Quinta-feira, 3 de agosto de 2023 - 10h46
De 30 de novembro a 12 de dezembro próximo ocorrerá
a 28ª Conferência das Partes das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas,
conhecida como Conferência do Clima (COP) da ONU. A cidade
de Dubai, nos Emirados Árabes Unidos, é quem recepciona o evento. Seguindo a
tradição diplomática, o país anfitrião indica o presidente da Conferência, que
neste caso será o Diretor Executivo da Companhia
Nacional de Petróleo de Abu Dhabi (ADNOC- Abu Dhabi National Oil Company), Sultan Ahmed Al Jaber.
Reações contrárias
a esta indicação ocorreram em várias partes do mundo pelo envolvimento direto
de Al Jaber com a indústria petrolífera. A necessária imparcialidade é
questionada, devido ao fato de representar os mais altos interesses da
indústria do petróleo&gás, podendo, assim, comprometer os esforços e
decisões a serem tomadas para a redução dos combustíveis fósseis para
fins energéticos, que, segundo dados científicos, hoje constitui uma
ameaça existencial real para nosso planeta.
A COP28, assim como suas antecessoras, tem
como objetivo debater metas e ações para o enfrentamento das mudanças
climáticas, reunindo representantes governamentais e não governamentais. Os
delegados governamentais dos países signatários da Convenção são os únicos com
poder de voto na Conferência. Como observadores participam jornalistas,
integrantes de organizações não governamentais (ONGs), sociedade civil
organizada, entre outros.
Nessas reuniões, as deliberações são tomadas por
consenso entre as partes, o que muitas vezes torna as negociações um processo
lento, árduo e inatingível. O sucesso ou fracasso da agenda climática, no fim
das contas, é medido pela contenção do aumento da temperatura média global — e
isso depende da redução das emissões de gases de efeito estufa (GEE’s).
Fato esse que não está ocorrendo, pois é verificado ano a ano, o aumento da
concentração do principal gás estufa, o CO2, na atmosfera terrestre.
Os 197 países que assinaram o Acordo de Paris, em
dezembro de 2015 durante a COP21, se comprometeram a reduzir suas
emissões de GEE’s, apresentando voluntariamente suas metas de corte.
Segundo este acordo, as regras vigentes devem ser revisadas a cada 5 anos.
Todavia os cientistas do Painel Intergovernamental sobre as Mudanças
Climáticas (IPCC, em inglês) têm insistentemente declarado que os
cortes prometidos nas emissões são insuficientes para evitar o chamado ponto de
não-retorno (mudanças climáticas não poderão ser revertidas).
As grandes corporações, com interesses em petróleo&gás
e carvão, aliados aos países produtores destes energéticos,
inexplicavelmente, estarão mais uma vez presentes, infiltrados como delegados,
e nesta reunião, assumindo a própria presidência da Conferência do Clima.
É um contrassenso visto que a presença dos pró-fósseis, como sempre
fizeram em outras reuniões do gênero, continuarão dificultando, embargando,
atravancando acordos vitais para a redução do uso dos combustíveis fósseis na matriz
energética mundial, com o estabelecimento de cronogramas, acompanhamento e
fiscalização das metas. Lembrando que, quem mais depende dos energéticos
fósseis são os países do norte global, a China, cuja dependência em sua matriz
energética é superior a 80%. Além de maiores consumidores, são também os
maiores emissores de gases.
Nestes quase trinta anos de Conferências do
Clima (COP), o que fica claro é que as políticas, acordos,
negociações que chegaram a ser adotados pelos países, foram insuficientes para
reverter as emissões de GEE’s. Nem ao menos foram encontradas soluções
eficazes e estratégicas para o enfrentamento do aquecimento global. A
governança mundial esperada para acompanhar, fiscalizar e fazer cumprir os
acordos não funcionou. Como resultado, os desastres climáticos atingem
atualmente todos os continentes, com maior frequência, e maior intensidade,
provocando ondas de calor, enchentes destruidoras, extinção de espécies, degelo
das geleiras nos pólos, e perda de vidas humanas.
Se sabemos a causa principal do aquecimento
global, por que não conseguir reduzir as emissões dos gases gerados pelos
combustíveis fósseis, e mesmo banir tais fontes de energia da matriz
energética mundial?
A força política e os interesses econômicos dos “negócios
dos fósseis” a nível mundial, tem criado obstáculos para que os
acordos de limitação das emissões sejam
efetivamente cumpridos. Empresas da cadeia produtiva do setor dos combustíveis
fósseis, nações produtoras de combustíveis fósseis, negacionistas e
oportunistas de plantão, fazem parte do clube dos “exterminadores do futuro”.
Acabam criando barreiras, obstáculos, impedindo os avanços na direção de
reduzir a produção e o consumo mundial das fontes não renováveis.
Na era pós-pandemia,
mudanças importantes ocorreram no humor das grandes empresas petroleiras
mundiais. Nas últimas reuniões dos acionistas das maiores petroleiras, os
investidores que defendem uma estratégia mais sustentável ficaram cada vez mais
isolados. Com a crise desencadeada pela guerra Rússia-Ucrânia, os lucros das
empresas de petróleo&gás aumentaram
muito e, como consequência, arrefeceu-se o discurso de investir em planos
sustentáveis de longo prazo para mitigar as mudanças climáticas, que era
mais enfático quando o setor estava perdendo dinheiro.
