Terça-feira, 19 de dezembro de 2023 - 13h30
Descia
as "Carmelitas" numa tarde outonal, de céu todo encarvoado, quando de
súbito deparo com o João, que de passos entorpecidos subia a mesma artéria.
Caminhava
de semblante sombrio, dedos encanastrados atrás das costas, em direção aos
" Leões".
-
"Há que séculos que não te vejo!? O que é feito de ti? Parece-me que estás
acabrunhado..."
-
"Ando a cogitar como é triste ser velho em Portugal."
-
"Desembucha homem! O que é que te aconteceu?"
-
"Estava com uma gripe das antigas. Fui ao médico. Entretanto
contactaram-me para ser vacinado. Fui. Disseram-me que era mais seguro testar.
Se fosse Covid era perigoso.
"Venderam-me
o teste rápido. Perguntei se me faziam o favor de me dizerem como era.
"Responderam-me
que era simples, mas tinha que ter muito cuidado para não obter resultado
enganoso.
"Receoso,
recorri a clínica. Informaram-me que não realizavam testes, aconselhando que
fosse ao Centro de Saúde ou telefonasse para a " Saúde 24"
”
Como o meu "Centro" é longe, fui a um hospital particular, mas disseram-me:
que só faziam o deles.
“Regressei
à farmácia. Atendeu-me amável empregada, que me declarou: no estabelecimento é
proibido, mas que podia inscrever-me para realizar o teste, avisando-me que
ficava dispendioso.
“Argumentei,
que pagava o que fosse.
“Pela
manhãzinha do dia seguinte fizeram-me o teste”
-
“Pronto, ainda bem. Ficou resolvido.” - Disse.
-
“Sim, mas fiquei a magicar: como tudo é complicado neste País, principalmente
para os idosos. Nós somos a geração que ia para a escola de pé descalço e
sacola de serapilheira; começamos a trabalhar na adolescência: passamos horas,
se queríamos estudar, nos bancos da biblioteca, porque não havia Internet.
Fomos para a guerra para defender a Pátria, que afinal parece que não era; e
chegados à velhice.... Qual é a recompensa? Reforma que não chega para pagar um
lar decente.... É tudo para os jovens, que são o futuro. E nós, que já não
temos futuro? “
Abraçamo-nos
e seguimos o nosso caminho, mas fui recordando como ainda é atual o célebre
verso de António Nobre...
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