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Crônica

D. Pedro V: o rei da caixinha verde


Humberto Pinho da Silva  - Gente de Opinião
Humberto Pinho da Silva

Não é a primeira vez que me refiro à figura de D. Pedro V, Rei cultíssimo e de elevada sensibilidade.

Mas só depois de se ter descoberto, na livraria do Paço Ducal de Vila Viçosa, o famoso " Livro Negro", que se pensava ter sido destruído pelo seu irmão, o Rei D. Luís I, é que se conheceu, verdadeiramente, o carácter desse jovem Rei, semelhante a D. Pedro II, Imperador do Brasil, ambos amigos e admiradores de Alexandre Herculano.

                Durante os curtos anos que dirigiu a Nação, inaugurou-se os primeiros quilómetros da linha-férrea do Norte – 1856 (Lisboa - Porto); fundou-se o Curso Superior de Letras (1859); lançaram-se as primeiras linhas telegráficas (1855); e deu-se início ao primeiro cabo submarino, entre Lisboa, Açores e Estados Unidos.

                Mas, a meu ver, o que é merecedor e de se exaltar, foi o cuidado de se manter sempre atualizado, e principalmente, o esforço que realizou em defesa da liberdade, que para ele, era:

                 "O sentimento mais nobre do homem."

 

                         (Escritos de el-rei D. Pedro V, vol 2º. pág.170)

 

                 A 24 de março de 1856, D. Pedro V escreveu no seu diário:

 

"...Não sou tão tolo que goste de meu ofício, mas hei de trabalhar por ele com zelo e com perseverança, e fazer bem e florescer um pouco a moralidade."

                                        (Lembranças, fól.141 v) 

 

                  Os escrúpulos extremados, e o amor à verdade, levaram-no a tomar atitude inédita na política.

Diz Oliveira Martins, que: " Tinha em tanta conta os que o rodeavam, cria tanto neles, que mandou pôr à porta do seu palácio, uma caixa verde, cuja chave guardava, para que o seu povo pudesse falar-lhe com franqueza, queixasse e acusar os crimes dos governantes."

Dizem que foi obrigado a retirá-la, porque o povo ou os políticos (?) lançavam em lugar de pedidos e queixas, insultos e palavras incongruentes.

É bem verdade – quando se pretende dar voz a quem a não tem, os "democratas" não gostam...

Aos dez anos D. Pedro V teve como mestre D. Maria Carolina Mishisch,, seguiu-se Martins Basto. Aprende latim e com seis meses de estudo, traduz: Eutrópio e Fedro; aos doze, consegue verter para língua pátria, textos de: Virgílio, Tito Lívio e Cícero.

Aprende, também música, pintura, filosofia e línguas vivas. Era admirador de Alexandre Herculano, que foi seu preceptor.

 

" O Papá deu-me conta duma interessante conversa que tivera com A.                                 

Herculano."

 

                              (10 de outubro de 1856 -Volume VI, fól. 65)

 

Aos dezassete anos (1854) viaja para Inglaterra, Bélgica, Alemanha, França, e no ano seguinte, Itália e Suíça.

Não viaja para se divertir, mas para aprender e contactar políticos e homens da cultura.

Lê imenso: livros e revistas generalistas, mas mormente, de economia, para se manter sempre atual.

Era de sensibilidade delicada. Quando o pai (Papá - como escreveu no diário) adoecia, ficava grande parte do dia junto do leito, lendo-lhe artigos publicados nos jornais:

 

" Estive no quarto do Papá, que está doente. Estive conversando com ele, e lendo-lhe artigos da Revue des Deux Mondes."

 

                    (Diário de D. Pedro V. - 28 de novembro de 1855)

 

Durante a epidemia de Cólera (1855-56) que se espalhou em Lisboa, seguido da Febre-amarela (esta iniciou-se no Porto,) parte da população da cidade foge para a província. D. Pedro V não só não recusa abandonar a Capital, como visita hospitais, entra nas enfermarias, e conversa, afetuosamente, com doentes.

Fiz Damião Peres: " Quando deixavam Lisboa, aos cardumes, todos quantos fazê-lo podiam, o Rei não desertou, como é sabido. Podia, porém, e já não era pouco, limitar-se a permanecer na capital, dando exemplo de indefetível civismo; mas não, pois inúmeras vezes afrontando corajosamente os riscos de contágio, visitou os hospitais, detendo-se à cabeceira dos doentes e levando-lhes com o consolo da sua presença, o doce alívio duma animadora palavra."

Sabendo que muitas crianças ficavam órfãs, auxilia-as, correndo as despesas do seu próprio bolso.

Alves Mendes, em: "Orações e Discursos", na "Oração Fúnebre". Proferido nas exéquias do Rei D. Pedro V, a 11 de dezembro de 1861. Mandada celebrar pela Câmara Municipal da Figueira da Foz", afirma a determinado passo:

“(...) E em balde alguém o aconselha para que mudasse de sistema. Não! Dizia ele a seus ministros: diante da crise que dizima meus povos, não será meu coração que descansa, nem meu braço que deixe de trabalhar!..."

A 29 de Setembro de 1861, o rei desloca-se a Vila Viçosa, com os infantes D. Fernando e D. Augusto. Após curtíssima estadia percorre várias localidades, sendo recebido acaloradamente pelo povo.

Chega a Lisboa, senta-se mal, vindo a falecer decorridos dias (11 de novembro de 1861, pelas 19H00).

Existe no Porto, na Praça da Batalha, estátua de bronze, com três metros de altura, e peso de noventa arrobas. O monumento tem a legenda, em bronze: " Os artistas portuenses por gratidão a D. Pedro V, em 1862.

Foi oferecido á Sociedade Portuguesa de Beneficência do Rio de Janeiro, réplica do monumento, em prata, com o peso de nove quilos.

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