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Na América Latina, rádio cumpriu papel de integração


Leandra Felipe
Correspondente da EBC


Bogotá - Na história dos países latino-americanos, o rádio cumpriu um papel de integração e foi um instrumento para consolidar a identidade nacional e cultural de cada nação, apontam especialistas.

O surgimento das emissoras de rádio ocorreu entre as décadas de 1920 e 1930. Na América Latina, as primeiras rádios comerciais e estatais foram orientadas e incentivadas por políticas de governo em meio a guerras, planos nacionalistas e regimes militares.

Coordenadora da fonoteca da Rádio Nacional da Colômbia (emissora pública colombiana), a historiadora Dora Brausin, observa que há semelhanças entre os momentos vividos pelos países à época e a maneira como o rádio foi utilizado.

Segundo ela, tudo começou com os radioamadores, aficionados pelas transmissões radiofônicas, que transmitiam, entre outras coisas, óperas. “Depois, as emissoras foram surgindo, ou criadas pelos governos, ou com apoio estatal, quando não privadas. Quase todas foram orientadas ao desenvolvimento regional”, detalha a pesquisadora.

A primeira transmissão radiofônica da região ocorreu na Argentina, em agosto de 1920. O médico Enrique Telémaco e três amigos conseguiram transmitir direto do Teatro Coliseo, em Buenos Aires, a ópera Parsifal. Ali surgiu também a primeira emissora do país, a L.O.R Rádio Argentina.

Pelo rádio, o país acompanhou a posse do presidente argentino Marcelo de Alvear, em 1922, e, no ano seguinte, a chamada “luta do século”, entre os boxeadores Jack Dempsey e Luis Ángel Firpo, direto de Nova York, nos Estados Unidos.

No México, a primeira rádio surgiu em 1921, na cidade de Nuevo Léon, capital do estado de Monterrey. No ano seguinte, o presidente do país, Álvaro Obregón, concedeu incentivos fiscais à instalação de emissoras privadas com a ideia de “integrar o país”. Em 1923 foi inaugurada a rádio XEB, na capital mexicana.

Na Venezuela, a primeira estação surgiu em 1926, durante a ditadura de Juan Vicente Gómez. A Ayre começou a operar em Caracas, com notícias e humor. A emissora era dirigida pelo coronel Arturo Santana, que recebeu do governo venezuelano permissão para explorar a primeira emissora do país.

No Peru, a LIMA OAX-AM foi inaugurada em 1925. Em princípio, privada, a emissora foi estatizada, anos depois, e se tornou a Rádio Nacional do Peru.

Na Colômbia houve algumas transmissões em Barranquilla, região do Caribe colombiano, mas considera-se que a primeira rádio do país foi a estatal HJN, criada em 1929 pelo governo de Miguel Abadía Méndez.

A emissora era ligada ao Ministério da Educação e oferecia uma programação que alternava música clássica e boletins de notícias, transmitidas de Bogotá ao restante do país.

“Além de integrar a Colômbia, que tinha uma infraestrutura bastante precária naquela época, a HJN serviu para reforçar a unidade do governo central e para manter o país coeso, no momento em que vivíamos um conflito com o Peru”, avalia a historiadora.

De maneira geral, nas décadas de 1940 e 1950, as estações da região viveram sua “era dourada”. O rádio passa a ser ouvido nas casas, com programações dominicais de notícias, radioteatros (radionovelas) e programas infantis.

Durante os regimes militares, o rádio serviu para difundir a política nacionalista de cada país. Segundo a pesquisadora colombiana, houve isenção de impostos para a compra de equipamentos pelas emissoras para melhorar a transmissão.

“A Rádio Nacional da Colômbia, por exemplo, transmitia os programas enviados pelos Estados Unidos. E do mesmo modo no Peru, Chile e outros países, que viveram sob regimes ditatoriais militares, apoiados pelo governo norte-americano”, comenta Dora.

Na América Latina, o rádio também foi instrumento de educação. Algumas emissoras ofereciam cursos de alfabetização e de profissionalização. Isso ocorreu na Argentina, no México, na Colômbia e em quase todo o continente. Atualmente, o veículo é bastante usado em plataformas educativas em Cuba e na Guatemala.

Em meados dos anos 1980 e na década de 1990, as emissoras latino-americana também começaram uma fase de maior interação e maior participação do ouvinte. E, atualmente, com a internet e o rádio digital, o veículo vive um momento de transição.

Segundo a professora Perla Olivia Rodríguez, da Universidad Nacional Autónoma do México, o caráter educativo e de difusão cultural é o que permite que o rádio se mantenha “vivo” nesse novo formato, integrado a novas linguagens, como a internet.

“Na era digital, o desafio do rádio moderno é gerar conteúdos cada vez mais afinados com as necessidades da população. Conteúdos que possam ser aproveitados de maneira interativa, como podcasts, sempre focando no desenvolvimento regional latino-americano”, defende Perla.

A pesquisadora colombiana Dora Brausin concorda com Perla quanto ao valor do rádio, principalmente das emissoras públicas, na era digital. A estatal colombiana está digitalizando todos os seus arquivos, conservados desde a fundação da emissora, em 1940.

Segundo Dora, a Rádio Nacional da Colômbia alcança 80% do país. Alguns ouvintes relatam que a programação é o único contato que eles têm com a capital, Bogotá, e com as informações de outras regiões.

“Mesmo nos lugares em que a internet chega melhor que o nosso sinal, recebemos retorno dos ouvintes que nos escutam no site da emissora. Isso é fruto do serviço que oferecemos, e vejo isso acontecer no Brasil e nos demais países do continente. Se mantivermos o foco no cidadão, o rádio seguirá perto da população latino-americana”, destaca Dora.
 

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