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Crônica

O Outro


O Outro - Gente de Opinião

O outro já foi título de romance e está cotidianamente em nosso dia a dia; no plural, foi tema de minissérie da Globo e nos importunaram, usando a inveja, o ciúme, o poder ... Se voltarmos ao passado vamos encontrar as máximas de Simone e Sartre, em pleno existencialismo, a nos lembrar, com o dedo em riste: “não se nasce mulher, torna-se mulher; o inferno são os outros.

Os Titãs plagiaram o inferno, enquanto personificação dos outros:

O problema não é meu
O paraíso é para todos
O problema não sou eu
O inferno são os outros, o inferno são os outros”.

Às vésperas do Natal, com duas guerras ativas, a gente fica se perguntando: por que o inferno é o outro, de onde vem esta certeza? Embora os cientistas digam que nossa origem comum é a África, vejo o outro em continentes diferenciados, convivendo com a mesma natureza sórdida, dentro ou fora do ambiente dos sapiens; se estiverem no norte do continente Europeu, talvez sejam neandertais, como atesta Yuval Noah Harari. O fato é que, sapiens ou neandertais, nós e os outros, não passamos da extensão deles, via genética. Quiçá tivéssemos em nosso DNA uma mínima parcela divina. Não existiria Caim, Judas, Putin, Netanyahu, Hamas. Pobre menino, não tem potestade.

Durante anos combatemos a forme, hoje morre-se mais de obesidade e de velhice do que de fome, de inanição. As guerras continuam a matar, mas proporcionalmente bem menos do que no século XX. Com o avanço da ciência, os outros não param de crescer e são cada vez mais saudáveis, no entanto, os sérios problemas de convivência crescem juntos, como se o inferno sartriano crescesse na mesma proporção do crescimento da humanidade. O inferno da convivência social é terrível, perene, dificilmente será, um dia, paraíso. E tudo continua o mesmo inferno, no universo, com ou sem Deus, até o fim, se é que existe um fim. Até um novo começo, soa melhor aos que acreditam em renascimento.

No existencialismo, a maioria dos filósofos nega a existência de uma natureza humana. Segundo eles, existe algo primitivo, selvagem, originário, que é inerente a todos os indivíduos, mas não existe uma essência eminentemente humana: “não se nasce mulher, torna-se mulher” (SB). A essência não vem pronta, como afirmam os cristãos, ela é construída ao longo da vida, conforme as escolhas, o meio, as influências. Se formos estender a escrita dessa simples crônica a todos os pensadores existencialistas, teríamos que buscar uma outra plataforma de divulgação, distante até mesmo de meus parcos conhecimentos, talvez tivesse que pedir ajuda a AI.

A minha intenção não era esta, quando me sentei para digitar algo que mostrasse aos meus leitores, que o outro é um inferno reflexivo, a partir do relacionamento. O inferno é como uma via de mão dupla, vai e vem, separada por uma faixa amarela intermitente, qualquer transgressão gera briga, morte, enfim, o inferno social. É dando que se recebe!

Apontar o dedo para o outro, colocar a culpa no outro, sempre foi a melhor opção de quem não enxerga seu próprio interior, às vezes doentio. Os sete pecados capitais, criados pela literatura religiosa, são os mesmos em qualquer religião ou em qualquer língua, mas a evolução humana os transformou em ciúme, mentira, inveja, protecionismo, racismo, humilhação, uso errado do poder e egoísmo. Dependendo da situação, o uso inadequado de qualquer um desses pecados inerentes pode gerar o inferno, para o outro ou para si mesmo. Tais pecados são vistos como a contraparte das virtudes, qualidades que constituem bons indivíduos, com humildade, generosidade, empatia etc.

Para nos livrarmos dos modernos pecados capitais, segundo as igrejas, cristãs ou não, necessitamos de atitudes, escolhas selecionadas, boas ações, solidariedade, nem sempre possíveis, quando interagimos com certas comunidades:  o catolicismo, passado e presente, com o intuito de educar os seguidores, de compreender e controlar os instintos básicos do ser humano, tentou/tenta aproxima-los de Deus. Não deu certo, não vem dando certo. A história da igreja está repleta de atos estúpidos cometidos em nome de Deus; vide Inquisição, Cruzadas, Reforma Protestante, Calvinista, Pedofilia etc.

Portanto e concluindo, os outros serão o que nós determinarmos que serão, conforme nossos princípios, educação religiosa, educação familiar, mas será o inferno se nós ou eles estivermos dominados pela inveja, arrogância, egoísmo, etc. A tão sonhada natureza divina não passou ao homem pela transcendente semelhança, parou no materialismo evolucionista. Os apetrechos religiosos não conseguiram materializar no bicho homem, as virtudes divinas, sequer conseguiram determinar porque os humanos foram/são tratados, conforme a cor da pele. Não fomos criados, surgimos na natureza, evoluímos e existimos ao deus dará, distribuindo e recebendo patadas de toda ordem. 

Pelo que se conhece da natureza humana, o outro será o inferno agora e sempre, nem o filho de Deus, nem a filosofia cristã, conseguiram personificar o amor no conceito de outro: amar ao outro (próximo) como a ti mesmo. Boas Festas, Feliz Ano Novo, Feliz Natal. Que os outros completem o seu paraíso, aqui na Terra, aproveitando a comprovada inexistência do inferno. Nestes dias festivos, tomem vinho em vez de água, enquanto a água sacia a sua sede o vinho lhe faz cantar. Aaaaleluia!!!  

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