Domingo, 15 de janeiro de 2023 - 12h39
Vinício
Carrilho Martinez (Dr)
Professor
Associado da UFSCar/SP
Head
of BRaS Research Group –
Constitucional
Studies and BRaS Academic Committee Member
https://youtube.com/c/ACi%C3%AAnciadaCF88
Há tríades do crime bem conhecidas, envoltas no
tráfico de drogas, armas e de humanos – e que é melhor nem nomear. Afinal, além
da propaganda desnecessária e do risco inerente à exposição, o que nos importa
diretamente é o Brasil e a Tríade que agiu no dia 8 de Janeiro de 2023.
Chamarei de Tríade Fascista/Golpista/Terrorista,
alimentada, alicerçada sob o musgo da desinteligência chamado de fanatismo. E essa é ordem essencial a
ser observada.
Nós temos certo Princípio da Trindade na base
do Estado Moderno e no Estado de Direito, que deveriam ser recuperados para
avaliarmos a real situação do país, em que se projetou um Projeto Político
fascista (MARTINEZ, 2020). Essas trindades são: “povo, território, soberania” –
para o Estado Moderno – e Império da Lei, garantia e fruição dos direitos
fundamentais, separação dos poderes, para o Estado de Direito. Tanto quanto há
uma Trindade republicanana definição dos Princípios Gerais do Direito: honeste vivere
(viver
honestamente), alterum non laedere
(não prejudicar ao próximo), suum cuique
tribuere (dar a cada um o que lhe pertence). Ou seja, também a República
foi ameaçada de morte, neste ultimo 8 de Janeiro:
República
é o regime político[1]
em que os exercentes de funções políticas (executivas e legislativas)
representam o povo e decidem em seu nome, fazendo-o com responsabilidade,
eletividade e mediante mandatos renováveis periodicamente [...] São, assim, características da república a
eletividade, a periodicidade e a responsabilidade. A eletividade é
instrumento da representação. A periodicidade assegura a fidelidade aos
mandatos e possibilita a alternância no poder. A responsabilidade é o penhor da
idoneidade da representação popular (ATALIBA, 2004, p. 13 – grifo nosso).
Como visto, todas as carcaterísticas
republicanas vinham sendo atacadas, porém, no dia 8 de Janeiro procuraram
produzir ferimentos letais – e quase conseguiram. A tríade do Mal investiu
pesadamente contra todas as trindades do Processo Civilizatório.
Podemos afirmar que essas trindades
civilizatórias sofrem insistentemente desde 2019 (ou 2016, com o Golpe de
Estado). Foram essas trindades postas à prova na ofensiva dos atos terroristas
em 8 de Janeiro deste ano. A agressão terrorista aos Três Poderes constituídos
institui, sob a ótica do Estado Moderno, uma severa ação conspiratória e
envolta no mais grave crime de sedição. Por isso também se diz que este golpe
se projetou para além do preparado Estado de Defesa (pelo ex-secretário de
Segurança Pública do Distrito Federal) – não se resumiu a atentar contra a
presidência recém empossada, visto que sinalizou forte abalo à sustentão do
Estado de Direito: os ataques ao poder legitimamente constituído, em 2022,
inclinava-se sob uma verdadeira propositura de sedição, sendo disruptiva à
separação de poderes, ou seja, crime contra a República.
No entanto, é preciso ter clareza de que o
Fascismo nos orbita desde o pós-2016
(ou antes, já visto em 2013,
nas revoltas estudantis), e se instituiu enquanto Projeto Político entre (2018)
2019-2022: as sinalizações nazistas, nas hostes do poder derrtotado há pouco,
ilustraram a falta de ética, na elaboração da estética fascista, racista,
supremacista, misógina. Este projeto, como sabemos, tinha por objetivo
“destruir o país para construir depois” – destruir na cidadania, na democracia,
na dignidade humana, para se reconstruir enquanto projeto autocrático,
disruptivo, propriamente fascista. O nãotratamento da COVID-19 é exemplo de um
genocídio programado (crime contra a humanidade), assim como a destruição da
cultura e da educação pública, além de tantas atrocidades humanitárias, são a
ponta do iceberg do Projeto Político fascista.
Equivocadamente, pensou-se que o bolsonarismo
fosse apenas um fator politicopartidário e, além disso, chegou a formular um
entendimento de que “no máximo” haveria uma ritualização civil do “nosso Fascismo”:
quantos disseram que o país não era fascista e que só reunia “poucos elementos
fascistas?”. Ledo engano, pois os traços eram claros desde antes de 2018 (2016)
e se agravaram entre 2019-2022: a ascensão das forças armadas nas instituições
públicas – além dos acampamentos nos QGs, do engajamento das Polícias Militares
e da propria articulação de militares na nossa “tarde dos cristais”, no dia 8
de Janeiro, trazem comprovação excessiva de que o Fascismo Nacional é
militarista.
