Terça-feira, 23 de fevereiro de 2021 - 09h16
Por
proposta de ilustre deputado, Eça de Queirós, vai ser transladado do jazigo de
família, para o Panteão Nacional. Honra merecidíssima, que só peca por tardia.
Agora
pergunto: se o romancista pudesse ser consultado, o que diria? Ele, que sempre
foi tão avesso à sociedade lisboeta, e severo critico dos políticos de seu
tempo.
A transladação irá efectuar-se após 120 anos
da sua morte. Porquê?
Talvez
a explicação seja pelo facto dos filhos e esposa, do romancista, terem
professado ideologia diferente ao regime da sua época.
Para
exemplificar o que disse, lembro, que no dia seguinte ao nascimento de Dona
Maria das Dores – neta de Eça, – seu tio, dirigiu-se ao registo Civil, de
chapéu.
Lembraram-lhe
que devia descobrir-se, em respeito à estátua da República, que existia na
sala.
Respondeu com sobranceria: “ Não
conheço essa senhora!”
Foi
expulso da repartição, e a menina só foi registada, a 19 de Julho de 1918. Por
essa e outras atitudes semelhantes, dos filhos, principalmente do José Maria,
Dona Emília, mulher de Eça, foi avisada: se a família não quisesse servir o
regime, o Estado seria obrigado a retirar-lhe a pensão, que tinha direito, como
viúva de diplomata.
A
família não gostou da advertência, e expatriou-se, juntamente com outros
membros da família do Conde de Resende.
Seria
essa a razão, do romancista, não ter ido, até agora, para o Panteão?
Não
sei. Certo é que 120 anos depois da sua morte, ser-lhe-á feito justiça.
Presentemente
repousa junto de “Serra”, que imortalizou, no romance: “A Cidade e as Serras”,
que Fidelino de Figueiredo admirava e Dona Maria das Dores – Marquesa de
Ficalho, – conheceu quando leu as obras do avô.
Os
livros de Eça, admiráveis no estilo, encontram-se salpicados de passagens de
mau gosto moral. Talvez porque assim queriam os editores.
Sua
neta, a Marquesa de Ficalho confessa: que não teve coragem de terminar “ O
Crime de Padre Amaro”, e acrescenta na entrevista concedida ao: “Jornal de
Gaia” – 19/Set. / 2003:
“
Sempre fui um bocado respeitadora, pelo menos numas coisas, enquanto noutras
talvez não seja.”
Dona
Emília Cabral – neta do escritor, – declarou numa entrevista que realizei, que
o avô não queria que os filhos, mormente a Maria, lessem os romances.
Em
carta dirigida a Rodrigues de Freitas, Eça, escrevia: “ Os meus romances
importam pouco: está claro que são medíocres; o que importa é o triunfo do
Realismo.”
Estou
de acordo que o lugar de Eça é o Panteão, ao lado de outros ilustres (serão
todos ilustres?); mas arrancá-lo, 120 anos depois, da sepultura de família, da
região que tanto amava e sempre foi acarinhado, não será violência a ele, e à
terra que o acolheu?
Depois,
o grande Camilo – Mestre dos Mestres, – segundo António Feliciano de Castilho e
Vasco Botelho de Amaral, e que o grande Unamuno, considerou “ O Amor de
Perdição” um dos livros fundamentais da Literatura Ibérica, não se
encontra, igualmente, esquecido na capela de amigo, na cidade do Porto?
E
tantos e tantos ilustres figuras, de maior grandeza, não estão “abandonados”
nos cemitérios deste Portugal?
A
homenagem é bonita e justa, mas chega demasiadamente tarde.
Deixem
Eça em paz, na sua “Serra”, na tranquilidade do cemitério de Santa Cruz do
Douro, junto da querida filha Maria ,que tanto amava, do neto D. Manuel de
Castro e de Dona Maria da Graça Salemo. Será essa – a meu ver, – a maior
homenagem que se pode fazer ao ilustre escritor e diplomata.
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