Terça-feira, 4 de março de 2014 - 09h05
Por Marli Gonçalves
Somos de todos os tipos, cores e tamanhos. É. Também temos tamanhos, aqui e ali, sabe? E formas. Também somos até o arco-íris inteiro, quando mulheres amam mulheres. Com filhos, sem filhos; amas, quando produzimos e damos o alimento da vida do nosso próprio corpo, leite branco tanto quanto a criação inicial. Coloridas na forma, sempre de alguma forma: na maquiagem, no batonzinho, no sapato bonito, no brinco que adorna, nas unhas que podem arranhar profundamente. Na bolsa que guarda coisas que nem Deus acredita.
Mulheres amadas, mesmo que por minutos, e mesmo que estes minutos tenham sido pagos, que não tem quem finja melhor que mulher. Somos mulheres amantes, que esperam seus amores o tempo que for, tecendo ou desfazendo tudo a cada dia, principalmente as lembranças das mentiras ao pé do ouvido que naquela hora foram palavras mágicas de abrir flor. De abrir portas para aceitar desculpas, que logo se repetirão, como sempre, junto com as mentiras.
Amorosas quase sempre. Diferentes, mesmo quando indiferentes à nossa condição mais do que especial, que nem todas percebem ainda; teimam. Somos mulheres quando olhamos, pensamos, escrevemos, pintamos. Ou andamos, na ginga que quebra pescoços, provoca assobios.
Somos calmas e também muito nervosas - eles acham isso. Acham que somos implicantes, chatas, ciumentas, vaidosas. E também acham que queremos o lugar deles, quando apenas queremos o nosso.
Somos passionais, guerreiras. Mas também frias, calculistas, como todos os humanos podem ser; ou apáticas, aguentando em silêncio o que homem algum suportaria. Podemos ser bem loucas, atazanando de tal forma que enlouquecemos outros. E outras. Que briga de mulher com mulher, ódio de mulher para mulher, vamos e venhamos, chega a ser mortal.
Porque ainda nos enfrentamos, tanto, umas às outras? Tantas vezes desnecessariamente porque uma é mais magra, ou loira, ou feia, ou mais bonita, por ciúmes, por homens que não valem a pena.
Para chegar aqui, em algumas vitórias, sim, tivemos de nos unir. Até para morrer, como juntas, queimadas, morreram as tecelãs que simbolizam nossa luta. Para marchar, como agora marcham mulheres de branco, na Venezuela, ou apenas se juntam, chorando, em praças deste mundão todo, clamando por Justiça e dignidade. Com a cara lavada, com a cabeça coberta, com os seios à mostra.
Sim, mulher com dia e tudo. Inclusive de menstruar, dias de dar, em tabelinhas, inclusive aquelas do que comer ou não comer. Mas veja bem o quanto falta. Por exemplo, ainda sermos só nós a nos cuidar, não descuidar.
Estamos em casa, lavando, passando, secando, torcendo. Nas ruas, tentando, trabalhando, algumas em lugares que nem nos nossos melhores sonhos passados esperávamos. Lugares que até nem queríamos, mas em que precisamos estar - e todo mundo aplaude como também somos capazes, fortes, iguais, etc. e etc. Somos milhões, metades, um pouco mais, um pouco menos. Problema é que - coisa que não entendo - muitas, quando chegam lá viram homens, com seus cacoetes todos, como se endurecer fosse poder, sem trocadilhos.
Ah que nestes dias vamos ouvir muito falar de nós mesmas, até o limite de nossa estreita paciência. Vão nos tentar vender de todas as formas, vender para a gente, vender a gente. Vão querer até que nós sejamos presenteadas, coisa que não é bem apropriada para um dia que deveria ser igual a todos os dias, sendo respeitadas.
Principalmente, digo, gostaria de realmente estar sendo mais bem representada aqui neste meu país tão varonil.
São Paulo, marco de 8 de Março, 2014
Marli Gonçalves é jornalista - Foi no primeiro 8 de março oficial, em 1975, que descobri como era importante ser mulher. Desde então estou nessa luta. Venha você também. Não fique discutindo a vírgula que não temos, ou se isso tudo é feminista ou feminino. É mulher, ponto.
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