Sábado, 16 de julho de 2022 - 10h35
O crescimento de grandes
complexos eólicos no país, em particular no Nordeste, tem crescido vertiginosamente
nos últimos anos, principalmente devido a excelente qualidade dos ventos na
região, da flexibilização e da baixa fiscalização das leis ambientais, e do
preço da terra arrendada (ou comprada) ser insignificante diante dos
investimentos realizados. Tais condições têm atraído inúmeros empreendedores
nacionais e internacionais pela alta lucratividade desta atividade, conhecida
como “negócios do vento”.
Com a rápida expansão desta
agenda econômica, inúmeros impactos, conflitos e injustiças socioambientais
estão sendo detectadas, e relatadas em estudos e trabalhos realizados pelas
universidades públicas, centros de pesquisa, organizações não governamentais,
sindicatos de trabalhadores rurais, e comissões pastorais ligadas à igreja
católica.
Todavia, a propaganda com
justificativas falaciosas e tendenciosas, o uso de táticas questionáveis pelas
empresas e de sua representação nacional, a Associação Brasileira de Energia
Eólica (Abeeólica), tem confundido e omitido da opinião pública, a atual situação
nos territórios onde foram implantados os complexos eólicos. Ao mesmo tempo o
governo federal, governos estaduais e municipais têm cedido a tais interesses
econômicos, legislando a favor dos “negócios do vento”; não levando em
consideração o desastre socioambiental provocado, e o que se anuncia para os
próximos anos com o atual modelo de expansão desta tecnologia, que tem optado
pela geração centralizada, em benefício exclusivo do lucro das empresas.
Alguns
dos principais efeitos negativos identificados estão relacionados a supressão
de vegetação (área para a instalação dos aerogeradores e construção de
estradas); aos problemas causados a fauna (mortandade de morcegos, pássaros),
as pequenas criações (diminuição dos ovos, do leite, abortos, ...); as alterações
do nível hidrostático do lençol freático no processo de instalação da estrutura
das torres; aos impactos sonoros e efeito “estroboscópio” afetando a saúde das
pessoas (distúrbios do sono, dor de cabeça, zumbido e pressão nos ouvidos,
náuseas, tonturas, taquicardia, irritabilidade, problemas de concentração e
memória, episódios de pânico com sensação de pulsação interna ou trêmula, que
surgem quando acordado ou dormindo); aos deslocamentos das populações com
destruições de modos de vida de populações tradicionais; a expropriação de
terras (com contratos draconianos de arrendamento) e pagamentos irrisórios dos
arrendadores.
Não se
pode admitir que continue esta situação de “vale tudo”. Não é respeitado nem
áreas de conservação, nem brejos de altitude, áreas indígenas, áreas
quilombolas, fundos de pasto, áreas da agricultura familiar, áreas litorâneas
de vocação turística, .... É mais que urgente mudar a rota do atual modelo de
expansão adotado, diante da necessidade de utilizar as fontes renováveis de
energia (sol, vento, biomassa, água), na descarbonização tão necessária e
urgente, para uma transição energética justa, e assim, enfrentar a emergência
climática que assola o planeta.
Várias
propostas para minimizar estes problemas têm sido sugeridas e discutidas. Como
a priorização da produção descentralizada de energia. Não há dúvidas que
grandes instalações contínuas com seus efeitos cumulativos, ocupando grandes
áreas (onde existem moradores dispersos), atentam mais gravemente contra o meio
ambiente e as pessoas, do que pequenas instalações eólicas. O tamanho do
impacto é proporcional ao tamanho da área ocupada pelos aerogeradores,
transformadores, e pela construção de estradas e acessos, além das linhas de
transmissão
No
sentido de evitar e mesmo minimizar os danos, urge tornar obrigatório
o Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e do Relatório de Impacto de
Meio Ambiente (RIMA) para tais empreendimentos. Não é correto tecnicamente
utilizar a expressão energia limpa (como de baixo impacto ambiental)
para instalações de grande porte, diante do que está ocorrendo, e assim exigir
somente o Relatório Ambiental Simplificado (RAS).
O zoneamento
territorial evitaria que determinadas áreas recebam os complexos eólicos e
assim minimizaria danos ambientais, sociais, culturais e econômicos, além de
evitar a competição entre produção de alimentos e de energia. A atualização dos
Atlas dos Ventos, pode ser um caminho, se for levado em conta em sua confecção:
a) as políticas públicas ambientais; b) a localização das Unidades de
Conservação; c) áreas de proteção ambiental dos Brejos de Altitude (Pernambuco
e Paraíba); d) áreas de proteção de mananciais hídricos; e) as áreas de
“hotspot” da conservação biológica; f) zonas de produção agroecológica; g) as
propriedades rurais produtivas da agricultura familiar e assentamentos
agrícolas.
Efetivo acompanhamento
e fiscalização pelos órgãos ambientais (o que não acontece hoje) de
todas as etapas de licenciamento (prévia, instalação e operação) concedidas.
Transparência dos relatórios das equipes de fiscalização e acompanhamento com a
sua publicização, com informações sobre o atendimento ou não, das exigências
contidas nas licenças expedidas (compensação).
Os
complexos eólicos têm deixado profundos rastros de destruição do meio ambiente
e na vida das comunidades atingidas (exemplos não faltam). Desde a
obtenção do terreno (pela compra, ou pelo arrendamento), a sua preparação
(desmatamento, terraplanagem, compactação, abertura de estradas de acesso dos
equipamentos), a construção das linhas de transmissão, a piora na saúde das
pessoas, a desconstituição das atividades produtivas com a desestruturação dos
modos de vida.
Sem que
requisitos socioambientais sejam atendidos, sem o respeito pela vida das
pessoas que vivem e tiram seu sustento de onde vivem, e cultivam suas tradições;
os grandes complexos eólicos são insustentáveis, e no fim das contas trazem
mais desvantagens do que vantagens. Assim, propõe-se a criação de territórios
livres dos complexos eólicos (TLCE), que a geração distribuída seja
priorizada, e que seja exigido o EIA/RIMA para o licenciamento
dos empreendimentos.
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