Às
vésperas da CO28, os ministros de Energia do G20 e a União
Europeia, maiores economias do mundo, representando mais de 75% das
emissões globais de carbono e do PIB mundial, reunidos (22/07) no evento
denominado Energy Transitions Ministerial Meeting (ETMM),
realizado na Índia; não chegaram a um acordo sobre um plano de ação para a
redução do uso dos combustíveis fósseis. Além desta divergência, está a
proposta defendida pela presidência da COP e pela Agência Internacional de
Energia (IEA, em inglês), de triplicar as fontes de produção de
energia renovável até 2030. Países como a Arábia Saudita, Rússia, China, África
do Sul e Indonésia, principais produtores de combustível fóssil do bloco, se
opuseram ao objetivo de atingir esta meta ainda nesta década.
No plano nacional fica mais claro a atual política
em relação ao petróleo. Mesmo com a mudança de governo, e da política
ambiental, o discurso da Petrobras é semelhante à de tantas outras
petroleiras que insistem em ações no sentido de aumentar a exploração do
petróleo e do gás, vilões do aquecimento global, juntamente com o carvão
mineral. O último Plano Decenal de Energia (PDE 2022-2031) lançado pelo Ministério de Minas e Energia (MME), prevê um aumento na produção diária
de petróleo no Brasil até 2031, dos atuais 3,4 milhões de barris por dia para
5,2 milhões. Um aumento acentuado, indicando uma política energética que tem na
exportação de petróleo um expediente para alavancar recursos para o país.
Nesta mesma direção foi a decisão recente do
Conselho de Administração da petroleira brasileira, cujos conselheiros deram
aval, e decidiram priorizar a oferta de gás natural, e repor as reservas de
petróleo com exploração de novas fronteiras como na foz do Rio Amazonas.
O próprio presidente Lula, na recente reunião (5/7) Técnico Científica da Organização
do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA), que reuniu Brasil, Colômbia,
Peru, Venezuela, Guiana, Suriname, Equador e Bolívia; evitou discutir a
proposta do governo colombiano de interromper novos projetos de exploração de
petróleo na Amazônia.
Diante dos fatos e posicionamentos públicos, fica
evidente que mesmo países como o Brasil, que possuem um discurso contundente
pela descarbonização e uso de fontes renováveis no enfrentamento
das mudanças climáticas, se defrontam com a realidade de que a sua
petroleira não quer fazer a transição energética. Todas querem manter os combustíveis
fósseis o maior tempo possível, não importando as consequências.
A declaração do presidente da Petrobras na
8ª edição (5/7) do Seminário Internacional da Organização dos Países
Exportadores de Petróleo (OPEP, em inglês), com o tema “Rumo
a uma transição energética sustentável e inclusiva”, mostrou o alinhamento
existente entre as petroleiras mundiais, destacando em seu discurso “que o
banimento na exploração de novos campos petrolíferos não seria realista, mas
sim otimizar as atividades de transporte, comercialização e refino de petróleo,
além do transporte e comercialização de derivados”.
A saída gradual e definitiva dos combustíveis
fósseis da matriz energética global significa defender a continuidade da vida
no Planeta. Equivocados e prestando um péssimo serviço à humanidade estão
aqueles que propõem eliminar as "emissões" dos combustíveis fósseis e
dos processos envolvidos, estimulando a continuidade crescente do seu uso.
Ainda mais, com propostas ainda embrionárias e incertas do ponto de vista
técnico-econômico-ambiental de técnicas de captação das emissões.
Assim, diante da possibilidade concreta de mais um
retumbante fracasso da COP28, baseado no que aqui foi relatado, a
proposta seria “pular” a COP28 e COP29; e realizar a COP30
em Belém do Pará, em 2030.
Na atual conjuntura, aceitar estes 2
anos sem COPs, é não ser conivente com o “faz de conta” que acabou se
transformando estas Conferências, cuja chance de sucesso é inexistente no atual
formato e governança. Onde já se conhece o resultado final, antes da “partida”
começar, visto que são irreconciliáveis as divergências atuais sobre o
papel das fontes de energia não renováveis na emergência
climática vivida pelo planeta Terra.
Em nada mudaria de forma consistente e
robusta as decisões que poderiam ser tomadas, para o enfrentamento das mudanças
climáticas, caso estes 2 próximos eventos se realizassem, tal o antagonismo
visceral reinante, em que as partes não cedem e, assim, não se avança no ponto
crucial, que é reduzir o consumo de combustíveis fósseis e, consequentemente,
as emissões de GEEs.
Não realizar as COPs 28 e 29 poderá
ser um caminho, para aprofundar negociações na direção de estabelecer um novo
formato e governança para a Conferência. Nesta nova situação prevaleceriam decisões
baseadas na Ciência, e não a meros interesses econômicos, de corporações e
países que se locupletam com a exploração destes energéticos, acumulando uma
riqueza extraordinária, resultando impactos negativos e malefícios a todo
planeta.
Todavia, desde já, deve constar na
pauta das negociações para a COP30, discussões relativas a medidas
restritivas do aumento da produção de petróleo e derivados, gás natural e
carvão mineral. Até mesmo uma moratória em relação a abertura de novas
explorações seria o esperado. Outro ponto prioritário seria adotar restrições à
participação, como delegados na Conferência, dos representantes dos “negócios
dos fosseis”.
Nesta nova realidade, associado a
pressão exercida junto aos delegados pelas populações originárias, que sabem e
podem nos ensinar a fazer as pazes com a natureza, pelos ambientalistas
presentes, e por uma multidão vinda de toda parte do planeta, as condições
estariam dadas para que efetivamente os governos e seus delegados votem pela
vida, e não pela morte. É o que está em jogo. A mágica de um território, de
mãos dadas à pressão popular, é quem dará novos rumos às futuras COPs.
Assim, vamos Esperançar que a COP
30, realizada no entorno da maior floresta tropical do mundo; seja o
momento de inflexão, de mudança de paradigma da relação dos seres humanos com o
meio ambiente, preservando a vida na nossa Casa Comum.
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