Segunda-feira, 31 de março de 2014 - 05h50
Bruno Peron
Poucas vezes os direitos humanos estiveram tanto em evidência no Brasil como nos tempos atuais. Setores diversos da sociedade – muitos deles se reivindicam como minoritários – lutam por mais espaço, legitimidade e visibilidade. Bandeiras de vários movimentos sociais e grupos menos organizados alçam-se no Brasil em busca de tarifas mais baratas de ônibus, moradias, segurança (nas escolas, nos bairros) e inserção na sociedade através de políticas que afirmem certas identidades.
Não haverá espaço aqui para avaliar o mérito de cada uma destas lutas no âmbito dos direitos humanos, já que há uma infinidade de organizações que promovem direitos humanos no Brasil e no mundo. Em lugar disso, proponho uma reflexão sobre dois aspectos: 1) a consciência do brasileiro de que tem direitos, mas sem saber quais são esses direitos; e 2) o desajuste entre a emergência desta consciência e o fato de que ela não caminha de mãos dadas com a consciência de deveres.
Sobre o primeiro aspecto, organizações civis e governamentais têm feito campanhas de conscientização de quais são os direitos humanos. Para dar um exemplo, a Secretaria de Direitos Humanos – que é vinculada à Presidência da República – tem promovido debates e eventos para melhorar os direitos relacionados a crianças e adolescentes, deficientes, idosos, violações (torturas), mortos e desaparecidos políticos, sequestro internacional, trabalho escravo, entre outros.
Não obstante, o problema maior reside no segundo aspecto devido aos caminhos sinuosos que nossa meia-cidadania segue. Queremos ganhar e receber, mas não queremos doar e oferecer. Pensamos quase sempre nos direitos privados (meu carro, minha casa), mas nos esquecemos dos direitos públicos (nossa rua, nossa praça). Desejamos um direito que cabe a nós, mas pouco nos esforçamos na contribuição para o engrandecimento dos direitos (que seja através de um simples bom exemplo).
Como se não bastasse este segundo aspecto, a evolução dos direitos humanos no Brasil segue um processo exógeno, em que a fórmula está na Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem e na Declaração Universal dos Direitos Humanos. Desse modo, organizações estrangeiras exercem influência enorme sobre as convenções e as pautas brasileiras quando trazem ideias como as de multiculturalismo e de quais são as minorias. Apesar de que os relatórios destas organizações escrevem-se por equipes procedentes de vários países, elas naturalmente esbarram contra a dificuldade de compor um receituário que terá validez para todos os países. Neste sentido, não existe cultura universal porque toda cultura tem as marcas de sua origem e, portanto, ela é particular.
Mostro este argumento sem a audácia de entrar numa comparação entre os sistemas jurídicos dos países (da América do Norte e da Europa) de onde se formulam estas propostas de direitos humanos. Se o fizesse, teria que questionar, por exemplo, a incompatibilidade entre direitos de autodeterminação dos povos e as intromissões que os Estados Unidos (e seus aliados da Europa) fazem em países (Iraque, Síria, etc.) que não aceitam os preceitos jurídicos do Ocidente.
A evolução dos direitos humanos no Brasil tem sido um pouco nebulosa na medida em que não se concilia um passado de exploração com um futuro de cidadania. Por isso tanta ênfase se dá a grupos que se organizam, por exemplo, em Comissões da Verdade, que tentam conjurar os fantasmas dos regimes autoritários. No calor do mesmo território, arma-se o circus tupinicanus através da absolvição de bandidos do Mensalão como crime de quadrilha pelo Supremo Tribunal Federal, enquanto ativistas protestam contra a truculência das forças policiais para conter protestos no Brasil.
Você escolherá, leitor, as cores e a altura da bandeira que você levantará em sua luta.
Não deixe de reinvindicar os direitos e cumprir com os deveres que o enobrecerão.
http://www.brunoperon.com.br
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