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Releia artigo de 2011: A Corrupção no Brasil – Porque estamos perdendo essa guerra


Entre meados de Julho e início de Agosto de 2011 foram denunciados três casos de corrupção de grandes proporções nos Ministérios dos Transportes, Agricultura e Turismo, envolvendo servidores diretos e da confiança dos próprios Ministros, da confiança da presidenta Dilma.

Todavia, é senso comum que esses eventos não causaram espanto ao povo brasileiro já bastante acostumado a acordar com um novo escândalo quase todo dia. Afinal, foram tantos escândalos ao longo das últimas décadas que para muitas pessoas essa palavra “escândalo” até já perdeu seu significado maior.

Entretanto, uma sequência concentrada de notícias como esta pode até fazer com que algumas pessoas pensem que estamos vencendo a luta contra a corrupção no Brasil. Mas infelizmente, não estamos.

Na verdade estamos mesmo é perdendo essa luta e bilhões de reais, todos os anos, continuam se esvaindo dos cofres públicos pelos ralos da República, sem que possamos ter qualquer perspectiva de curto prazo para acabar com essa roubalheira.

Por isso há uma multidão de pessoas, com certeza dezenas de milhões, irradiando por todos os cantos a sua desilusão com a insuficiência das leis e com a ineficiência da Justiça brasileira, descortinadas nessa interminável sequência de denúncias, prisões, solturas e, no fim, sumiço do dinheiro público.

Imaginamos que se fossem investigar a sério todos os casos de suspeita de corrupção no Brasil, afastando os suspeitos dos seus cargos, faltariam investigadores, delegados, juízes e cadeias e sobrariam milhares de “cadeiras” nos gabinetes de vários escalões da República e dentro das próprias forças de segurança.

Isto porque não é novidade para ninguém que no Brasil impera um esquema sistêmico de corrupção e favoritismo de longa data, e que essas práticas não podem ser atribuídas como exclusivas de algum ou de alguns Partidos. Ao contrário, os fatos nos revelam claramente que corrupção e favoritismo são práticas habituais na vida de muitos políticos e funcionários públicos de todos os escalões dos três Poderes e de todas as preferências partidárias.

De qualquer forma, ainda que a corrupção seja uma rotina entre nós, não podemos esquecer em momento algum que aquilo que ocorre diariamente em todos os cantos desse país não é um simples pagamento de propina aqui e ali. É importante que tenhamos em mente, sempre, que essas propinas e subornos são a causa dos crimes continuados da corrupção que ocorrem toda vez que a falta do dinheiro roubado do povo impede o Estado de agir e uma criança morre de fome, um idoso morre por falta de cuidados e um doente por falta de tratamento adequado, um jovem ou uma jovem se desvia para a marginalidade porque lhes faltou um estímulo ao crescimento pessoal, ou um centro esportivo, uma biblioteca, um cinema...

Qualquer brasileiro ou brasileira com um mínimo de dignidade não pode deixar de se sentir espoliado por ter que pagar impostos nesse país que é um dos mais perigosos e corruptos do planeta, segundo dados da ONU e da Transparência Internacional. E não é por outro motivo que visivelmente cresce nas ruas a indignação das pessoas diante de tanta falcatrua de funcionários públicos, políticos e representantes do povo.

Preocupa-nos o fato de que possa restar pouco tempo para se evitar que essa indignação coletiva deságue em insurreições gerando um clima propício para o pulo do gato de radicais, a exemplo do que ficou conhecido como a “Primavera Árabe”, ou dos recentes conflitos de rua na Inglaterra, Espanha, Grécia, Chile e etc.


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Assim, vemos como inadiável a decisão de se levar a publico de forma bastante transparente e esclarecedora, todas as informações disponíveis sobre o problema da corrupção e sobre o nível de contaminação a que chegamos no Brasil, para permitir que os brasileiros possam debater aberta e esclarecidamente essa questão e, afinal, referendar o conjunto as medidas que devem ser adotadas.

Mesmo que Governo, Legislativo e Judiciário, agindo em nome do Estado brasileiro, continuem adiando a sua obrigação de fazer incluir toda a sociedade, de forma direta, ampla e transparente, no combate à corrupção, esta que deve ser a mais importante de todas as decisões nessa luta, não tardará a chegar porque hoje já há um consenso no mundo inteiro de que a luta contra a corrupção só poderá ter alguma chance de êxito se toda a sociedade, como principal interessada, for envolvida na discussão e no encaminhamento das ações subsequentes.

Prova disto é que mais de 150 países no mundo já adotaram a UNCAC – Convenção da Organização das Nações Unidas para o Combate à Corrupção, que tem no exercício da democracia participativa e no reconhecimento da soberania popular alguns dos seus principais fundamentos.

Não é por outra razão que a UNCAC é considerada a melhor ferramenta da sociedade e dos cidadãos para o combate à corrupção, porque consagra a democracia participativa instituindo a obrigatoriedade da transparência e da participação da sociedade (não confundir com sociedade civil) na forma expressa no seu Artigo 13:
 

“Cada Estado Parte adotará medidas adequadas, no limite de suas possibilidades e de conformidade com os princípios fundamentais de sua legislação interna, para fomentar a participação ativa de pessoas e grupos que não pertençam ao setor público, como a sociedade civil, as organizações não-governamentais e as organizações com base na comunidade, na prevenção e na luta contra a corrupção, e para sensibilizar a opinião pública a respeito à existência, às causas e à gravidade da corrupção, assim como a ameaça que esta representa. (grifo nosso).

