Sexta-feira, 23 de outubro de 2020 - 16h45
Muitos são os brasileiros,
principalmente políticos, que se não cansam de exaltar as vantagens do regime
democrático. Alguns o fazem até com certo grau de emoção que chega a contagiar
circunstantes. E não é sem razão. A democracia é a melhor forma de governo. Nisso
concordamos. Mas, convenhamos, será que estamos construindo a democracia que
desejamos? Será que um dia vamos conseguir conciliar um projeto sério de
desenvolvimento com o regime que temos, infectado pelo vírus da corrupção que
grassa nos quatro cantos do país, como erva daninha? Como manter e ampliar
princípios de decência, fundados na mais ampla representação da sociedade
politicamente organizada, em estruturas arcaicas, carcomidas pela podridão de
acordos espúrios, que subvertem e fere de morte o ideário da Constituição e da
nacionalidade, maculado pela apropriação criminosa de recursos públicos? Até
quando teremos que conviver com condutas incompatíveis com a ética no manuseio
da coisa pública?
O Brasil é um dos trinta
e oito países onde o voto ainda é obrigatório, e está entre os dezessete que
aplica algum tipo de punição a quem deixar de votar. E o que dizer do cidadão
que deixar de atender a convocação para trabalhar nas eleições? Mesmo em tempos
de pandemia, e justificando a ausência por conviver com pessoas consideradas
vulneráveis ao vírus da Covid-19, corre o sério risco de pagar uma multa. Mas é
assim que as coisas funcionam por aqui. E ponto final.
Dias atrás, um senador
foi apanhado pela Policia Federal, com notas de reais na cueca. Como punição,
colegas o presentearam com trinta dias de licença remunerada. É mole? A
competente Policia Federal de Rondônia filmou um parlamentar recebendo propina.
E o que aconteceu? Até agora, nada. Em um país sério, ele já teria sido
afastando de suas funções. Isso para dizer o mínimo. Mas, no Brasil, não! Por
quê? Simples! Vivemos no país do jeitinho, do corporativismo, do empurra com a
barriga, do toma-lá-dá-cá, onde muitos confundem imunidade parlamentar com
impunidade penal, quando o bom-senso manda que os fatos sejam devidamente
apurados e os considerados culpados rigorosamente punidos, até para que sirvam
de exemplos.
Desgraçadamente, o que
se tem visto, em alguns casos, inclusive, próximos de nós, é o lixo sendo
empurrado para debaixo do tapete. Para esses, dane-se o destino da democracia, conquistada
a duras penas, inclusive com as vidas de muitos brasileiros e, por isso mesmo,
precisa ser preservada a qualquer preço, como bem maior do cidadão, do povo,
enfim. No fundo, pouco importa para essa gente que a democracia continue sendo exposta
a toda sorte de bandalheira.
A tão propalada
transparência, a colocação das cartas sobre a mesa e a linguagem direta e sem
subterfúgio, só existem no discurso de uns poucos, porque, na prática, a
realidade é outra. Senhores parlamentares, acordem, pelo amor de Deus! Será que
os senhores não veem que esse tipo de comportamento nada agrega de valor à
democracia? Será que é tão difícil assim aprender com os próprios erros? Lembrai-vos
das folhas paralelas e “otras cositas más”.
Os restos mortais de Eça; pertencem ao estado ou á família? (Continuação)
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