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Crônica

O Graal do Coração


O Graal do Coração - Gente de Opinião

Nas proximidades do Natal, o ser humano, aculturado pelo cristianismo, costuma sair da sua morada egocêntrica costumeira, para se abrigar no próprio coração. É chegada a hora dos cânticos e louvores, de se mostrar receptivo ao próximo, a hora dos presentes, das orações, das ofertas, de se passar o apagador na lousa demonstrativa das falhas decorrentes do processo evolutivo de humanização, é a hora do exibicionismo vaidoso, patrocinado por Noel. O Natal nos abastece de conceitos efêmeros, ainda assim válidos.

Hoje, diante de tantos fósseis, já não se questiona, cientificamente, que o homem nasceu selvagem, de tronco único, mas que adquiriu inúmeras plataformas, pedaços do software das forças do universo, moldadas pelo tempo e pelo espaço, daí as várias formas e cores humanas. A busca da humanidade pela hegemonia, na natureza, tolera todos as rotas evolucionistas, mas só o criacionismo transcendente se conecta com o emocional e a supremacia divina.

Foram milhares de anos até que o cérebro, primeiro mentor da vida social, administrasse a gênese da ética genética, como elemento preponderante na produção da realidade social: por isso todos os seres humanos, não importa onde tenham nascido ou que cor e forma assumiram, possuem um senso ético, uma espécie de consciência moral, capaz de julgar se suas próprias ações são boas ou más, justas ou injustas, certas ou erradas. A raça humana é uma só, mas alguém precisar lembrar isto aos humanos, constantemente.

A ética “pessoal” se inspirou nas primeiras matrizes culturais, prevalecentes nas sociedades, de acordo com o contexto histórico de cada região. Daí porque o que é certo no Sul pode não ser no Norte, o que não inviabiliza a regra geral de ética inerente. Este é um estudo que começou há 25 séculos, pelos filósofos gregos, mas hoje se estende ao campo da psicologia, da sociologia, da biologia e até mesmo da neurociência. Nada causou mais problemas à raça humana do que a inteligência.

Infelizmente nem todo este preâmbulo, pretensamente científico/filosófico, consegue justificar, por que, mesmo próximo ao Natal, num país de matriz cultural cristã, são tão poucas as ações visceralmente cristãs, em comparação com as ações vaidosas, capitalistas e desumanas, quando se sabe que os valores emotivos perseguidos pela cristandade são condizentes com a busca por uma existência plena e feliz??? A raça humana é uma experiência que ainda não deu certo.

A verdade é que o conceito de felicidade, difere de pessoa pra pessoa. Para a avassaladora maioria o estado de espírito do “ser feliz” está intimamente ligado ao materialismo selvagem do “ter”.  A sociedade ainda confunde o que uma pessoa é com o que ela tem. Os meios escusos, usados para se atingir o status de “ser abençoado”, acompanharam o homem por várias crenças, muito antes da existência do cristianismo. Hoje, dízimos e polpudas ofertas alargam o sorriso de qualquer pastor, padre ou bispo. O céu sempre esteve à venda. Pobre é o capeta!

Sem se incomodar com as consequências, o agricultor abusa do agrotóxico para conseguir morangos mais bonitos, mais vistosos; o garimpeiro joga mercúrio na cara dos indígenas e da sociedade portovelhense, para retirar ouro dos rios amazônicos, notadamente do Rio Madeira, com a aquiescência das autoridades. Em qualquer área, vale tudo pelo lucro: somos majoritariamente cristãos, mas vivemos uma luta simbólica pela dominação do outro, a qualquer custo. A concorrência desleal é herança dos resquícios da selvageria humana.

Os meios, ainda que alheios à ética, estão condizentes com a moral vigente do quem tem, tudo pode. Político pra ser verdadeiramente político precisa ser corrupto, ou tolerar a corrupção. Sem o conchavo corruptivo não se governa, o povo é só um detalhe e se conforma com um presentinho de Papai Noel. A prisão do corrupto, do ladrão, do traficante, em vez de orgulhar, envergonha a PF, pois os presos, salvo raríssimas exceções, não esquentam as celas, são soltos pelas Côrtes, conforme a capacidade de se pagar bons advogados. Cada ministro possui um sócio (a) que administra um escritório de advocacia!... Na Bahia, desembargadoras foram presas, acusadas de venderem sentenças, e esta é uma prática, segundo a imprensa, mais comum do que se imagina. Mateus, primeiro os meus, depois os teus!

Ainda buscamos as verdades do Cristo, no Santo Graal, que tal descobrirmos um Graal dentro de nós mesmos e o enchermos com o sangue do nosso coração, mais afeito às regras pulsantes do amor ao próximo, independentes de condição social, cor, gênero, preferência sexual, etc. O Graal seria um purificador simbólico entre o coração e o cérebro, um confidente das nossas fraquezas, dos nossos erros, cujo sangue, ao ser renovado, no retorno à memória cerebral, estaria impregnado de perdão, abraços e esperança, por dias melhores, em tempos de pandemia. Feliz Natal!!!

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