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Crônica

A Magia da TV Aberta


Ilustração: Viriato Moura - Gente de Opinião
Ilustração: Viriato Moura

A TV começou a ser pensada na década de 1920, foi aperfeiçoada na década seguinte, teve a sua patente registrada pelos americanos em 1939, mas o primeiro aparelho era de uma empresa alemã, a Telefunken. Continuou se aperfeiçoando, ganhando novas versões tecnológicas, mas só a partir de 1950 foi apresentada ao Brasil, pelas mãos de Assis Chateaubriand, como “um rádio com imagens”, para ser uma nova opção democrática de diversão, a síntese do rádio, do cinema, do teatro, dos espetáculos burgueses, sem contar que era mais um espaço de ação da imprensa. A vida não imita a arte. Imita um programa ruim de televisão (Leminsky). O poeta tá na Disney, meu parça.

Desde o seu nascimento que a TV sofre críticas, principalmente da classe mais esclarecida, daqueles que viam o aparelhinho como máquina de fazer loucos: era desperdício do tempo, que deveria ser dedicado ao aprimoramento do conhecimento, ao estudo das ciências e das artes como um todo. O Barão de Itararé dizia que a televisão é a maior maravilha da ciência a serviço da imbecilidade humana.

 

TV aberta é mágica por cativar todo tipo de público, do infantil ao jovem, do adulto ao senil, mas desde que passou a ser instrumento da política partidária, palanque de religiosos e formadora tendenciosa de opiniões, passou a dividir suas características entre a magia branca e a negra, detentora dos 72 anjos e demônios, dados pelo sistema, mas usados maleficamente para perpetuação do egocentrismo empresarial e religioso. Xô bicho feio!

 

Dom Raphael vai dar a bronca e vai ser contra o Direito de Nascer. Texto importado e adaptado, de Cuba, bateu todos os recordes de audiência, nos primórdios da TV. Mano, o papai tá on. Gata só brota, porque o pai tá on!

Considerada por muitos a caixa de pandora tecnológica, ao longo dos primeiros anos, seu uso excessivo foi apontado por estudiosos como causa de algumas disfunções e doenças. Hoje esse leque de desvios, segundo as igrejas católica e evangélicas, se estende ao homossexualismo, ao lesbianismo, et cetera e tal, exatamente por ser a TV, via programas e novelas, uma forte influenciadora de costumes, práticas e tendências nem sempre boas. Para Steve Jobs as pessoas ligam a televisão quando querem desligar o cérebro.

 

Tô louco! tô louco! tô louco! Silvio Santos, ao vivo, num programa pra crianças, desafiou uma menina, com cerca de 12 anos, para que lhe fizesse uma pergunta: − Silvio, qual a diferença de um bambu, um poste e uma mulher? Ele pensou um pouco e respondeu: − Não sei. A menina então disse: − O poste dá luz em cima, a mulher dá luz em baixo. E o Silvio, todo sorridente, insistiu:  Ah, ah, ah aiii, e o bambu? A menina concluiu, para felicidade geral da nação: − o bambu você enfia no cu. Este vídeo até hoje reverbera no Youtube.

 

Também num programa do Silvio Santos, a garota Maísa, que o ajudava na apresentação, soltou um pum ao vivo, seguido de um comentário: − todo mundo solta pum, ninguém é tapado; − Ah ah ah aiii, mas que menina inteligente, comentou Silvio. Ele tinha um crush por ela. Que sapão!

 

As gafes se multiplicam e o festival de besteiras só aumenta o repertório, na TV ao vivo: Hebe Camargo, Silvio Santos, Flávio Cavalcante, Raul Gil, Gugu Liberato, Chacrinha e tantos outros, foram protagonistas. Hoje quem dá as cartas, liderando o festival de besteiras que assola a TV, é o Faustão, seguido de perto pelo Ratinho, Siqueira e outros. Fum! Você fede a maconha!

 

No SBT, Hebe bateu recordes de audiência, inclusive o TV Pirata da rede Globo, quando entrevistava a competentíssima Xuxa: − ô que gracinha essa menina. O que você acha da vida, minha filha? − Ilarilarilariê (ô, ô, ô), sou Pelé e me declaro black lives matter. Ele é meu bife.

 

Neila Medeiros, de um jornal do SBT, ao encerrar um noticiário (2014), mandou um beijinho para um suposto telespectador de nome Tômas Turbando. − Tô mentindo Terta? − Verdade, Pantaleão. Zelda Melo já foi chamada por William Waack, durante apresentação de um jornal da Globo, de Zelda Merda.

A TV trouxe para dentro de casa ou pela TV vizinho, oportunidades raras, como conhecer o visual dos artistas do rádio, antes privilégio das revistas especializadas, assistir novelas, filmes, antes restritos ao cinema, e a torcer pelo seu time de futebol, via vídeo tape e ao vivo. Aliás, nas décadas de 1970/1980 era comum jovens torcedores se juntarem na sala da TV vizinho para assistirem jogos, tomando Cuba-libre, HI-FI e saboreando sacanagem, que nada mais era do que palitinhos, com rodelas de salsicha, pedaços de queijo e de azeitona, espetados num repolho ou num melão, dando um visual esférico atraente.  

 

Na década de 1960 as concessões de TVs se espalharam por quase todos os estados brasileiros.  A inauguração de Brasília coincidiu com o surgimento da TV Nacional. A TV Globo surgiu em 1965, concessão dada por Juscelino Kubitschek, mas só operacionalizada durante o regime militar. Em 1990, chegou ao Brasil a TV paga, atendendo as exigências dos intelectuais e dos que cobravam programação diversificada, direcionada ao público que podia pagar. A qualidade subiu, mas o besteirol permanece, tanto na TV aberta, quanto na paga, são tantos canais que o mágico escondeu a maioria na cartola, é a “Tv-que-ninguém-vê”! Perdeu Playboy, o implícito tá no explicito. É gado demais!

 

A TV aberta, apesar das críticas, teve certa importância, na vida artístico-cultural do país, lembro dos festivais de música popular da TV Record, na década de 1960, onde praticamente surgiram e se destacaram nomes como Chico Buarque, Vandré, Edu Lobo, Caetano, Gil, Rita Lee, MPB4, Gal Costa, Elis Regina  e tantos outros. Na dramaturgia a memória registra Jorge Amado, Ariano Suassuna, Janete Clair, Dias Gomes, João Cabral de Melo Neto e muitos outros.

 

A TV aberta vem sofrendo um processo de modificação que começou com o advento da internet, do celular, das mídias sociais, da smartv e dos inúmeros apps. O futuro dirá quem será on no novo formato. Pois dir-se-á que ela hoje acena por uma altíssima antena à cruz que Anchieta plantou (Trecho do hino da TV - 1950). Oi, sumida! Manda nudes.

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