Quinta-feira, 6 de março de 2025 - 11h55
É o básico, porém muitos de nossos políticos,
ocupantes de cargos de comando nos poderes Executivo e Legislativo precisam ser
periodicamente lembrados de que as escolhas democráticas do povo brasileiro nas
urnas não terminam no dia seguinte ao de suas posses.
Ao contrário do que muitos deles pensam,
a posse é meramente o início de suas obrigações de servir à população com
ética, honestidade e competência, além do dever de prestar contas aos cidadãos
que o elegeram, fazendo-o não somente durante o período eleitoral, quando se
candidatam a novos mandatos.
Isso tudo precisa ser reavivado, de tempos em
tempos, porque nossos políticos parecem se esquecer disso logo que se sentam na
cadeira do poder, assim como, passados poucos meses da eleição a maioria dos eleitores
sequer se lembra em quem votou como seu representante no Congresso Nacional. É
grave.
Da mesma forma, é indefensável a permanência do
fundo eleitoral, nos moldes atuais, com a grandiosidade financeira de cerca de
R$ 5 bilhões para financiar as campanhas dos políticos. Trata-se de mais
uma imperfeição do sistema brasileiro, à qual se soma o Horário Eleitoral
Gratuito, cuja gratuidade é apenas para os partidos e para os políticos, porque
o tempo de exibição no rádio e na televisão custa caro e é custeado com
recursos de tributos arrecadados de toda a população, inclusive daqueles com
rendimento inferior a um salário-mínimo.
Hoje, o bilionário Fundo Eleitoral, baseado no
cumprimento da legislação vigente, tem em seu rateio 2% distribuídos de forma
igual a cada um dos 29 partidos, representando R$ 3.421.395,54 por legenda e
totalizando R$ 99.230.395,54. O rateio reserva outros 35% para distribuição proporcional
ao número de votos de cada partido na Câmara de Deputados. São, atualmente, R$
1.736.531.921,95 distribuídos por 20 partidos, pois nove não tiveram votos
suficientes para garantir ao menos uma cadeira na Câmara de Deputados. E dessa
parcela de 35%, a maior parte (67%) fica com os sete maiores partidos (PL, PT,
União Brasil, PSD, PP, MDB e Republicanos), beneficiados com as maiores verbas
em 2024.
Quase metade (48%) do valor do fundo, é
distribuído em função das bancadas dos respectivos partidos na Câmara dos
deputados (inclusive incorporações e fusões) e totalizou em 2024 R$
2.381.529.492,96. Novamente os sete maiores partidos foram os mais aquinhoados:
ficaram com R$ 1,84 bilhão, o correspondente a cerca de 78% dessa fatia.
Finalmente, outros 15% restantes do fundo (R$
744.227.966,55) são definidos em função da bancada no Senado, e, pelos
critérios em vigor, os mesmos sete partidos foram aquinhoados com quase 75% do
total desta parcela.
Como pouco é divulgado no período eleitoral
acerca da expressividade do valor dos fundos, a população não se dá conta de
que apenas sete partidos políticos detêm cerca de um terço (74% a 75%) do valor
total. É óbvio que dificilmente os postulantes à Presidência da República, aos
governos estaduais e às Prefeituras das grandes capitais serão lançados
candidatos sem a aprovação dos dirigentes dos sete maiores partidos. Uma
definição que remete à época da escolha dos donatários das capitanias
hereditárias, nas primeiras décadas do Brasil Colônia.
Cabe, portanto, um apelo direto às redes de
comunicação, aos profissionais de jornalismo, radialistas, redes sociais,
blogueiros, e influencers: o Brasil precisa muito de todos eles para levar
esclarecimento sobre essa situação às parcelas mais pobre e menos escolarizada
da população, ensinando que o cidadão, quando prioriza o voto para um deputado
ou senador de um determinado partido, está aumentando muito a chance de eleger
um prefeito, um governador e um presidente da República daquele mesmo partido
ou de sua coligação, com maior probabilidade de ele ser filiado a uma das sete
grandes legendas dominantes: PL, PT, União Brasil, PSD, PP, MDB, e
Republicanos.
É preciso valorizar mais e mais o Poder
Legislativo, dignificar nossas escolhas que são tão importantes quanto à
eleição do presidente da República ou de um governador. Necessária a
consciência de que, ao eleger um parlamentar, está se abrindo uma grande janela
para a escolha de candidato a presidente da República, governador ou prefeito
das grandes capitais, pois a bancada é que dita quanto o partido recebe do
fundo eleitoral.
Para que o Brasil tome o rumo definitivo na
direção do bem-estar da sociedade, é fundamental que a população faça enfática
cobrança junto aos nossos políticos pelo fim da reeleição, pela mudança
legislativa para tornar imprescritíveis os crimes praticados contra a
administração pública e para a volta da prisão após condenação por decisão
colegiada em segunda instância. Esses são os pré-requisitos para garantir novo
rumo ao país e dar o pontapé inicial na luta pelo fim da corrupção.
Ao contrário do que muita gente imagina, o
Brasil não tem problemas financeiros capazes de incapacitar seu
desenvolvimento. Este é um país rico em recursos naturais e em recursos
humanos, com profissionais muito capacitados em todas as áreas, inclusive em tecnologia
de ponta. Os maiores problemas brasileiros são de origem ética e política,
agravados pela impunidade que transmite ao cidadão a falsa sensação de que não
vale a pena ser honesto. Alterar esse quadro depende muito de um Congresso
fortalecido por meio de deputados e senadores qualificados, sérios e
comprometidos, com amplo apoio popular.
*Samuel Hanan é engenheiro com especialização nas áreas de
macroeconomia, administração de empresas e finanças, empresário, e foi
vice-governador do Amazonas (1999-2002). Autor dos livros “Brasil, um país à
deriva” e “Caminhos para um país sem rumo”. Site: https://samuelhanan.com.br
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