Segunda-feira, 3 de novembro de 2014 - 06h40
O GAROTO
Guido Bilharinho
Charles Chaplin (1889-1977) iniciou suas atividades cinematográficas em 1914, na Keystone, como ator, dirigido por Mabel Normand, com quem posteriormente dividiu a direção em alguns curtas-metragens, até assumi-la totalmente, não sem antes ter dirigido também em parceria com Mack Sennett ou ser por ele dirigido em diversas películas.
Depois fez filmes na Essanay, Mutual, First National e United Artists, esta fundada em 1925 por ele, David Griffith, Mary Pickford e Douglas Fairbanks.
Na Mutual realizou, entre outros, O Vagabundo (The Vagabond, 1916), O Imigrante (The Immigrant, 1917); na National, também entre outros, Vida de Cachorro (A Dog´s Life, 1918), Ombro, Armas! (Shoulder Arms, 1918), O Garoto (The Kid, 1920), e O Peregrino ouPastor de Almas (The Pilgrim, 1923); na United, a partir de 1925, seus mais conhecidos longas-metragens, iniciados com Em Busca do Ouro (The Gold Rush).
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O Garoto é, principalmente para os critérios da época, seu primeiro longa-metragem, com oitenta minutos de duração.
Nesse filme, como em tantos outros de sua autoria, ressaltam-se algumas características, abrangendo estórias, estruturação ficcional, natureza do drama, linguagem, décors e protagonização.
No primeiro caso, tem-se que objetiva, antes de tudo, conquanto não tudo, contar uma estória, subordinando os demais elementos cinematográficos a essa finalidade, com o que limita o alcance do filme, já que o assunto é e deve ser secundário.
O que importa, primeiro, é o tratamento que se lhe dá, seja mimético, no sentido de retratar a ação das personagens conforme sua exteriorização, seja atingindo a motivação que lhe é subjacente, isto é, o mecanismo interior determinativo da volição humana.
No caso, Chaplin narra linear e cronologicamente o tema elegido, pondo as personagens a agir sem perscrutar e expor os fundamentos íntimos que as condicionam e orientam.
Além disso, articula romanticamente o drama. Como se sabe, o romantismo, em seu surgimento na Alemanha e descoberta e divulgação na França, em 1810, por Madame de Staël, no livro De l’Allemagne, não constituiu avanço qualitativo da arte, o que não é plausível, mas, em sua autoria e elaboração, significando a libertação da subjetividade do artista e de suas possibilidades criadoras, a reposição do individuo no centro da preocupação e da prática artística, anteriormente submetidas aos ditames e normas rígidas do classicismo, que, como toda radicalização ou unilateralismo, provocou reação em sentido contrário, como, posteriormente, aconteceu com o próprio romantismo, substituído pelo realismo e naturalismo na ficção e o parnasianismo na poesia, em fenômeno cíclico também, ou principalmente, provocado ou propiciado pelas novas realidades emergentes ou predominantes em cada época.
Contudo, por isso ou não obstante isso, a ocorrência de obras artísticas em pleno século XX de orientação romântica, como O Garoto, representa anacronismo e apelação às emoções e ao sentimentalismo fácil do espectador.
No filme, o enredo e seu fio narrativo pautam-se por essa tendência, sendo marcados pelo enfoque superficial dos acontecimentos e do comportamento das personagens.
Nisso, aliás, reside um de seus êxitos de público, que somente aprecia consumir a estória e o mais ligeiramente estruturada possível.
Esse tipo de assistência rejeita qualquer desenvolvimento temático diverso, bem como inovações ou experimentos formais. Apraz-lhe apenas seguir o transcurso da ação, recheada aqui e ali com cenas carregadas de emoção e condimentadas com laivos sentimentais. Repugnam-lhe a profundidade temática, a formulação artística, a criatividade e a inventividade formal.
Chaplin dá-lhe o que quer, conquanto não só isso, daí seu recepcionamento à época pela intelectualidade, mesmo que seja a que com ele se identifica.
Sob o aspecto da linguagem cinematográfica, utiliza-a competentemente, embora convencionalmente, já que não lhe interessam nem o preocupam (e a natureza de sua obra repele) a elaboração e a criação formal, contentando-se com sua manipulação habilidosa.
Se pelo prisma do conteúdo ficcional, O Garoto apresenta as limitações indicadas, não ocorre o mesmo com os décors e a personalidade e atuação do protagonista, ou seja, Carlitos.
Se o tema e sua tessitura são românticos, o espaço físico onde se desenrola a trama é desprovido de enfeites, característica que não contraria essa circunstância, mas, ao contrário, a reforça. Não obstante isso, em si mesmo, abstraída sua disposição idealizadora (que o impede de ferir suscetibilidade), o filme é valorizado pelos enquadramentos e angulações a que é submetido.
Por fim e não menos importante, a personagem de Carlitos é, realmente,, a grande (ou única) criação de Chaplin, mesmo que inspirada e influenciada por personagens semelhantes. A questão é que Carlitos, por corresponder ao biótipo e possibilidades interpretativas e histriônicas de Chaplin, é o grande responsável pela nomeada do autor.
Tudo (estória, tratamento, linguagem e décors) não passa de background, de espaço e tempo, para a existência e seu exercício de Carlitos, o clown, o vagabundo, o bondoso, o desprovido de bens e de pretensões que não a de apenas sobreviver, resumindo sua vida a salvar-se dos escombros que a cercam quando não a encobrem. Mas, também, o individualista exacerbado, o violento, o desonesto (a quebra de vidraças para propiciar-lhe trabalho) e até mau na competitividade em que quase sempre é inserido e a que é impelido pela vida e suas circunstâncias.
(do livro Clássicos do Cinema Mudo)
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Guido Bilharinho é advogado atuante em Uberaba, editor da revista internacional de poesia Dimensãode 1980 a 2000 e autor de livros de literatura, cinema, história do Brasil e regional, entre eles, Brasil: Cinco Séculos de História, inédito.
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