão que entrega gás, eheheheh. 

A grande diferença do teatro, do circo, da praça, para o cinema é a magia do aplauso instantâneo, a cara de felicidade da trupe com a satisfação do público. A magia da plateia é decisiva no sucesso, na continuidade de um espetáculo presencial, seja ele qual for.

Por outro lado o sucesso das apresentações online, via vídeos postados nas mídias sociais, vem causando efeitos surpreendentes, modificando o estudo da magia presencial, ou seja o virtual interferindo no físico, nestes casos ocorre claramente o que os psicólogos chamam de fator humano: geralmente é um personagem “carente de tudo”, que precisa fazer sucesso para sobreviver, estabelecendo uma empatia instantânea com o público internético. Lembram da caneta azul, azul caneta, caneta azul tá marcada com minha letra? Nestes casos, quase sempre, o sucesso é singular. Caneta preta, caneta preta, escrevi meu nome nas suas tetas. Black pens matter.  Online ou não, o sucesso é proporcional a magia da interação, à qualidade da interpretação e ao tempo de permanência na memória coletiva, além do apoio da TV. Nossa, nossa, assim você me mata, ai se eu te pego, ai, ai, ai, se eu te pego. 

Gente de OpiniãoSegunda-feira, 27 de janeiro de 2025 | Porto Velho (RO)

VOCÊ PODE GOSTAR

Sustança

Sustança

O Brasil é, realmente, um país onde as diferenças regionais são gritantes. Com exceção do que existe em comum em todo o Território Nacional, como o

Por que os brasileiros mudaram de opinião

Por que os brasileiros mudaram de opinião

Tinha vinte e poucos anos quando a aldrava da porta da casa paterna soou três rijas pancadas. Era casal com sotaque carioca. Meu pai recebe-os de br

O primeiro livro de Júlio Dinis

O primeiro livro de Júlio Dinis

Recentemente narrei o grande amor de Júlio Dinis, pela menina Henriqueta, companheira de folguedo do escritor, e pupila do Senhor Reitor de Grijó (G

A ambiguidade criativa

A ambiguidade criativa

Certa vez, padre Vitor Ugo, que já não era padre, mas dizia que uma vez padre, sempre padre, durante uma exposição do VII Salão de Artes Plásticas d

Gente de Opinião Segunda-feira, 27 de janeiro de 2025 | Porto Velho (RO)