 

E complementa esse Artigo:

“Essa participação deve esforçar-se com medidas como as seguintes:

a) Aumentar a transparência e promover a contribuição da cidadania aos processos de adoção de decisões;

b) Garantir o acesso eficaz do público à informação;

c) Realizar atividade de informação pública para fomentar a intransigência à corrupção, assim como programas de educação pública, incluídos programas escolares e universitários...



Portanto, verifica-se que todos os países que adotaram a Convenção da organização das Nações Unidas Contra a Corrupção, inclusive o Brasil, assumiram perante o mundo todo e, principalmente, perante o seu próprio povo, o compromisso solene de promover a democracia participativa em seus territórios, de forma a permitir que a voz da sociedade (mais uma vez, não confundir com sociedade civil) chegue aos centros de elaboração e de decisão das políticas públicas, buscando se estabelecer, de forma compartilhada, uma política realmente nacional de combate à corrupção.

Mas para chegarmos a isso no Brasil será necessário que a sociedade reúna esforços suficientes para alterar a vontade política do Governo e do Congresso que, até aqui, têm dado provas de que pretendem manter os encaminhamentos da “luta contra a corrupção” que fazem, restrita a pequenos círculos oficiais que envolvem entidades da sociedade civil e ONG’s, alimentados por constantes viagens, seminários e conferências que resultam em infindáveis relatórios, para manter afastadas as expectativas legítimas daqueles que querem integrar, de fato, o povo brasileiro na luta contra a corrupção, começando por tornar públicas as informações concernentes para permitir que as decisões a serem tomadas possam ser discutidas e definidas com toda a sociedade.

De outro lado, não é segredo algum que a nossa Justiça é lenta e cheia de recursos e apelações que permitem aos advogados dos corruptos levarem os processos sem julgamento definitivo até prescreverem os seus crimes (de 05 a 08 anos), razões pelas quais a maioria dos casos de corrupção e enriquecimento ilícito que chegam a ser investigados acabam resultando na impunidade dos acusados, e na dilapidação do patrimônio público, acirrando ainda mais o descontentamento geral.

Por isso é preciso que haja um esclarecimento público de que, mesmo sendo alegislação brasileira bastante abrangente na tipificação dos crimes de corrupção e favoritismo, esta legislação ainda precisará ser revisada, ampliada e, principalmente, acrescida de mais rigor.

Entretanto, não há quem duvide que para a sociedade brasileira ser agraciada com uma reforma legal capaz de impor sanções realmente efetivas contra os crimes de corrupção e favoritismo, sanções de rápida aplicação, proporcionais e dissuasivas, de preferência equiparáveis àquelas atribuídas à prática dos crimes hediondos e, também, com sanções não-penais dissuasivas para pessoas jurídicas, nos casos de envolvimento comprovado em corrupção e, ainda, com um mecanismo que garanta o rápido sequestro e resgate do produto dos crimes de corrupção e de enriquecimento ilícito, nos moldes do que já ocorre no Brasil com os crimes relacionados ao tráfico de drogas, por razões obvias, a própria sociedade precisará exercer uma forte pressão sobre os políticos e representantes no Congresso.

Mas, infelizmente, não poderemos contar que essa pressão popular possa ser estimulada pelas entidades e organizações da sociedade civil brasileira que historicamente levavam as pessoas às manifestações de rua, como UNE, MST, OAB, CNBB, Sindicatos, etc.

Hoje grande parte dessas organizações ou foram cooptadas pelo Governo ou são suas “parceiras”, seja em Projetos de Lei de seu interesse, ou através financiamentos públicos de Projetos Sociais, ou distribuição de cargos, ou ainda, por convites aceitos para estrelar a farsa da participação da sociedade civil em incontáveis Conselhos “Chapa Branca” espalhados pelo país, onde se concede a palavra e se distribui pequenas benesses a conselheiros e entidades para, em troca, vender-se a ilusão da participação cidadã nos centros decisórios do Poder.

É desta forma que o Governo, apoiado diretamente por grandes corporações nacionais e internacionais que financiam as campanhas eleitorais, tem conseguido manter muitas entidades, redes e organizações da sociedade civil sob a égide do bom comportamento, ou seja, fazendo com que estas organizações, sindicatos, redes de entidades e instituições atuem exclusivamente em propostas de parceria e de conciliação com o Governo, para impedir que o povo, verdadeiro dono do Poder, venha manifestar seu desejo e impor a vontade da maioria.

Conclui-se, portanto, que o êxito no combate à corrupção depende de mais democracia, ou seja depende do exercício de mais democracia participativa e de mais democracia direta.

Isto posto e considerando que é obrigação assumida pelo Estado brasileiro, disseminar em meio à sociedade todas as informações sobre o que é a corrupção; como ela ocorre no Brasil; quais os malefícios e ameaças que ela traz, esclarecendo porque devemos todos combatê-la, não há outro caminho que possa nos levar a uma conjugação nacional de esforços senão o envolvimento de todos os meios de comunicação de massa numa ampla campanha de informação e esclarecimentos sobre a questão “corrupção”, reforçada, ainda por seminários e debates em todas as escolas, universidades, associações e sindicatos do país. Isto é um direito da sociedade e obrigação do Governo, do Legislativo e do Judiciário.

Enquanto as forças vivas da sociedade continuarem neutralizadas, impedindo a sociedade de agir, a corrupção continuará vencendo esta luta que contra ela se encena.

Fernando Di Lascio é presidente do Instituto Qualicidade, membro da Coalizão Internacional de Organizações da Sociedade Civil UNCAC COALITION, membro da Articulação Brasileira de Combate à Corrupção e Impunidade  ABRACI e membro do Corruption Research Group in University of Surrey , Inglaterra. www.qualicidade.org.br  / Autorizo a impressão e a publicação desta matéria para sua divulgação em qualquer veículo de comunicação- Fernando Di Lascio

 

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