O golpismo sempre esteve na pauta – que se
iniciou já em 2014, quando o derrotado questionou publicamente,
institucionalmente, o Sistema Eleitorial. Essa prática que se apresentou em
2022, mais ainda no Segundo turno, portanto, não foi exatamente uma novidade –
mas sim uma reincidência. A mesma tipologia golpista que seria trazida para o
dia 8 de Janeiro, ainda que com outro modus
operandi, uma vez que o golpismo esteve nas estruturas de todo o Sistema de
Segurança Pública, começando pelo Gabinete de Segurança Institucional (GSI) – e
não só no cotejo da Segurança Pública distrital e na Polícia Militar do
Distrito Federal. O embaraço e os ataques foram muito mais contundentes, como
vimos na “minuta de Estado de Defesa” recuperada na casa do exsecretário de
Segurança Pública, com previsão de achaque direto ao Tribunal Superior
Eleitoral (TSE): propunha-se a quebra de sigilo dos magistrado.
Também avaliavam os golpistas que o Supremo
Tribunal Federal (STF) decidiria pela inaplicabilidade dessas medidas (quebra
de sigilos do TSE), a partir da inconstitucionalidade da propria decretação do
Estado de Defesa e, assim, o tal artigo 142 da CF88 (de péssima redação) seria
acionado pelo ex-mandatário, colocando-se o Exército como fiel da balança
golpista: como “poder moderador”. Na excrescência golpista, portanto, a
República deixaria de existir em face de instrumento malfadado do período do
Império. O golpe do 8 de janeiro caminhava, celeremente, para se converter em
Fascismo Imperial – sob o instrumental de um disruptivo poder moderador. E esta
talvez seja a ironia das ironias, porque o poder moderador seria utilizado na
primeira missão (golpista) não para arbitrar, mas sim destruir a República e a
Democracia.
Como todos também sabem, o modus operandi do terrorismo mirava a
destituição do governo recém empossado, o veículo seria o caos que queriam
criar a partir dos ataques ao patrimônio público, junto às edificações do
Palácio do Planalto, do Supremo Tribunal Federal e do Congresso Nacional. É
óbvio que o objetivo desses ataques terroristas não se limitara a quebrar,
perfurar obras de Portinari e Di Cavalcanti– ainda que a simbologia de se
atacar a cultura nacional seja uma notória característica do Fascismo. O
objetivo dessas ações destrutivas era a disrupção integral das instituições democráticas
e da propria Trindade que compõe o Estado de Direito e a República.
É claro que todos os crimes que já foram ou
possam ser listados são gravíssimos, no entanto, o obetivo não-alcançado era
ainda mais grave. Basta-nos pensar, nesta sequência, se quem ataca os Três
Poderes em ato contínuo não comunga da sedição?
Do ponto de vista jurídico, está mais do que
evidenciado o cometimento de crimes contra o Estado Democrático de Direito,
contra o patrimônio público; pelo campo da cultura, vemos que a destruição das
obras de arte quis alcançar a própria cultura nacional; no sentido da Ciência
Política e das Teorias do Estado, atacando-se os Três Poderes, além da negação
da soberania popular na eleição presidencial de 2022, buscou-se aniquilar a
institucionalidade republicana, articulando-se em crime de sedição, ou seja, contra
a Soberania Nacional – e neste último quesito o Direito Militar poderia ser
acionado, na apuração de crimes contra a integridade nacional. Os terroristas,
seus mandantes e financiadores seriam ou não traidores da Nação brasileira?
Por fim, a lista de culpabilidade – composta de
diversos crimes que já alcançam mais de 1300 envolvidos, e ainda em fase de
apuração/investigação – tem a possibilidade de alcançar o mandatário, e neste
caso provavelmente teríamos um ex-presidente preso por terrorismo: indiciado já
está, no STF e por recomendação da PGR (Procuradoria Geral da República)[2].
Se vierem a se constituir provas suficientes, muito provavelmente, o Brasil
entrará para a história como o primeiro país a condenar e prender um
ex-governante por atos terroristas[3].
Não se tem notícia de que alguém já o tenha feito: os EUA tentam avançar nesse
quesito há dois anos, mas, ainda sem sucesso.
Esse conjunto que, em tese, é assunto para
culpabilização diante da história política, pode sim, vir a se constituir em
crime de lesa pátria, sob o alcance dos Tribunais Militares – se e quando, é
claro, os mesmos militares participantes do golpismo/terrorismo forem
identificados, julgados, condenados e afastados de seus comandos.
No geral, não é difícil visualizarmos a
Intentona Fascista como a hoste do crime de sedição, de lesa pátria. Como se
sabe, as penas, aqui, podem ser agravadas com o custo da vida. Outra conclusão,
infelizmente, aponta a continuidade do fanatismo em apoio aos atos fascistas,
golpistas, terroristas. É certo que a maioria da população desabonou a
selvageria antirrepublicana, no entanto, é preciso responder ao povo que não
haberá anisita.
…
Referências
ATALIBA,
Geraldo. República e Constituição.
2ª ed. São Paulo : Malheiros, 2004.
MARTINEZ,
Vinício Carrilho. Fascismo Nacional –
Necrofascismo. Curitiba: Brazil Publishing, 2020.
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