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Os bons hábitos



Prof. Edilson Lobo Do Nascimento

Quando da nossa infância, eventualmente eu ou algum dos meus irmãos esquecíamo-nos daquele cumprimento matinal, no primeiro encontro familiar do dia, invariavelmente meu pai ou minha mãe de pronto perguntavam: “Dormiu comigo?” Era uma “sutil” observação, cobrando-nos a urbanidade que devíamos ter no convívio fraternal, à despeito de compartilharmos o mesmo espaço.

O corre-corre da vida cotidiana, está deixando para traz em escala cada vez mais crescente, os bons hábitos de convivência mútua, cultivados e ensinados por nossos pais.

A competição, o individualismo, a violência e até a arrogância que toma conta das pessoas nessa imensa selva que são os espaços urbanos, compelem-nas a fecharem-se em si mesmas como ostras, numa busca por auto proteção, ou por pura indiferença mesmo, em relação ao outro.

Observem nos indivíduos no seu cotidiano, principalmente em lugares públicos, nos seus trabalhos nos espaços de laser, no trânsito, o quão difícil tem se tornado uma convivência mais humanizadora e fraterna. O grau de irritabilidade e intolerância está contaminando todo mundo. Já não existe mais pré-disposição das pessoas para um tratamento mais urbano, para uma relação mais civilizada e a capacidade de ser gentil no trato com o outro. Já não se cultivam mais o respeito e a admiração aos mais experientes, cuja trajetória de vida por si só mereceria como no oriente, uma certa reverência.

Acho que está faltando à escola, mas não só à escola, também no convívio familiar, iniciativas e orientações, no sentido depreservar os antigos ensinamentos para que pratiquemos bons hábitos, na perspectiva de que a criança de hoje, possa no futuro, à despeito das vicissitudes da vida e do caos cotidiano que se tem transformado a convivência nas cidades, as tornem cidadãos e cidadãs mais polidos/as e educados/as.

Na verdade não é necessário muito, basta um pouco de compreensão, boa vontade e um toque de bom humor. Sim, humor, eis a palavra mágica. Qual a dificuldade em cumprimentar um semelhante, na rua, na parada de ônibus, na entrada do seu trabalho, desejando-lhe um bom dia, a despeito de ser seu colega ou amigo? Quem sabe, esse pequeno gesto, feito de forma alegre e espontânea, não contribua para distender tensões que de outra forma comprometeria o seu bom desempenho diário? Já perceberam numa para de ônibus como as pessoas se comportam, parecendo bichos acuados com medo de serem percebidos ou de outra, se portando com uma certa arrogância como a insinuar, “não me dirija a palavra pois não te conheço...” uma situação de desconforto generalizada, ninguém ousa cumprimentar ninguém. Poucos se atrevem e, no mais das vezes, se quer recebem os ecos da sua educada iniciativa... Algo semelhante ocorre nos elevadores. Nesses espaços, o desconforto é ainda mais aflitivo. Um bando de “retardados” olhando para o teto ou para a parede do elevador, com “medo” de encarar olho no olho, pessoas como nós. Que pouca disposição para sairmos de nós mesmos e ir ao encontro do outro. Seria tão mais simples e causaria menos sofrimento. Talvez assim, o elevador não levaria uma eternidade para chegar ao seu destino.

Nos prédios e nos condomínios fechados, com raríssimas exceções, a boa convivência passa ao largo. A impressão que se tem, nos leva a à conclusão de que mais parece haver nessas localizações, adversários convivendo e desfrutando do mesmo espaço, sem no entanto partilharem solidariamente os diversosequipamentos que lhes são colocados à disposição. Impera o individualismo e a má vontade para uma vivência mais integrada. As pessoas só estão juntas (e quando estão),  nas reuniões de condomínio para reclamarem da má atuação do síndico ou denunciar “as inconveniências dos outros inquilinos”. Nenhuma iniciativa para congregar, entrelaçar ações visando o bem comum. Prevalece sempre uma certa aura de conspiração contra tudo...

Não é incomum, no corre corre das cidades, ao menor gesto de um cumprimento na rua, ou mesmo de um esboçar de sorriso, a quem está vindo em sentido contrário ao seu, sem nenhuma intencionalidade por traz disso, de repente  um fechar de semblante, um endurecimento nas feições, num rechaço de pronto ao seu convite a urbanidade, lhe deixando desconcertado, sem jeito e, não lhe dando a menor chance de externalizar um pouco a sua generosa cortesia. É difícil cultivar a urbanidade num mundo em que os seres humanos optam pela indiferença ou pela rudeza de comportamento.

O que dizer do trânsito. É uma verdadeira esquizofrenia. Não há instante em que não nos lembremos da nossa mãe... ou de uma parte importante do nosso corpo... tão maltratados pelos impropérios proferidos dos condutores dos veículos, sempre à beira de um ataque de nervos. Não existe a menor tolerância no trato recíproco entre os condutores.  Pior, é quando uma simples discussão, que poderia ser contornada com bom senso e diálogo, por falta de um pouco de humor em nossas vidas e do respeito tão necessários a uma convivência mais harmônica, às vezes acaba em tragédia.

Por fim, nunca é demais lembrar que as circunstâncias por mais cruéis e perversas que sejam, jamais podem suplantar o que temos de melhor, a capacidade de sermos seres humanos, que pensamos, refletimos, temos sentimentos e a capacidade de sermos generosos. Usemos então esse potencial que está dentro de cada um, muitas vezes adormecidos, para cultivar sempre uma boa convivência.

Bom seria, se num futuro bem próximo, pudéssemos afirmar que os bons hábitos estão voltando.

Prof. Edilson Lobo Do Nascimento

Do Departamento de Economia da Universidade Federal de Rondônia - UNIR

edilson@unir.br

edilobo@bol.com.br

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